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Revista de Cirurgia e Traumatologia Buco-maxilo-facial

versão On-line ISSN 1808-5210

Rev. cir. traumatol. buco-maxilo-fac. vol.13 no.2 Camaragibe Abr./Jun. 2013

 

 

Tratamento de extenso cisto inflamatório em maxila - relato de caso

 

Treatment of extensive inflammatory cyst in the maxilla - case report

 

 

Fábio Andrey da Costa AraújoI; Fabrício Souza LandimII; Nelson Studart da RochaIII; Antônio de Figuêiredo CaubiIV; Hécio Henrique Araújo de MoraisV

I Doutorando em CTBMF pela FoP/UPE. Professor assistente de CTBMF da Faculdade de odontologia de arcoverde/UPE
II Residente em CTBMF do Hospital Universitário oswaldo Cruz - Faculdade de odontologia de Pernambuco/UPE
III Especialista, Mestre e Doutor em CTBMF pela FOP/UPE
IV Doutor em CTMBF pela FOP/UPE. Professor adjunto de CTBMF da FOP/UPE
V Doutor em CTMBF pela FoP/UPE. Professor adjunto de CTBMF da Faculdade de odontologia de Caicó/UERN

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

Os cistos inflamatórios periapicais representam uma considerável parcela na distribuição epidemiológica daqueles categorizados como odontogênicos. Estudos mostram que no mundo inteiro cerca de 84% dos cistos que acometem a região maxilo facial são inflamatórios pariapicais. Seu diagnóstico é realizado pela associação entre o exame clínico, imaginológico e histopatológico. a terapêutica dessas lesões compreende desde o tratamento endodôntico dos dentes envolvidos até a sua enucleação cirúrgica. Fatores, como o estado geral do paciente, tamanho, forma e localização da lesão, são relevantes na tomada de decisões em casos como esses. Este trabalho tem como propósito relatar um caso clínico de um extenso cisto inflamatório periapical na maxila e discutir os fatores que levaram a uma abordagem multidisciplinar.

Palavras-chave: Cirurgia Bucal; Cistos Odontogênicos; Cisto Radicular.


ABSTRACT

Inflammatory periapical cysts represent a considerable share in the epidemiological distribution of those categorized as odontogenic. Studies show that about 84% of cysts affecting the maxillofacial region in the world, are inflammatory pariapicais. Its diagnosis is made by the association between clinical examination, imaging and histopathology. The treatment of these injuries range from the endodontic treatment of teeth involved until his surgical enucleation. Factors such as the patient's general condition, size, shape and location of the injury are relevant in making decisions in such cases. This paper aims to report a case of an extensive inflammatory periapical cyst in the maxilla and discuss the factors that led to a multidisciplinary approach.

Keywords: Surgery, Oral; Odontogenic Cysts; Radicular Cyst.


 

 

INTRODUÇÃO

Por definição, o cisto odontogênico inflamatório radicular é uma cavidade revestida por epitélio, que teve origem nos restos epiteliais de Malassez1. Essa entidade patológica tem uma expressiva variabilidade no que se refere ao tamanho e à localização, não apresentando predileção por sítios2. alguns autores referem uma maior incidência na região anterior da maxila3. Como o próprio nome diz, o seu desenvolvimento está intimamente relacionado com a um estímulo inflamatório, e isso explica a frequente relação com atividade de cárie nos indivíduos acometidos4. Na maior parte dos estudos encontrados na literatura, este é o cisto mais prevalente do sistema estomatognático, podendo chegar a 84,5% dos cistos odontogênicos5. Dados epidemiológicos mostram que o gênero masculino, na terceira década de vida é o mais acometido6. Este trabalho tem como objetivo relatar e discutir um caso de extenso cisto inflamatório periapical na maxila bem como as suas formas de tratamento.

 

RELATO DE CASO

Paciente gênero feminino, 24 anos se apresentou no ambulatório, após uma semana de alta hospitalar onde foi submetida à antibioticoterapia endovenosa e drenagem de abscesso na região de palato duro. Ela referia secreção purulenta pelo nariz e pelo ponto de drenagem intraoral, odor forte, dor e incapacidade mastigatória. Relatou, ainda, que havia iniciado um tratamento endodôntico no dente 21 que não fora concluído. Ao exame clínico, como se pode ver na Figura 1a, observa-se escurecimento do dente 21, discreto aumento de volume e ponto de drenagem em palato duro.

A paciente foi encaminhada para a avaliação da vitalidade pulpar dos elementos anteriores superiores e exames de imagem. Ao exame tomográfico, percebe-se imagem sugestiva de extensa lesão cística envolvendo as raízes dos dentes 12, 11, 21, 22, 23, como se pode observar na Figura 1b. O diagnóstico obtido com a avaliação endodôntica foi necrose pulpar dos dentes 12, 11, 21 e 22. A paciente foi submetida à limpeza e instrumentação biomecânica do sistema de canais dos dentes necrosados, e curativos de demora à base de hidróxido de cálcio foram realizados durante quatro meses. Após controle da secreção purulenta, os canais foram obturados pela técnica convencional.

 

 

 

Devido ao tamanho e histórico da lesão, decidiu-se por uma associação entre o tratamento endodôntico e a abordagem cirúrgica. A paciente foi submetida ao bloqueio troncular do nervo maxilar bilateral pela técnica da tuberosidade alta, tendo em vista o conforto do paciente durante o procedimento e a extensão da lesão. O procedimento foi realizado em ambiente ambulatorial, preservando a cadeia asséptica. Iniciou-se o procedimento com incisão intrasucular pelas faces palatinas, estendendo-se do dente 15 ao 24. Como se pode constatar na Figura 2a, foi realizado o descolamento mucoperiosteal do retalho palatino, a delimitação da lesão e dissecação da cápsula cística e a sua remoção.

 

 

 

Após a enucleação da cápsula cística, foi realizada a curetagem da loja cirúrgica, com atenção especial à área entre as raízes dentárias. Na Figura 2b, observa-se o aspecto do leito operatório após a osteotomia com broca cirúrgica do tipo max cut da borda da fenestração óssea do palato duro para melhor acesso à região interradicular. Em seguida, realizou-se a limpeza do campo, irrigação com solução salina, hemostasia, reposicionamento do retalho e sutura com fio seda 3-0, conforme pode ser visto na Figura 2c. Foram prescritos analgésico e antibiótico no pós-operatório imediato.

Após três meses de acompanhamento pós-operatório, a paciente apresentou-se com a função mastigatória reestabelecida, assintomática, livre de secreção pupurelenta e/ou hemarrágica como pode ser observado na Figura 3a. Ao exame radiográfico (Figura 3b), observa-se imagem sugestiva de neoformação óssea.

 

 

 

DISCUSSÃO

Os cistos odontogênicos inflamatórios periapicais estão intimamente relacionados à presença de infecções e necrose do tecido pulpar7. Nesse caso, segundo informações obtidas, a paciente estava realizando o tratamento endodôntico de apenas um dos dentes (21) envolvidos na lesão. Após teste de vitalidade, foi confirmado o diagnóstico de necrose pulpar de outros três elementos dentários (12, 11 e 22). O tamanho dos cistos periapicais é muito variável, e lesões com dimensões expressivas exigem um considerável período de tempo, tendo em vista que é característica da lesão o crescimento lento8.

Casos como o apresentado neste trabalho requerem anos de evolução, porém algumas particularidades são discutidas na literatura como fatores que podem influenciar a velocidade do desenvolvimento dessas lesões bem como seu potencial osteolítico. Dentre esses fatores, pode-se relacionar as avitaminoses, deficiências nutricionais, herança genética, dentre outros4,7. Possivelmente um fator que influência nesse aspecto é a quantidade de osso cortical na área acometida. Em geral, a maxila apresenta um osso mais esponjoso que a mandídula, além da presença do seio maxilar, que guarda uma íntima relação com a região do periápice dos dentes. Esse conjunto de fatores pode justificar a frequência de lesões de maior diâmetro na maxila do que na mandíbula9,10.

Uma das explicações para o caráter de benignidade atribuído aos cistos periapicais é o baixo índice de recidiva11. No entanto, cistos periapicais de grande extensão na maxila representam um maior potencial de recorrência, pois podem ter uma estreita relação anatômica com estruturas, como a membrana de revestimento do seio maxilar e cavidade nasal. Isso pode representar maior dificuldade cirúrgica. A separação da cápsula cística de estruturas de tecidos moles não patológicos é um desafio. Primeiro, pela friabilidade destas e depois pelo limitado acesso cirúrgico à área em questão. Ainda com relação ao acesso de lesões, como a do caso apresentado, uma região de elevado interesse cirúrgico é a interradicular, já que os poucos relatos de recidiva de lesões dessa natureza são justificados pela permanência de fragmentos císticos entre as raízes dos elementos dentários envolvidos12.

As lesões de menor diâmetro geralmente respondem bem ao tratamento menos invasivo como a instrumentação biomecânica e obturação do sistema de condutos radiculares. O tratamento de lesões maiores representa um maior nível de complexidade. Dentre as opções terapêuticas, pode-se relacionar a marsupialização, a enucleação cirúrgica, acompanhada ou não da amputação do terço apical dos dentes envolvidos no processo cístico e a associação entre diferentes técnicas. Percebe-se que o tratamento de lesões extensas deve envolver o trabalho de uma equipe multidisciplicar, para que haja a otimização dos resultados13.

O tratamento endodôntico é o primeiro passo para a cura de lesões extensas, pois a desinfecção dos canais e o vedamento do forame apical dos dentes envolvidos na lesão é primordial para o êxito teratêutico4,11 . Após essa fase, é necessário considerar fatores, como localização, tamanho e extensão da lesão, para se decidir pela descompressão (marsupialização) ou pela enucleação direta. Alguns estudos mostram uma diminuição no tamanho de lesões previamente marsupializadas, o que permite maior preservação de estruturas ósseas. No entanto, a viabilidade da instalação de um dispositivo para descompressão em lesões com relação anatômica predominantemente palatina, como a relatada neste trabalho, é de difícil execução. Além disso, o palato é uma superfície submetida a constante atrito, o que representa um empecilho à permanência do dispositivo pelo tempo necessário à sua eficácia14.

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os cistos odontogênicos inflamatórios periapicais de grandes dimensões precisam ser tratados por meio de uma abordagem dinâmica, sob o criterioso olhar de uma equipe multidisciplinar, que possa, por meio de diferentes pontos de vista, apontar a melhor opção terapêutica para o paciente, considerando as suas individualidades.

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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Endereço para correspondência:
Fábio Andrey da Costa Araújo
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