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Revista de Cirurgia e Traumatologia Buco-maxilo-facial

versão On-line ISSN 1808-5210

Rev. cir. traumatol. buco-maxilo-fac. vol.13 no.4 Camaragibe Out./Dez. 2013

 

 

Hipertrofia Unilateral do Músculo Master: Relato de Caso

 

Unilateral Masseter Muscle Hypertrophy: Case Report

 

 

Danillo Costa RodriguesI; Andrezza LauriaII; Raquel Correia de MedirosIII; Gabriela MayrinkIV; Roger William Fernandes MoreiraV

I Mestrando em Clínica Odontológica com área de concentração em Cirurgia e Traumatologia Buco-Maxilo-Faciais da Faculdade de Odontologia de Piracicaba – UNICAMP.
II Doutoranda Clínica Odontológica com área de concentração em Cirurgia e Traumatologia Buco-Maxilo-Faciais da Faculdade de Odontologia de Piracicaba – UNICAMP.
III Doutoranda Clínica Odontológica com área de concentração em Cirurgia e Traumatologia Buco-Maxilo-Faciais da Faculdade de Odontologia de Piracicaba – UNICAMP.
IV DDS, MsC. Doutora em Clínica Odontológica com área de concentração em Cirurgia e Traumatologia Buco-Maxilo-Faciais da Faculdade de Odontologia de Piracicaba – UNICAMP.
V Professor associado do curso de pós-graduação em Clínica Odontológica com área de concentração em Cirurgia e Traumatologia Buco- Maxilo-Faciais da Faculdade de Odontologia de Piracicaba – UNICAMP.

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

A hipertrofia do músculo masseter é um crescimento excessivo uni ou bilateral do músculo, de etiopatogenia ainda não definida que, na maioria das vezes, gera um desconforto estético e em alguns casos, funcional. Os indivíduos afetados frequentemente exibem um aumento em volume ósseo em região de ramo e ângulo mandibular e o tratamento pode ser através de métodos cirúrgicos ou não cirúrgicos. A abordagem cirúrgica envolve intervenções que são realizadas, apenas, na musculatura comprometida, na estrutura óssea do ângulo mandibular ou ambos. O presente artigo descreve um caso de hipertrofia unilateral do músculo masseter, onde optou-se pela intervenção cirúrgica intraoral com ressecção de fibras musculares e osteotomia do ângulo mandibular. Após um período de dois meses de acompanhamento, observa-se que a modalidade cirúrgica para tratamento de hipertrofia do masseter está bem indicada pois proporciona ótimo resultado estético.

Descritores: hipertrofia, músculo masseter, osteotomia


ABSTRACT

Masseter muscle hypertrophy is a unilateral or bilateral enlargement of the masseter muscle, of undefined etiology, which in most cases generates an aesthetic discomfort, and in some cases a functional one as well. The affected individuals often exhibit an increase in bone mass in the region of the branch and mandibular angle, and the treatment can use surgical or nonsurgical methods. The surgical approach involves intervetions performed in either the compromised muscle or the mandibular angle bone structure, or in both. This article describes a case of unilateral masseter muscle hypertrophy, where the surgical resection of the muscle fibers in an intraoral approach and a osteotomy with a reciprocating saw were performed in the mandibular angle region. After a two-month follow-up, it was observed that the surgical approach for the treatment of masseter hypertrophy is well advised, since the aesthetic results are excellent, with similarity to the contralateral side of mandibular angle.

Descriptors: hypertrophy, masseter muscle, ostectomy.


 

 

INTRODUÇÃO

A hipertrofia do músculo masseter, também definida como hipertrofia benigna do músculo masseter ou hipertrofia idiopática do músculo masseter, é uma alteração relativamente rara, que consiste no desenvolvimento excessivo dessa musculatura, de etiopatogenia ainda não definida e que, na maioria dos casos, leva a um desconforto estético. Muitos Autores creditam a Legg (1880) o primeiro caso relatado de hipertrofia dos músculos masseter e temporal.1,2,3

Ao exame clínico, observa-se um aumento de volume em região de ângulo mandibular assintomático e de fácil delimitação, acometendo geralmente adultos jovens na 2ª e 3ª décadas de vida sem, no entanto, predileção por gênero. Pode ser ainda uni ou bilateral, onde a queixa de dor raramente ocorre.2,3 Em alguns casos, sensibilidade à palpação, incapacidade funcional devido à dor e queixa de desarmonia oclusal podem estar presentes, embora na maioria das vezes a queixa principal seja estética.4

Ainda que seu diagnóstico inicial seja geralmente clínico, o uso de imagens radiográficas convencionais, tomografia computadorizada, ultrasonografia e ressonância magnética podem ser fundamentais para sua confirmação, descartando a possibilidade de outras doenças que acometem a região parotídeo- massetérica tais como: cistos, hemangiomas, lipomas, inflamação das glândulas parótidas, miosite ossificante e tumores malignos.3,4

O tratamento da hipertrofia do masseter pode ser realizado através de métodos cirúrgicos e não cirúrgicos. O tratamento cirúrgico envolve intervenções que são realizadas apenas na musculatura comprometida e/ou na estrutura óssea do ângulo mandibular. A correção cirúrgica da hipertrofia do masseter foi realizada primeiramente por Gurney em 1947, que removeu 3/4 a 2/3 de tecido muscular da face externa do masseter, por acesso extrabucal. Adams em 1949 foi o primeiro que relatou a remoção óssea na região do ângulo mandibular, associada à ressecção muscular de 2/3 da porção inferior e medial do masseter pela face interna, também por acesso extrabucal. O acesso intrabucal para correção da hipertrofia do masseter foi primeiramente descrito por Ginestet; Frezieres; Pickrell em 1959. A partir desses relatos, várias técnicas foram descritas na literatura.5

Este trabalho tem por objetivo relatar um caso de hipertrofia unilateral do masseter, tratado por intervenção cirúrgica intra-oral com ressecção de fibras musculares e osteotomia do ângulo mandibular.

 

RELATO DE CASO

Paciente G.B.B., gênero feminino, 19 anos de idade, procurou atendimento no serviço de Cirurgia e Traumatologia Bucomaxilofaciais da Faculdade de Odontologia de Piracicaba/ FOP-Unicamp, queixando-se de incômodo estético devido assimetria facial causada por aumento de volume em hemiface esquerda. Durante a anamnese, a mesma relata surgimento desta alteração desde os quatro anos de idade sem manifestação de sintomatologia dolorosa. Nega apresentar alterações sistêmicas, fazer uso de medicamentos, hábitos parafuncionais ou vícios. Ao exame físico intrabucal observou-se boa higiene bucal e oclusão dentária tipo Classe I. Ao exame extrabucal constatou-se aumento de volume na região do músculo masseter do lado esquerdo levando ao quadro de assimetria facial (Figura 1).

Com a finalidade de excluir outras doenças que acometem a região parotídeo-massetérica, foi solicitada tomografia computadorizada, onde se observou a alteração no volume ósseo do ângulo esquerdo da mandíbula (local de inserção do músculo masseter) (Figuras 2A e B).

 

 

 

 

 

Sob anestesia geral, uma incisão inicial foi realizada na porção vestíbulo mandibular do ramo ascendente da mandíbula e continuada inferiormente até a região do primeiro molar (Figura 3A).

Em seguida foi realizado descolamento até a visualização do masseter. Com todo o músculo exposto realizou-se miotomia em suas porções superficial e profunda, através de eletrocautério, dividindo-o em toda a sua extensão para em seguida ser removido (Figura 3B).

 

 

 

Posteriormente, com serra reciprocante, realizouse osteotomia oblíqua envolvendo o ângulo mandibular (desde seu limite com corpo de mandíbula até o ramo ascendente) para remoção do fragmento osteotomizado, medindo cerca de 25x5x7mm em seu maior diâmetro (figura 4).

 

 

 

Uma sutura oclusiva foi realizada sem instalação de qualquer tipo de dreno. O material ósseo e muscular foi encaminhado para análise anátomopatológico, na qual não foi encontrado alterações. Os cuidados pós-operatórios incluíram bandagem compressiva por três dias para minimizar a instalação de edema e hematoma.

No acompanhamento pós-operatório, o aumento de volume muscular foi regredindo progressivamente. Após 60 dias da intervenção cirúrgica e em 01 ano de acompanhamento, nota-se simetria facial, ausência de aumento de volume em região de ângulo mandibular e satisfação da paciente com o resultado alcançado (Figura 5A e B).

 

 

 

DISCUSSÃO

A hipertrofia do masseter acomete geralmente adultos jovens na 2ª e 3ª décadas de vida sem, no entanto, predileção por gênero. Pode ser uni ou bilateral, onde a queixa de dor raramente ocorre.2,3,4 O paciente geralmente apresenta aumento de volume em região de ângulo mandibular, de crescimento lento, progressivo, uni ou bilateral, que não interfere na função.6 Em alguns casos, sensibilidade à palpação, incapacidade funcional devido à dor e queixa de desarmonia oclusal podem estar presentes, embora na maioria das vezes a queixa principal seja estética.4,5 À palpação, observa-se que o aumento de volume do músculo masseter é bem definido e durante a contração do masseter pelo apertamento dental fica evidente uma protuberância na musculatura, deixando-o mais firme.6 Características essas que podem ser observadas no caso relatado.

Para auxiliar no diagnóstico, exames de imagem como as radiografias póstero-anterior de crânio, ortopantomografia, ultra-sonografia, tomografia computadorizada e ressonância magnética podem ser solicitadas. A tomografia computadorizada e a ressonância magnética possibilitam uma visualização mais detalhada dos achados em tecidos moles e delineamento medial e lateral do músculo masseter; possibilitando a mensuração do volume muscular em diferentes partes do músculo, que pode ser bastante útil no planejamento cirúrgico. O diagnóstico diferencial da hipertrofia do masseter se faz com patologias que provocam o aumento de volume na região parotídeo-massetérica, sendo as principais os tumores benignos e malignos da glândula parótida ou ducto parotídeo; abscesso ou celulite; linfoma ou linfangioma; lipoma ou fibroma; rabdomiosarcoma e lipomatose infiltrativa congênita.7

A etiopatogenia da hipertrofia do masseter é bastante discutida na literatura e várias causas têm sido propostas.5 Fatores como mastigação excessiva, apertamento dental, bruxismo, maloclusão, distúrbio emocional, hábitos parafuncionais, degeneração da articulação temporomandibular, alterações vasculares, variação anatômica do ângulo mandibular, altura da inserção do masseter na mandíbula, trauma, predisposição genética e uso de esteróides anabolizantes vem sendo descritas como possíveis causadores ou pré disponentes desta alteração.5,7 No caso exposto a etiopatogenia é inconclusiva.

O tratamento conservador da hipertrofia do masseter envolve o uso de tranqüilizantes, relaxantes musculares, psicoterapia, ajustes oclusais, uso de placas miorrelaxantes, e medidas para restabelecer o hábito de mastigar bilateralmente. Um outro método é a utilização da injeção de toxina botulínica tipo A. A toxina botulínica é uma proteína catalisadora derivada de uma bactéria anaeróbia Gram positivo, o Clostridium botulinum, que age nas terminações nervosas e bloqueia os canais de cálcio, diminuindo assim a liberação de acetilcolina, e, conseqüentemente, causando um bloqueio neuromuscular présináptico.8 Sem função muscular, o masseter tende a atrofiar. Porém a função aos poucos vai retornando, quando novas terminações axonais formam novos contatos pré-sinápticos com fibras musculares adjacentes. O retorno parcial se dá em aproximadamente quatro meses, e o completo retorno à função em 6 meses.9 Quando o resultado não é de todo satisfatório, faz-se necessário a reaplicação da toxina botulínica até chegar no resultado desejado. O inconveniente é que com as diversas aplicações da toxina o paciente pode desenvolver certa resistência à toxina, sendo necessário à aplicação de doses maiores; ou mesmo a capacidade de produzir anticorpos antitoxina.7

O primeiro fator a ser considerado importante na decisão do tratamento é a gravidade da hipertrofia. Portanto, para os casos graves, o tratamento cirúrgico é indicado. 10 A literatura relata inúmeras técnicas cirúrgicas para o tratamento da hipertrofia do masseter. O tratamento cirúrgico envolve intervenções que são realizadas, apenas na musculatura comprometida, apenas na estrutura óssea do ângulo mandibular ou uma associação de ambos os procedimentos5, a exemplo do que foi realizado no presente caso.

O acesso cirúrgico para o tratamento da hipertrofia do masseter pode ser intrabucal ou extrabucal. O acesso intrabucal, como utilizado no caso descrito, possui a vantagem de reduzir o risco de lesão nervosa, além de evitar a cicatriz. Segundo Pary & Pary (2011) 10, durante o acesso intrabucal, a dissecação do músculo masséter é indispensável em termos de visualização, precisão, segurança e de ressecção cirúrgica. A exposição total do músculo masseter oferece uma boa referência para a profundidade da ressecção, evitando riscos de lesão do nervo facial. Já o acesso extrabucal, apesar de garantir uma boa visualização do campo operatório e facilitar a remoção óssea do ângulo mandibular, resulta em uma cicatriz inestética, além de poder lesar o ramo marginal mandibular do nervo facial.

No que diz respeito à quantidade óssea a ser removida, esta pode ser realizada de três maneiras distintas: ressecção apenas da espinha/esporão, ressecção da cortical vestibular ou ressecção do ângulo mandibular em toda sua espessura (bicortical).6 No caso relatado, foi realizada a ressecção óssea do ângulo mandibular em toda sua espessura (bicortical) através de osteotomia com serra reciprocante como Ozkan & Tabrizi (2012)11, pois nos casos em que a hipertrofia do masseter traz alargamento ósseo na região de ângulo mandibular, a ressecção e remoção bicortical da estrutura óssea afetada trará melhor resultado estético.

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

De acordo com o caso exposto e a revisão de literatura foi possível constatar que a hipertrofia do masseter acomete principalmente adultos jovens. A escolha do método cirúrgico para tratamento da hipertrofia do masseter está diretamente relacionado a avaliação clínica e imaginológica e o acesso intrabucal associado a miotomia do musculo masseter com ressecção óssea do ângulo mandibular mostrouse satisfatória para o caso relatado e suficiente para correção da queixa estética da paciente.

 

REFERÊNCIAS

1. Wade WM Jr, Roy EW. Idiopathic masseter muscle hypertrophy: report of cases. J Oral Surg. 1971; 29: 196-200.         [ Links ]

2. Black MJ, Schloss MD. Masseteric muscle hypertrophy. J Otolaryngol 1986; 14: 203-5.

3. Roncevic R. Masseter muscle hypertrophy: aetiology and therapy. J Maxillofac Surg. 1986; 14: 344-8.

4. Trujillo Jr. R, Fontao FN, Sousa SM. Unilateral masseter muscle hypertrophy: a case report. Quintessence Int. 2002; 33: 776-9.

5. Oliveira DA, Nogueira RVB, Vasconcellos RJ, et al. Hipertorfia do masseter: relato de caso. Rev. cir. traumatol. buco-maxilofac. 2004; 4: 31-8.

6. Rocha AEC, Oliveira BF, Barros VM, et al. Unilateral masseter muscle hypertrophy: a case report. Arq bras odontol. 2007; 3(2): 101-5.

7. Pereira AM, Gôndola AO, Silva JJ, et al. Masseter hypertrophy: a case report using an alternative technique. RGO. 2006; 54(4): 369-73.

8. Amantéa, DV, Novaes AP, Campolongo GD, et al. A utilização da toxina botulínica tipo A na dor e disfunção temporomandibular JBA J Bras Oclusão ATM Dor Orofac. 2003; 3(10): 170-3.

9. Castro WH, Gomez RS, Silva JO, et al. Botulinum toxin type a in the management of masseter muscle hypertrophy J Oral Maxillofac Surg. 2005; 63(1): 20-4.

10. Pary A, Pary K. Masseteric Hypertrophy: Considerations Regarding Treatment Planning Decisions and Introduction of a Novel Surgical Technique. J Oral Maxillofac Surg. 2011; 69:944-9.

11. Ozkan BT, Tabrizi R. Management of Bilateral Masseter Muscle Hypertrophy. The Journal of Craniofacial Surgery. 2012; 23(1): 14-16.

 

 

Endereço para correspondência:
Danillo Costa Rodrigues
Faculdade de Odontologia de Piracicaba - Unicamp
Av. Limeira, 901, CP 52, CEP: 13.414-903,
Piracicaba, SP, Brasil.

e-mail:
danillocr@yahoo.com.br