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Revista de Cirurgia e Traumatologia Buco-maxilo-facial

versão On-line ISSN 1808-5210

Rev. cir. traumatol. buco-maxilo-fac. vol.13 no.4 Camaragibe Out./Dez. 2013

 

 

Osteoctomia Sagital e Terceiros Molares Inferiores: Mudança de Paradigma

 

Sagittal Split Osteotomy And Lower Third Molars: A Paradigm Shift

 

 

Paola Fernanda Cotait de Lucas CorsoI; Luiza Cristina do NascimentoII; Leandro Eduardo KlüppelIII; Delson João da CostaIV; Fernando AntoniniV; Rafaela Scariot de MoraesVI

I Aluna da Graduação da Universidade Federal do Paraná, Curitiba (Paranál).
II Aluna da Graduação da Universidade Federal do Paraná, Curitiba (Paraná).
III Professor da Residência de Cirurgia e Traumatologia Buco-maxilo-faciais da Universidade Federal do Paraná, Curitiba(Paraná) e Professor da Graduação da Universidade Estadual de Ponta Grossa, Ponta Grossa(Paraná).
IV Professor da Graduação e Residência de Cirurgia e Traumatologia Buco-maxilofaciais da Universidade Federal do Paraná, Curitiba (Paraná).
V Especialista em Cirurgia e Traumatologia Buco-maxilo-faciais pela Universidade Federal do Paraná, Curitiba(Paraná), e Mestrando da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Porto Alegre(Rio Grande do Sul).
VI Professora da Residência de Cirurgia e Traumatologia Buco-maxilo-faciais da Universidade Federal do Paraná e Professora da Graduação da Universidade Positivo, Curitiba (Paraná).

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

Objetivo: O objetivo deste artigo é uma associação de revisão a literatura sobre a realização de osteotomias sagitais na presença de terceiros molares inclusos, com o relato de um caso de cirurgia ortognática em que as osteotomias sagitais dos ramos mandibulares foram realizadas na presença destes elementos dentários. Relato dos casos: O caso a seguir demonstra a seqüência cirúrgica de um paciente portador de deformidade dento-facial submetido a cirurgia ortognática. A cirurgia realizada envolveu ambos os maxilares, com realização de osteotomia Le Fort I para a maxila e ostetomias sagitais dos ramos mandibulares. A peculiaridade do caso foi a realização das osteotomias mandibulares na presença de terceiros molares inclusos, as quais não causaram qualquer dificuldade ou complicação para a realização dos cortes ósseos e separação dos fragmentos. Conclusão: A osteotomia sagital do ramo mandibular pode ser realizada na presença dos terceiros molares inferiores de forma segura, sem aumento dos riscos cirúrgicos e otimizando o tempo de tratamento orto-cirúrgico.

Descritores: Osteotomia, Terceiro Molar, Cirurgia ortognática.


ABSTRACT

The aim of this article was to compare the effects of the presence or absence of third molars from a literature review about currents of different authors, with an association of two cases related which the sagittal split osteotomy was performed in the presence of mandibular third molars. Case description: The following cases describe two patients, of both genders, with dentofacial deformities, these which there was the need for orthognathic surgery by the use of sagittal mandibular osteotomy. Both patients had third molars in your mouth at the time of osteotomy. There were no major complications trans and postoperative. Conclusion: The sagittal split osteotomy of the ascending ramus can be performed in the presence of third molars, and it could lead to the time optimization in the ortho-surgical treatment.

Descriptors: Osteotomy, Third Molar, Oral Surgery.


 

 

INTRODUÇÃO

A osteotomia sagital no ramo ascendente da mandíbula é a técnica mais utilizada para a correção de deformidades mandibulares, introduzido por Schuchardt em 19421. Apesar de ser considerada segura, acima de tudo, uma das importantes complicações trans-operatórias é a injúria neurossensorial do nervo alveolar inferior, o qual se encontra em situação de risco em várias etapas da cirurgia ortognática como no descolamento, retração, osteotomia, mobilização e fixação interna dos fragmentos. A taxa de incidência de distúrbios neurossensoriais imediatamente depois da osteotomia sagital varia de 80% a 100%, com redução para 0% a 85% em um período de 1 a 2 anos após a cirurgia2.

Outra complicação que merece importância é a ocorrência de fratura indesejável, que varia de valores baixos como 0,7%3 a 20%4. Fraturas indesejáveis do segmento proximal ou do segmento distal podem levar a uma dificuldade da realização da osteotomia e na fixação dos segmentos ósseos, sequestração de fragmento, infecção, união tardia ou uma má posição dos fragmentos4. Inúmeros fatores de risco que influenciam esta complicação vêm sendo identificados, incluindo dificuldades anatômicas, osteotomias incompletas, inadequado desenho da osteotomia e presença de terceiros molares no arco mandibular. Alguns autores têm sugerido que a presença dos terceiros molares mandibulares durante a osteotomia sagital aumenta a prevalência de fratura indesejável, tempo de operação e riscos durante a manipulação do feixe neurovascular alveolar inferior, recomendando a sua remoção, pelo menos, 6 meses antes do procedimento5-7. Outros autores, de corrente divergente, sugerem a remoção dos terceiros molares concomitantemente a osteotomia sagital do ramo, o que torna, este, um dos principais temas de controvérsia na literatura científica8.

Entretanto, a remoção dentária concomitante a osteotomia traz benefícios ao tratamento e deve ser considerada. Como principais vantagens da técnica que associa a osteotomia sagital a remoção concomitante dos terceiros molares inferiores pode-se citar alguns aspectos já abordados na literatura como a eliminação de uma cirurgia prévia, menor tempo de tratamento8 e a diminuição da prevalência de parestesia2. Ainda, outros fatores como idade do paciente, posição e angulação dos dentes a serem removidos e técnica de fixação utilizada devem ser consideradas durante o planejamento.

O objetivo deste artigo é abordar os principais fatores que sugerem controvérsia com relação a osteotomias sagitais na presença de terceiros molares, relatar dois casos cirúrgicos para correção de deformidade dento-facial nos quais as osteotomias sagitais dos ramos mandibulares se deram na presença terceiros molares inferiores inclusos e discutir alguns pontos que podem fazer com que cirurgiões considerem os benefícios do tratamento proposto em casos com indicação precisa.

 

RELATO DE CASO

Pacientes, gênero masculino, 19 anos de idade e gênero feminino, 18 anos de idade, ambos portadores de deformidade dento-facial, buscaram o serviço de Cirurgia e Traumatologia Buco-maxilo-faciais por indicação do ortodotista. Após a análise clínica e de imagens, (Figura 1 e 2) os planejamentos cirúrgicos foram traçados como sendo avanço de maxila e recuo de mandíbula para ambos os casos.

 

 

 

 

 

Como protocolo, o procedimento começou pela maxila. Feito a osteotomia do tipo Le Fort I o segmento maxilar foi reposicionado e fixado com 4 placas em L e 16 parafusos do sistema 2.0mm, seguido de sutura do tipo V-Y em mucosa. Na mandíbula, incisão e descolamento subperiosteal promoveram acesso ao ramo e corpo mandibular e uma pequena porção das coroas dos terceiros molares puderam ser visualizadas. As osteotomias sagitais procederam de forma usual, com serra reciprocante e posição da osteotomia vestibular aos elementos dentários. Com uso de cinzéis a separação completa dos segmentos ósseos foi realizada (Figura 3A).

Na seqüência, osteotomias periféricas aos elementos dentários e odontosecção foram realizadas e os dentes foram removidos. O nervo alveolar inferior manteve-se preservado durante todo o procedimento cirúrgico em ambos os lados. A fixação se deu por meio de uma miniplaca e quatro parafusos monocorticais de titânio também do sistema 2.0mm (Figura 3B) em ambos os lados.

 

 

 

Não ocorreram quaisquer tipos de intercorrências trans e pós-operatórias em ambos os casos. Edema e limitação de abertura bucal foram compatíveis com o procedimento cirúrgico, bem como a regressão da parestesia temporária. Não se observou parestesia permanente no nervo alveolar inferior, bem como a presença de fraturas indesejáveis ou outros tipos de complicações. Os pacientes têm acompanhamento pós-cirúrgico de aproximadamente 12 meses sem presença de complicações tardias.

 

DISCUSSÃO

A controvérsia com relação a exodontia dos terceiros molares inferiores concomitantemente a realização da osteotomia sagital do ramo mandibular segue presente com correntes divergentes quanto a autores que preconizam técnicas mais conservadores e outros baseados em novas evidências clínicas e científicas.

A presença do terceiro molar durante a cirurgia ortognática mandibular tem sido proposta como um fator de aumento de dificuldade na realização do procedimento cirúrgico, favorecendo a ocorrência de fraturas nos segmentos distal e/ou proximal. Tucker descreveu um estudo prospectivo, no qual fraturas indesejáveis ocorreram em 4% das osteotomias sagitais na presença de terceiros molares e 3% na ausência destes9. Mehra e colaboradores, descreveram fraturas indesejáveis em 3,2% dos casos de osteotomia sagital na presença de terceiros molares, enquanto que na ausência destes o valor foi de 1,2%. Ambos os estudos concluíram que a incidência (PREVALÊNCIA) de fratura indesejável é baixa e que elas não afetam negativamente o sucesso ou a estabilidade da osteotomia sagital, uma vez que o cirurgião seja capaz de completar essa osteotomia e estabilizar todos os segmentos ósseos.

Em uma análise de 500 procedimentos de osteotomia sagital, uma prevalência de 2,2% de fraturas foi encontrada, nos quais em 6 dos 8 casos houveram a presença de terceiros molares associado a idade jovem dos pacientes (em uma média de 15,9 anos de idade)6. Já Reyneke e colaboradores, 2001, descreveram a tendência de fraturas indesejáveis de mandíbula durante osteotomias sagitais em pacientes com terceiros molares não irrompidos, apontando que todas as fraturas ocorreram em paciente com menos de 20 anos de idade. Os autores questionam sobre a viabilidade da remoção dos terceiros molares não irrompidos durante o procedimento da osteotomia em pacientes jovens, o que não ocorreu em nenhum dos casos apresentados que envolviam pacientes na faixa etária considerada crítica.

Ainda, Precious e colaboradores descreveram uma alta prevalência de fraturas indesejáveis (2,62% versus 0,94%) em pacientes com terceiros molares ausentes submetidos a osteotomia sagital em menos de seis meses, ao avaliar 1.256 osteotomias sagitais em um estudo retrospectivo.

Eles concluíram que a realização da osteotomia simultaneamente a remoção dos dentes é mais se guro que exodontia antecipada no que diz respeito à incidência de fraturas indesejáveis dos segmentos osteotomizados.

Doucet e colaboradores8, em estudos recentes, concluíram que a presença do terceiro molar durante a osteotomia sagital não está associada com o aumento da freqüência de fraturas indesejáveis de mandíbula; que a presença do terceiro molar durante a osteotomia do ramo mandibular diminui a taxa e a severidade de injúrias neurovasculares, reduzindo a manipulação do nervo alveolar inferior; e ainda que o tempo pós-operatório em média aumenta menos de dois minutos em cada lado.

Vantagens como a eliminação de um segundo procedimento cirúrgico e a remoção de possíveis interferências ósseas durante a aproximação dos segmentos distal e proximal devem ser consideradas5. A otimização dos tempos cirúrgicos pôde ser observada nesta técnica, quando se leva em consideração a exodontia dos terceiros molares associada à cirurgia ortognática em apenas um procedimento.

Faber, 201010, descreveu uma opção de tratamento no protocolo detratamento orto-cirúrgico com benefício antecipado, que vem ganhando popularidade entre cirurgiões e ortodontistas. A otimização do tempo de tratamento e diminuição do impacto psico-social durante a fase de preparo ortodôntico pré-cirúrgico são as vantagens mais relevantes.

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Pode-se afirmar que embora ainda seja um assunto que gera muitas controvérsias, é possível que a osteotomia sagital dos ramos mandibulares seja feita na presença dos terceiros molares inferiores sem maiores complicações, e ainda, que esta técnica oferece benefícios quando bem planejada.

 

REFERÊNCIAS

1. Schuchardt K. Ein Betrag zur chirurgishen Kieferorthopädie unter Berücksichtigung ihrer Bedeutung für die Behandlung angeborener und erworbener Kieferdeformitäten uei Soldaten. Dtsch Zahn Mund Kieferheil 1942; 9:73.         [ Links ]

2. Brusati R, Fiamminghi L, Sesenna E. Functional disturbances of the inferior alveolar nerve after sagittal osteotomy of the mandibular ramus: Operating technique for prevention. J Maxillofac Surg 1981; 9:123.

3. Falter B, Schepers S, Vrielinck L. Occurrence of bad splits during sagittal split osteotomy. Oral Surg Oral Med Oral Pathol Oral Radiol Endod 2010; 110:430.

4. O’Ryan F. Complications of orthognathic surgery. Oral Maxillofac Surg Clin North Am 1990; 2:593.

5. Reineke JP, Tsakiris P, Becker P. Age as a factor in the complication rate after removal of unerupted/impacted third molars at the time of mandibular sagittal split osteotomy. J Oral Maxillofac Surg 2002; 60:654.

6. Mehra P, Castro V, Freitas RZ. Complications of the mandibular sagittal split ramus osteotomy associated with the presence or absence of third molars. J Oral Maxillofac Surg 2001; 59:854.

7. Schwartz HC. Simultaneous removal of third molars during sagittal split osteotomies: The case against. J Oral Maxillofac Surg 2004; 62:1147.

8. Doucet JC, Morrison AD, Davis BR, Gregoire CE, Goodday R, Precious DS. The Presence of Mandibular Third Molars During Sagittal Split Osteotomies Does Not Increase the Risk of Complications. J Oral Maxillofac Surg 2012; 70:1935-1943.

9. Tucker MR: Sagittal ramus osteotomy with and without third molars. J Oral Maxillofac Surg 1995; 53:80.

10. Faber J. Benefício Antecipado: uma nova abordagem para o tratamento com cirurgia ortognática que elimina o preparo ortodôntico convencional. Dental Press J. Orthod 2010; 15 (1): 144-57.

 

 

Endereço para correspondência:
Paola Fernanda Cotait de Lucas Corso
Av. Prefeito Lothário Meissner, 3400,
Jd. Botânico, CEP : 80210-170, Curitiba-PR.

e-mail:
paolafcorso@gmail.com