SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
vol.13 número4 índice de autoresíndice de assuntospesquisa de artigos
Home Pagelista alfabética de periódicos  

Revista de Cirurgia e Traumatologia Buco-maxilo-facial

versão On-line ISSN 1808-5210

Rev. cir. traumatol. buco-maxilo-fac. vol.13 no.4 Camaragibe Out./Dez. 2013

 

 

Cisto nasolabial: relato de 2 casos

 

Nasolabial cyst: report of 2 cases

 

 

Airton Vieira Leite SegundoI; Maria Sueli Marques SoaresII; Emerson Filipe de Carvalho NogueiraIII; Pedro Henrique de Souza LopesIII

I Preceptor do Programa de Residência em Cirurgia Buco-maxilo-facial do Hospital Regional do Agreste, Mestre e Doutor / Universidade Federal da Paraíba.
II Professora Doutora de Estomatologia da Universidade Federal da Paraíba.
III Residente em Cirurgia e Traumatologia Bucomaxilofacial do Hospital Regional do Agreste, Caruaru – PE.

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

O cisto nasolabial é classificado como um cisto não odontogênico de desenvolvimento da região oral e maxilofacial. Ele representa uma lesão extra-óssea rara, correspondendo a apenas 0,7% de todos os cistos que ocorrem na região maxilofacial. Clinicamente, ocorre como uma tumefação no lábio superior e na região do sulco nasolabial, causando um aumento de volume na região alar nasal. Os autores relatam dois casos de cisto nasolabial, enfatizando os aspectos clínicos, tomográficos, histológicos e técnicas de excisão cirúrgica.

Descritores: Nasolabial; Cisto Não-Odontogênico; Cirurgia Oral


ABSTRACT

The nasolabial cyst is classified as a non-odontogenic and development cyst of the oral and maxillofacial region. It represents a rare extra-osseous lesion, corresponding to only 0.7% of all cysts that occur on the maxillofacial region. Clinically, it occurs as a tumefaction in the upper lip, at the nasolabial furrow region, causing a swelling on the nasal alar region. The authors report two cases of nasolabial cyst, emphasizing their clinical, tomographic and histological aspects and techniques of surgical excision.

Descriptors: Nasolabial cyst; non-odontogenic cysts; oral surgery


 

 

INTRODUÇÃO

Descrito pela primeira vez por Zuckerkandl, em 18921, o cisto nasolabial é definido pela Organização Mundial de Saúde como um cisto não odontogênico de desenvolvimento2. É uma lesão incomum que afeta o lábio superior e tem vários sinônimos, sendo chamado de cisto nasoalveolar, cisto extranasoalveolar, cisto nasovestibular, cisto nasal alar, cisto mucoso nasal, cisto de Klestadt e cisto de Gerber3. Para Shear2, é preferível utilizar o termo nasolabial em vez de nasoalveolar, uma vez que o alvéolo dental não está envolvido nesta lesão.

Sua etiopatologia é incerta, no entanto, é possivelmente originário da região do canal nasolacrimal inferior, pois apresenta um epitélio colunar pseudoestratificado de cobertura, sendo este epitélio geralmente encontrado no cisto nasolabial2,4,5.

Afeta mais frequentemente indivíduos adultos, com maior prevalência na quarta e quinta décadas de vida2,6. Há uma predominância considerável do cisto nasolabial entre as mulheres2,6,7,8, na proporção de 3:1 ou 4:1. Clinicamente, o cisto nasolabial apresenta-se como aumento de volume na região anterior do lábio superior, lateral à linha média, com uma elevação da região alar nasal e atenuação do sulco nasolabial9. Dependendo das dimensões do cisto, pode resultar numa obstrução nasal ou instabilidade da prótese dentária superior. A protuberância do sulco gengivolabial na região do dente canino pode fechar o quadro clínico6 e ocasionalmente ser bilateral10,11.

Como o cisto nasolabial origina-se nos tecidos moles, na maioria dos casos não há alterações radiográficas. Ocasionalmente, pode ocorrer reabsorção do osso subjacente pela pressão exercida pelo cisto6.

Os achados histopatológicos mostram um revestimento do epitélio escamoso estratificado colunar, epitélio respiratório, pseudo-estratificado colunar ou uma combinação desses. No epitélio pode ser observado células caliciformes e, circundando o estroma fibrovascular células inflamatórias12.

O tratamento de eleição consiste na remoção cirúrgica total por acesso intraoral. Como a lesão geralmente está próxima ao assoalho nasal, muitas vezes é necessário retirar uma parte da mucosa nasal para garantir a remoção completa da lesão6.

Este artigo relata dois casos de cisto nasolabial, enfatizando sua clínica, tomografia e os aspectos histológicos, seu tratamento e prognóstico, contribuindo para o conhecimento desta lesão.

 

RELATOS DE CASOS

Caso 1

Paciente do gênero feminino, 30 anos, apresentou aumento de volume indolor na região alar direita do nariz com evolução de aproximadamente cinco meses. A história médica do paciente não tinha revelado significativas alterações sistêmicas. Durante a anamnese, a paciente negou cirurgia prévia, infecção ou trauma local.

Durante o exame físico extra-oral, observouse um aumento de volume discreto na região paranasal direita (Figura 1A), de aspecto móvel à palpação. Através do exame intra-oral, observouse uma diminuição do sulco gengivolabial direito e nenhuma alteração da mucosa.

Foi solicitado radiografia panorâmica, a qual não demonstrou nenhuma alteração óssea. Em seguida, solicitou-se tomografia computadorizada, onde foi observada uma lesão expansiva, arredondada, de contornos regulares, medindo 3,0 x 2,8 cm, localizada próxima a região alar nasal direita, anterior ao processo alveolar da maxila, causando discreta erosão óssea por pressão (Figura 1B). De acordo com os achados clínicos e imaginológicos, a hipótese diagnóstica foi de cisto nasolabial.

 

 

 

O tratamento proposto foi a excisão cirúrgica, com acesso intraoral, utilizando a incisão de Partsch, exposição da lesão (Figura 2A), seguida de sua enucleação. Foi realizada irrigação abundante da cavidade cirúrgica (Figura 2B) e a sutura por planos anatômicos. A avaliação microscópica do espécime extirpado revelou uma cavidade cística revestida por epitélio colunar pseudoestratificado, por vezes ciliado, apresentando células da mucosa, bem como áreas de epitélio escamoso estratificado (Figura 3). O paciente está sob observação por seis anos, sem qualquer sinal de recidiva.

 

 

 

 

 

Caso 2

Paciente do gênero feminino, 43 anos, relatou aumento de volume na região alar do nariz, notado por aproximadamente um ano. O histórico médico do paciente não tinha revelado alterações sistêmicas significativas. A anamnese revelou ausência de cirurgia prévia, infecção ou trauma local.

No exame físico extra-oral, observou-se aumento de volume considerável sobre a região paranasal direita, com apagamento do sulco nasolabial (Figura 4), assintomático, de aspecto móvel e flutuante a palpação. Observou-se também o apagamento do sulco gengivolabial direito, sem alterações na mucosa.

Ao exame radiográfico, não foram observadas alterações dentárias ou ósseas que justificassem o aumento do volume da região. De acordo com os achados clínicos, o diagnóstico foi de cisto nasolabial.

 

 

 

O tratamento consistiu de um acesso intra-oral com incisão de Partsch, seguido por exposição da lesão (Figura 5A), remoção completa desta (Figura 5B), e sutura realizada por planos anatômicos. O espécime consistia de lesão cística medindo 3,2 x 2,9 cm de diâmetros (Figura 5C). A avaliação microscópica foi semelhante ao do primeiro caso, apresentando infiltrado inflamatório com predomínio de neutrofilia (Figura 5D). O paciente encontra-se sob acompanhamento há 4 anos, sem alteração local.

 

 

 

DISCUSSÃO

O cisto nasolabial é uma lesão encontrada exclusivamente na região anterior da maxila, em tecido mole, adjacente à asa do nariz. Outras lesões como granuloma, cistos periapicais e abcessos podem causar aumento de volume na mesma região; todavia são lesões que perfuram ou promovem abaulamento da cortical óssea12. O teste de vitalidade pulpar dos dentes da região pode direcionar o seu diagnóstico. Os dois casos relatados apresentaram aumento de volume assintomático na região alar nasal, e não foi necessário os testes de vitalidade13. Com relação à predileção por sexo e a idade, os nossos casos corrobam com a literatura mundial, onde o sexo feminino2,6,7,8 na quarta e quinta décadas de vida2,6 apresentam as maiores prevalências.

Como o cisto nasolabial se trata de uma patologia de tecido mole, os achados radiológicos geralmente não aparecem8. Barzilai15 recomenda tomografia computadorizada, a fim de avaliar com precisão, a extensão do cisto, enquanto Pruna e colaboradores16 sugerem uma ultra-sonografia. Imagens tiradas por ressonância magnética pode completar o quadro de imagem10,17. Radiografias panorâmicas foram solicitadas em ambos os casos clínicos descritos, para descartar envolvimento ósseo. No primeiro caso, solicitou-se tomografia computadorizada, o qual observou-se lesão de aproximadamente 3,0 x 2,8 cm envolvendo tecido mole. Como a ressonância magnética não iria alterar o planejamento cirúrgico em nenhum dos casos, optou-se pela não realização.

O padrão histopatológico revela um epitélio colunar pseudoestratificado com células ciliadas e células de Goblet3, corrobando com os achados dos casos referidos no presente artigo. Neville e col.6 ainda afirmam que pode ocorrer epitélio cubóide e áreas de metaplasia escamosa. A hipótese diagnóstica de cisto nasolabial dos casos referidos foi embasada pelos achados clínicos e imaginológicos, sendo confirmada após exame histopatológico.

O tratamento é baseado na remoção cirúrgica conservadora por meio de abordagem intra-oral, sendo as recorrências raras9,18,19. Por este motivo, esta foi a forma de tratamento escolhida para ambos os casos clínicos descritos neste artigo. Outra forma de tratamento foi relatada em 1999 por Su, Chien e Hwang20 que descreveram a técnica de marsupialização endoscópica por via transnasal com bons resultados.

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Com base na literatura acima mencionada, verificou-se que as características de ambos os casos de cisto nasolabial relatados neste estudo coincidem com aqueles apresentados por outros autores, em que os resultados mais comuns são a diminuição do sulco nasolabial e gengivolabial, o aumento de volume na região alar do nariz, aspectos radiográficos pobres e prevalência em mulheres. A tomografia computadorizada com janela para tecidos moles permitiu uma melhor avaliação da lesão. O tratamento cirúrgico excisional com abordagem intraoral foi bem indicada e recorrências não ocorreram.

 

REFERÊNCIAS

1. Chinellato LEM, Damante JH. Contribution of radiographs in the diagnosis of nasoalveolar cyst. Oral Surg Oral Med Oral Pathol Oral Radiol Endod, 1984, v.59, p.729-735.         [ Links ]

2. Shear M. Developmental odontogenic cysts. An update. J Oral Pathol Med, 1994, n.23, p.1- 11.

3. Shinohara EH, Perin SV, Carvalho Jr JP. Cisto nasolabial – relato de caso. BCI, 2001, v.8, n.29, p.15-18.

4. Cardoso AJO, Frota R, Carvalho Filho FV, Cardoso MSO, Macedo CB, Araújo Filho RCA. Cisto Nasolabial: Relato de caso clínico. Odontologia. Clín-Científ., Recife, Out/Dez, 2006, 5(4): 337-343.

5. Langlais RP, et al. Diagnostic imaging of the jaws. Baltimore: Willians e Wilkins, 1995; p.263-279.

6. Neville BW, Damm DD, Allen CM, Bouquot JE. Patologia oral e maxilofacial; Guanabara, Rio de Janeiro, 1998.

7. Cawson RA, Odell EW. Cysts of the jaws. In: Cawson RA. Odell EW. Essentials of oral pathology and oral medicine. 6 ed: Churchill Livingtone, 1998; p.97-116.

8. Haring JI, Ibsen OAC. Developmental disorders. In: Ibsen OAC, Phelan JA. Oral pathology for the dental hygienist. 2.ed, W. B. Sauders Co, 1996, p.228.

9. Raldi FV, Sá Lima JR, Araújo MM, Nascimento RD, Oliveira RGB. Cisto nasolabial: relato de caso clínico. Rev Bras Cir Periodontia, Curitiba, 2003, v.1, n.1, p.52-56.

10. Curé JK, Osguthorpe D, Van Tassel P. Magnetic resonance of nasolabial cysts. AJNR, 1996 Mar; v.17, p.585-588.

11. Cawson RA, et al. Cysts and cysts-like lesion of the jaws. In: Cawson, RA, et al. Surgical pathology of the mouth and jaws. 2ed., Wright, 1996; p.38-58.

12. Egervary G, Csiba A. Bilateral nasolabial cyst. Dent. Dig, Pittsburgh, 1969, v.75, n.12, p.504- 507.

13. Soldatelli MV, Maschmann RA, Wobido FB, Pinto JGS, Isolan TMP, Hernandez PAG, Júnior ANS, Santos MA. Cisto nasolabial unilateral: relato de caso clínico. R. Ci. méd. biol., Salvador, jan./abr. 2008, v.7, n.1, p. 90-95.

14. High CL, Houston GD. Recurring anterior facial swelling. Compend Contin Educ Dent. 2001 Dec; 22(12):1066-8, 1070-1072.

15. Barzilai M. Case report: bilateral nasoalveolar cysts. Clin Radiol, 1994; v.49, p.140.

16. Pruna X, Inajara L, Gallardo E, Serra J, Casamitjana F, Serrano A. Value of sonography in the assessment of space-occupying lesions of the anterior nasal fossa. J Clin Ultrasound, 2000; V.28, N.1., P.14-19.

17. Hisatomi Miki, Asaumi J, Konouchi H, Shigehara H, Yanagi Y, Kishi K. MR imaging of epithelial cysts of the oral and maxillofacial region. European Journal of Radiology, 2003; v.48, p.178-182.

18. Nixdorf DR, Peters E, Lung KE. Clinical presentation and differential diagnosis of nasolabial cyst. J Can Dent Assoc, v.69, n.3, p.146-149, 2003.

19. Choi JH, Kang HJ, Chae SW, Lee SH, Hwang SJ. Nasolabial cyst: a retrospective analysis of 18 cases. Ear Nose Throat J, 2002; v.81, n.2, p.94-96.

20. Su CY, Chien CY, Hwang CF. A New Transnasal Approach to Endoscopic Marsupialization of the Nasolabial Cyst. Laryngoscope, 1999; v.109, p.1116-1118

 

 

Endereço para correspondência:
Faculdade de Odontologia de Pernambuco - FOP
Av. Gal. Newton Cavalcanti, 1.650. Tabatinga,
Camaragibe / Pernambuco – Brasil
CEP: 54753-220