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Revista de Cirurgia e Traumatologia Buco-maxilo-facial

versão On-line ISSN 1808-5210

Rev. cir. traumatol. buco-maxilo-fac. vol.14 no.2 Camaragibe Abr./Jun. 2014

 

 

Reconstrução com implante de polimetilmetacrilato: relato de caso

 

Reconstruction with polymethylmetacrylate implant: case report

 

 

Renata Moura Xavier DantasI; Maysa Nogueira de Barros MeloII; Ana Carolina Lemos PimentelIII; Jeferson Freitas AguiarIV

I Residente de Cirurgia e Traumatologia Bucomaxilofacial da Faculdade de Odontologia da UFBA / Hospital Santo AntônioII Especialista em CTBMF pela Santa Casa de Misericórdia de Porto Alegre.
II Residente de Cirurgia e Traumatologia Bucomaxilofacial da Faculdade de Odontologia da UFBA / Hospital Santo Antônio.
III Interna de Cirurgia e Traumatologia Bucomaxilofacial da Faculdade de Odontologia da UFBA / Hospital Santo Antônio.
IV Preceptor do serviço de Cirurgia e Traumatologia Bucomaxilofacial da Faculdade de Odontologia da UFBA / Hospital Santo Antônio.

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

O complexo maxilofacial possui função protetora para o neurocrânio e torna-se conseqüente alvo dos traumas envolvendo a região. As fraturas faciais podem acarretar seqüelas, assimetrias e defeitos estéticos, e a utilização de enxertos autógenos nem sempre é possível. Dentre os materiais aloplásticos, o implante de polimetilmetacrilato é uma resina de base acrílica considerada uma boa opção para reconstrução de defeitos ósseos faciais por possuir baixo custo, ser inerte, biotolerado, diminuir o tempo cirúrgico, e permite fácil manipulação e modelagem. O presente artigo tem como objetivo discutir as indicações, vantagens e desvantagens do uso do polimetilmetacrilato no tratamento facial pós-traumático através de um relato de caso clínico.

Descritores: Polimetil Metacrilato; Cirurgia Bucal; trauma.


ABSTRACT

The maxillofacial complex protects the neurocranium and becomes the target of subsequent trauma involving the region. Facial fractures can cause sequelae, asymmetry and aesthetic faults, and the use of autogenous grafts sometimes is not possible. Among the alloplastic grafts, polymethylmethacrylate is an acrylic based resin considered a good option for reconstruction of facial bone defects by having low cost, being inert and tolerable, and decreasing surgical time and be easily manipulated or molded. This article aims to discuss the use, advantages and disadvantages of the use of polymethylmethacrylate in posttraumatic facial treatment using a clinical case report.

Descriptors: PolymethilMetacrylate; Oral Surgery; wounds and injuries.


 

 

INTRODUÇÃO

A abordagem tardia das fraturas faciais ainda é uma realidade nos tempos atuais, o que impossibilita a redução de maneira satisfatória das mesmas, sobretudo em casos de traumas de alto impacto, onde o paciente passa períodos prolongados em unidades de terapia intensiva, e nos casos em que há perda de substância importante1.

Tais situações levam a remodelações ósseas, seqüelas e defeitos de difícil resolução. Existem dois principais grupos de materiais a serem utilizados em reconstruções maxilofaciais: os enxertos (autógenos, alógenos ou xenógenos) e os materiais aloplásticos (como o titânio, hidroxiapatita e polimetilmetacrilato) 1.

A pesquisa de biomateriais é cada vez mais motivada pela necessidade de reconstrução dos defeitos ósseos faciais 2. Para que o uso do biomaterial seja bem sucedido, o mesmo deve ser biotolerado não causando danos locais ou sistêmicos, não ser tóxico, carcinogênico ou radioativo. Além disso, um biomaterial ideal deve ser fabricável, esterilizável e estável durante sua aplicação ou implantação 3.

O polimetilmetacrilato foi obtido pela primeira vez em 1902 e em 1945 passou a ser legalmente utilizado em Odontologia. Ele é considerado biotolerável e inabsorvível, e tem grande indicação na correção de rugas faciais e preenchimentos de regiões (labial, jugal, malar, palpebral, linha da mandíbula, zigomático e projeção do mentual). As dimensões de suas partículas variam de 30-40μm impedindo assim a fagocitose 2.

As desvantagens no uso do polimetilmetacrilato são a alta adesão bacteriana, baixa tolerância à infecção e pobre osteocondutividade. Outra consideração importante é a necessidade de controle da temperatura quando se faz uso da técnica direta, já que o processo de polimerização acontece por meio de reação exotérmica com liberação de monômeros livres 1,4.

O objetivo do presente artigo é discutir as indicações, vantagens e desvantagens do uso do polimetilmetacrilato no tratamento facial pós-traumático através de um relato de caso clínico.

 

RELATO DE CASO

Paciente de 40 anos de idade, leucoderma, gênero masculino, vítima de acidente motociclístico foi encaminhado ao Hospital Geral do Estado, cursando com fraturas faciais e em membros superiores e inferiores, sendo submetido a intervenção cirúrgica pela equipe de ortopedia. Paciente foi encaminhado ao serviço de cirurgia e traumatologia Bucomaxilofacial do Hospital Manoel Victorino após 36 dias de trauma, apresentando defeito ósseo em região frontal e fratura de corpo mandibular esquerdo.

Ao exame físico bucomaxilofacial apresentava assimetria facial compatível com afundamento em região de teto de órbita direita e glabela, associada a cicatriz nesta região, nariz em sela, ausência de fístula liquórica, discreto telecanto traumático, acuidade e motricidade ocular preservado em ambos os olhos, além de distopia oclusal e mobilidade atípica à manipulação de mandíbula (Figura 01, A, B, C). Ao exame tomográfico podem-se evidenciar sinais sugestivos de fratura frontal, etmóide, ossos próprios do nariz (OPN), parede medial de órbita bilateral, complexo zigomático bilateral e fratura de corpo mandibular esquerdo (Figura 01, D, E, F).

 

 

 

O plano de tratamento consistiu na abordagem da região glabelar, e na redução e fixação da mandíbula. A reconstrução do defeito ósseo remanescente foi realizada pela modelagem e colocação de implante de polimetilmetacrilato em osso frontal manipulado diretamente sobre o defeito sob irrigação constante com solução fisiológica 0,9%, cujo acesso foi realizado através da cicatriz já apresentada pelo paciente previamente, com extensão para o lado contralateral e fixação com 01 parafuso do sistema 2.0mm (Figura 02). A fratura de mandíbula foi tratada através de acesso submandibular de Hisdon e fixação com 02 placas do sistema 2.0mm (Figura 03).

 

 

 

O mesmo evoluiu com correção adequada do defeito ósseo, sendo mantida a antibioticoterapia pós-operatória por um período de 07 dias, cicatrização satisfatória da ferida atendendo a um padrão estético aceitável, além de um retorno adequado às funções estomatognáticas. Em retorno pós-operatório de 6 meses pode-se observar manutenção dos resultados obtidos, com ausência de sinais de infecção e/ou exposição do implante de polimetilmetacrilato (Figura 03).

 

 

 

DISCUSSÃO

Os tecidos duros do organismo quando perdidos precisam de substitutos funcionais, e na maioria das vezes também estéticos. Deve-se, desta forma, utilizar biomaterias que permitam a reconstrução dessas estruturas perdidas, restaurando a função, e que garantam resistência mecânica1.

Al Ruhaimi 20015 realizou um estudo com diferentes materiais quanto à atividade osteocondutora e concluiu que os copolímeros apresentam o menor potencial de formação óssea rápida comparados aos enxertos autógenos e alógenos, estando à frente apenas dos enxertos desmineralizados e liofilizados de origem humana que não apresentaram sinais de cicatrização óssea ativa no estudo.

O polimetilmetacrilato é um composto acrílico amplamente utilizado, com bons resultados em cirurgias ortopédicas, neurológicas, plásticas reconstrutivas e bucomaxilofaciais6.

Apesar do paciente do presente caso apresentar fratura da díploe, por tratar-se de sequela estética e não haver exposição de conteúdo encefálico, implementou-se a aposição do material aloplástico na reconstrução.

A grande vantagem dos enxertos aloplásticos em geral é a diminuição das complicações relacionadas à área doadora7.

No relato descrito optou-se pela utilização deste tipo de implante em região frontal em virtude de sua biotolerabilidade, baixo custo e disponibilidade no serviço público de saúde, fácil manipulação e modelagem, onde podemos obter sucesso clínico, garantindo satisfação e reinclusão do paciente ao convívio social.

Alguns estudos na literatura já observaram os efeitos da utilização do polimetilmetacrilato nos tecidos orais e concluíram que o mesmo causa vasodilatação por diferentes mecanismos, e por consequência este fenômeno pode participar da homeostasia tecidual e de certas condições patofisiológicas8.

Um ponto crítico da utilização do polimetilmetacrilato como material para reconstrução de defeitos ósseos em face é que o cirurgião deve ter adequado controle da temperatura do material durante a presa, pois a reação de polimerização libera calor e pode danificar tecidos sadios, além de que este deve ser posicionado em área com boa cobertura de tecido moles, evitando deiscência de suturas, exposição de material e possibilidade de infecção.

Para GASPARINI et. al. 20099, após um estudo realizado por quatro anos (2003-2007) concluiu-se que o polimetilmetacrilato continua sendo o material de escolha para cranioplastia em pacientes adultos. Os mesmos afirmam que a aplicação do material por camadas sequenciais reduzem ao máximo as complicações perioperatórias, promovendo excelentes resultados estéticos e funcionais. O mesmo também pode ser amplamente utilizado para manutenção de espaço em pacientes que necessitam de reconstrução mandibular, evitando grandes retrações cicatriciais e consequente necessidade de enxertos de tecido mole10.

No paciente estudado foi realizado o acesso ao defeito através de cicatriz prévia do mesmo, o que precisou ser minuciosamente indicado, além de cuidados adicionais no fechamento da ferida cirúrgica, já que o implante deve se situar abaixo de tecido sadio e íntegro. A irrigação constante e vigorosa com solução salina também foi rigorosamente instituída.

A comunidade científica ainda destaca a possibilidade de colonização bacteriana deste tipo de material, sendo adotada a terapia antibiótica profilática, e sua manutenção pós-operatória no caso em questão. A cicatrização foi concluída com sucesso, com resultado clínico dentro das expectativas. O paciente também pôde desfrutar de retorno às funções das vias aéreas superiores e melhorias na estética do dorso nasal, pois o mesmo foi encaminhado ao serviço de Cirurgia Plástica do Hospital Santo Antônio – Obras Sociais Irmã Dulce que realizou intervenção cirúrgica.

 

CONSIDERAÇÕES

A utilização do polimetilmetacrilato é uma notável ferramenta na reconstrução dos defeitos ósseos faciais. O mesmo apresenta inúmeras vantagens e excelentes resultados clínicos. Portanto, o uso de biomaterias é uma opção que possibilita ganhos em qualidade de vida e autoestima dos pacientes. Vale-se ressaltar a necessidade de mais estudos na área de cirurgia e traumatologia bucomaxilofacial que evidenciem a eficácia deste material nas reconstruções maxilofaciais.

 

REFERÊNCIAS

1. Cerqueira, A.; Pereira Júnior, F.B.; Azevêdo, M.S.; Ferreira, T.G. Reconstrução de bossa frontal com implante de polimetilmetacrilato: relato de dois casos. Rev. Cir. Traumatol. Buco-Maxilo-Fac., Camaragibe, v.11, n.3, p. 61-68, jul./set. 2011.         [ Links ]

2. Puricelli, E; Nácul, A.M.; Ponzoni, D.; Corsetti, A.; Hildebrand, L. de C.; VALENTE, D.S. Implante Intramuscular de polimetilmetacrilato (PMMA) 30%, associado a veículo não-protéico: estudo experimental em ratos. Ver. Bras. Cir. Plást. v. 26, n.3, p. 385-9, 2011.

3. Dantas, T.S.; Lelis,E.L.; Naves, L.Z.; Fernandes-Neto, A.J.; Magalhães, D. Materiais de enxerto ósseo e suas aplicações na Odontologia. UNOPAR CientCiêncBiol Saúde, v.13, n.2, p. 131-5, 2011.

4. Lopes, D.D.; Andrade, B.G. de A.; Vaena, M.L.H.T.; Mota, D.S.C. Enxerto de cartilagem costal em monobloco na rinoplastia. Rev. Bras. Cir. Plást., v.26, n.3, p. 453-60, 2011.

5. Al Ruhaimi KA. Bone graft substitutes: a comparative qualitative histologic review of current osteoconductive grafting materials. The International journal of oral & maxillofacial implants 2001;16:105-114.

6. Marzola, C.; Oliveira, M.G.; Blessmann-weber, J.B.; Hellwing, I.; FREGAPANI-WORM, P.W. Os implantes de biomateriais – relato de casos. Ver Actiradentes de Odontologia, v.13, 2008.

7. Kalil, M. da V.; Cruz, L.M.M.; Nascimento, A.G.S.; Graça, N.J.F. Enxerto ósseo particulado aplicado à implantodontia. InternationalJournalof Science Dentristy, v. 2, n.38, ano XVIII, 2012.

8. Maddux WF, Abebe W, Schuster GS, Mozaffari MS. Effects of dental resin components on vascular reactivity. Journal of biomedical materials research 2002;61:572-580.

9. Gasparini G, Boniello R, Moro A, Tamburrini G, Di Rocco C, Pelo S. Cranial reshaping using methyl methacrylate: technical note. The Journal of craniofacial surgery 2009;20:184-190.

10. Goodger NM, Wang J, Smagalski GW, Hepworth B. Methylmethacrylate as a space maintainer in mandibular reconstruction. Journal of oral and maxillofacial surgery: official journal of the American Association of Oral and Maxillofacial Surgeons 2005; 63:1048-1051.

 

 

Endereço para correspondência:
Renata Moura Xavier Dantas,
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