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Revista de Cirurgia e Traumatologia Buco-maxilo-facial

versão On-line ISSN 1808-5210

Rev. cir. traumatol. buco-maxilo-fac. vol.14 no.2 Camaragibe Abr./Jun. 2014

 

 

Conduta em Luxação Condilar Anterior Prolongada: Relato de Caso

 

Conduct condylar dislocation Previous Extended: Case Report

 

 

Belmiro C. E. VasconcelosI; Pedro Thalles B.C.NogueiraII; Raphael Teixeira MoreiraIII; Tatyana C. Dias SilvaIV; Wanessa de Oliveira PajeúV

I Residente do Serviço de Cirurgia e Traumatologia Bucomaxilofacial do Hospital Santo Antônio – OSID / UFBA.
II Especialista em Cirurgia e Traumatologia Bucomaxilofacial pelo Hospital Santo Antônio – OSID / UFBA, Mestrando em Odontologia – UFS, Professor do curso de Cirurgia Bucal da ABO-SE.
III Cirurgião-dentista pela Universidade Federal da Bahia.
IV Coordenador do Serviço de Cirurgia e Traumatologia Bucomaxilofacial do Hospital Santo Antônio – OSID / UFBA.

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

A luxação da Articulação temporomandibular (ATM) é definida como um movimento de avanço excessivo do côndilo além à eminência articular, não auto redutível, que pode ser clinicamente dividida em 3 grupos; luxação que ocorreu apenas uma vez, luxação recidivante e deslocamento prolongado. O deslocamento prolongado é uma condição rara com poucos casos descritos na literatura que na maioria dos casos não responde a reposição manual, necessitando de intervenção cirúrgica, e requer uma atenção especial por parte dos cirurgiões tendo em vista a peculiaridade de cada caso. O objetivo deste trabalho é relatar um caso de deslocamento mandibular prolongado com duração aproximada de 9 meses que foi tratado com sucesso através da eminectomia associada à elásticoterapia em classe III.

Descritores: Transtornos da Articulação Temporomandibular; Luxações.


ABSTRACT

The dislocation of the temporomandibular joint (TMJ) is defined as an excessive forward movement of the condyle beyond the articular eminence, not self-reducible, which may be clinically divided into 3 groups; dislocation that occurred only once, recurrent dislocation and prolonged displacement. Prolonged dislocation is a rare condition with few cases reported in the literature that in most cases does not respond to manual reset, requiring surgical intervention, and requires special attention from surgeons in view of the peculiarity of each case. The objective of this work is to report a case of prolonged mandibular displacement lasting about nine months which was treated successfully by eminectomy associated elásticoterapia in class III.

Descriptors: Temporomandibular Joint Disorders; Dislocations.


 

 

INTRODUÇÃO

O deslocamento da Articulação temporomandibular (ATM) é definido como um movimento de avanço excessivo do côndilo além à eminência articular com separação completa das superfícies articulares e fixação nessa posição1. O termo subluxação reporta-se ao deslocamento auto redutível do côndilo mandibular, o que não ocorre na luxação, onde há necessidade de redução manual do côndilo deslocado para a cavidade glenóide. 1,2

No momento da luxação, a dor estimula o espasmo ou contração dos músculos da mastigação, o que provoca uma elevação e travamento do côndilo anteriormente à eminência articular.1 Os sintomas são boca aberta, queixo saliente, tensão dos músculos mastigatórios, salivação, dificuldade de fala e dor. 2,3 O deslocamento da mandíbula é geralmente bilateral. 1,3

Clinicamente o deslocamento da articulação temporo mandibular pode ser dividida em 3 grupos; luxação que ocorreu apenas uma vez, luxação recidivante e deslocamento prolongado. 4 O deslocamento de longa data é raro 5,6 e na maioria dos casos a reposição manual não é possível.4,5

A intubação pelo anestesiologista, falha durante uma convulsão em combinação com o relaxamento do músculo e exodontias sem fixação suficiente da mandíbula são fatores que podem facilmente causar deslocamento do côndilo. À medida que o tempo entre o início do deslocamento e reposicionamento aumenta, prognóstico é menos favorável. 4

A falha de métodos não cirúrgicos são devido à resistência oferecida pelo espasmo dos músculos da mastigação, encurtamento e fibrose subseqüente dos músculos temporal e pterigoideo, fibrose periarticular, deslocamento do disco e pseudoanquilose entre o arco zigomático e processo coronóide. 7

De acordo com a literatura, as luxações com mais de 6 meses geralmente exigem complicados procedimentos cirúrgicos, tais como condilectomia, miotomia e próteses TMJ ou outros métodos para corrigir a oclusão e reduzir a mandíbula para um relacionamento normal com a maxila.6

Várias modalidades de tratamento, para esta doença rara, foram propostas nas últimas décadas, não sendo estabelecido ainda um protocolo de atendimento.5

O objetivo deste trabalho é relatar um caso de deslocamento mandibular prolongado que foi tratado com sucesso através da eminectomia associada à elásticoterapia em classe III. Os achados clínicos, o tratamento cirúrgico e os resultados serão correlacionados com a literatura disponível.

 

RELATO DE CASO

Paciente M.A.S., gênero masculino, 21 anos de idade, compareceu ao Serviço de Cirurgia e Traumatologia Buco-Maxilo-Facial do Hospital Universitário Oswaldo Cruz em Recife-PE, se queixando da impossibilidade de fechar a boca (Fig.1).

O mesmo relatou apresentar tal condição há aproximadamente 09 meses, após permanecer 45 dias na unidade de terapia intensiva por ter sofrido um acidente motociclístico. Ao exame clínico, o mesmo relatou ter sintomatologia dolorosa em região pré-auricular bilateral, observou-se também impossibilidade de fechamento mandibular e dificuldade de fonação. Ao exame tomográfico, observou-se, côndilos mandibulares posicionados

 

 

 

 

 

Como conduta, tentou-se, sem êxito, a redução manual da luxação através da manobra de Nelaton. Em seguida, optou-se por procedimento cirúrgico cruento sob anestesia geral, onde foi realizada eminectomia bilateral (Fig.3), mesmo assim, devido ao remodelamento condilar e a possível presença de tecido fibrótico da cavidade glenóide, a total redução trans-operatória não foi realizada com sucesso. Então, optou-se pela instalação de barra de Erich para que, através de elasticoterapia em Classe III (Fig.4), o côndilo retornasse a cavidade glenóide de forma gradativa. A Barra de Erich foi removida no 10º dia de pós-operatório, uma vez que o paciente encontrava-se com sua oclusão e fonação reestabelecida (Fig.5).

 

 

 

 

 

 

 

DISCUSSÃO

Luxação da ATM é um dos tipos mais raros de luxações articulares, representando cerca de 3% de todas as luxações articulares do corpo. 8 Apesar de ser uma condição rara, o deslocamento mandibular prolongado requer uma atenção especial por parte dos cirurgiões. O planejamento do tratamento deve ser individualizado para cada paciente e fatores como idade do paciente, estado geral de saúde e a condição do conjunto deve ser levada em consideração.5

A cirurgia da articulação temporo mandibular é indicada para diferentes situações clínicas , incluindo desarranjos internos , hipomobilidade , hipermobilidade , patologia e trauma. O deslocamento mandibular é uma condição dolorosa aguda que causa uma limitação funcional grave. A Redução manual, com ou sem a ajuda farmacológica, é o tratamento de escolha e deve ser realizado tão cedo quanto possível. Em raras situações de deslocamento mandibular pode não ser percebido pelo paciente e manter-se não diagnosticada ou diagnosticada por um longo período. Isto pode incluir doenças graves, doenças neurológicas e internação com cuidados intensivos prolongados como intubação orotraqueal e sedação. 5 No caso apresentado, o deslocamento ocorreu provavelmente durante a intubação orotraqueal realizada na UTI.

O tratamento de deslocamento mandibular prolongado é diferente do deslocamento mandibular agudo, principalmente porque a redução simples é difícil de alcançar, ou há uma grande tendência a reluxação com abertura mínima da boca. 9 As alterações morfológicas da articulação e estruturas associadas impedirá a redução manual com sucesso, mesmo com o paciente sobre anestesia geral, requerendo intervenção cirúrgica.5 Esta complicação se da pela tensão intensificada dos músculos ou pela formação de cicatriz na região do côndilo ou fossa glenóide.10 Quanto maior o tempo decorrido desde o deslocamento inicial, maior a gravidade dessas mudanças o que resulta em maior dificuldade e necessidade de procedimentos mais complexos para redução da articulação.8 No caso clínico apresentado, devido ao tecido mole fibrosado recobrindo o côndilo, a realização da eminectomia não foi suficiente para o reposicionamento total do côndilo, sendo associada a elasticoterapia em classe III tendo em vista que trações elásticas podem ser usadas para tracionar gradualmente os segmentos ósseos para suas posições corretas por algumas horas ou por alguns dias.13 A elasticoterapia interarcos, quando presente má oclusão Classe III, pode ser usada para o movimento distal em massa da arcada inferior.11

Diversos procedimentos cirúrgicos têm sido propostos para o tratamento da luxação prolongada da articulação têmporomandibular, porém com algumas complicações.10 Em 1988, Mizuno et al. citaram algumas possíveis abordagens como: condilectomia, condilotomia, osteotomia de Kostecka, coronoidectomia, miotomia temporal, meniscectomia, etc. No entanto, variações na duração do deslocamento e considerações anatômicas tornam o tratamento deste tipo de luxação complexo e controverso não havendo atualmente diretrizes ou protocolos para a qual método cirúrgico é o melhor e para o qual as situações.8

Cada forma de tratamento tem as suas próprias vantagens e desvantagens. Objetivo da eminectomia é remover os obstáculos mecânicos no caminho percorrido pelo côndilo. A remoção da eminência pode levar a hipermobilidade, o que pode causar uma degeneração da articulação e uma excessiva abertura da bucal. O oposto também foi observado, o que pode ser explicado pela presença de fibrose, devido ao procedimento cirúrgico em si.12 No entanto, tal procedimento tem sido utilizado com resultados satisfatórios e eficácia, apresentando 95% dos casos sem recorrência, de acordo com a literatura.1 Devido a esta alta taxa de sucesso a remoção da eminência foi o método de escolha para resolução do caso, não apresentando insucesso nos últimos 6 meses de acompanhamento.

 

CONCLUSÃO

O deslocamento condilar prolongado é uma condição rara, com poucos casos descritos na literatura e que merece atenção especial por parte dos cirurgiões tendo em vista a peculiaridade de cada caso. A eminectomia associada à elásticoterapia em classe III pode ser uma das alternativas para o tratamento desta condição, no entanto, mais estudos devem ser realizados para verificar a eficácia do procedimento em longo prazo.

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1. CARDOSO, A.; VASCONCELOS, B.C.E.; DE OLIVEIRA, D M. Comparative study of eminectomy and use of bone miniplate in the articular eminence for the treatment of recurrent temporomandibular joint dislocation. Rev Bras Otorrinolaringol. v.71, n.1, p.32-37, jan./fev. 2005.         [ Links ]

2. SHOREY, C.W.; CAMPBELL, J.H. Dislocation of the temporomandibular joint. Oral Med Oral Pathol Oral Radiol Endod. v.89 n .6 p.662-668. 2000.

3. GERHARD. Temporomandibular Joint Eminectomy for Recurrent Dislocation. Atlas Oral Maxillofacial Surg Clin N Am. v.19 p.189–206. 2011.

4. WIJMENGA, J.P.H.; BOERING, G.; BLANKESTIJN, J. Protracted dislocation of the temporomandibularjoint. Int. J. Oral Maxillojac. Surg. v.15 p.380-388. 1986.

5. KLUPPEL, L.E.; OLATE, S.; SERENA-GOMEZ, E.; et al. Efficacy of eminectomy in the treatment of prolonged mandibular dislocation. Med Oral Patol Oral Cir Bucal. v.15 p.891-894. 2010..

6. HUANG, C.M.; CHEN, Y.H.; KAO, C.M.; CHEN, C.W. Management of longstanding mandibular dislocation. Int. J. Oral Maxillofac. Surg. v. 40. p.810–814. 2011.

7. DEBNATH, S.C.; KOTRASHETTI, HALLI, K.R.; BALIGA, S. Bilateral vertical-oblique osteotomy of ramus (external approach) for treatment of a long-standing dislocation of the temporomandibular joint: A case report. Oral Surg Oral Med Oral Pathol Oral Radiol Endod. v.101 p.79–82. 2006.

8. BAUR, D.A.; JANNUZZI, J.R.; MERCAN, U.; QUERESHY, F.A. Treatment of long term anterior dislocation of the TMJ. International Journal of Oral and Maxillofacial Surgery. v. 42, n. 8, p. 1030–1033. 2013.

9. MIZUNO, A.; SUZUKI, S.; MOTEGI, K.A.; Articular eminectomy for long-standing luxation of the mandible." Report of 2 cases. Int. J. Oral Maxillofac. Surg. v. 17. p.303-306. 1988.

10. LEE, S.I.; SON, J.H.; PARK, I.S.; PARK, J.H. Reduction of prolonged bilateral temporomandibular joint dislocation by midline mandibulotomy. Int. J. Oral Maxillofac. Surg. v.35 p.1054–1056. 2006

11. SEUNG-HAK BAEK; HYUNG YANG; KEUN-WOO KIM; HYO-WON AHN. Treatment of Class III Malocclusions Usingn Miniplate and Mini-Implant Anchorage. Seminars in Orthodontics. v. 17, n. 2 p. 98-107. 2011.

12. VASCONCELOS, B.C.E.; PORTO, G.G.; NETO, J.P.M.; VASCONCELOS, C.F.M. Treatment of chronic mandibular dislocations by eminectomy: Follow-up of 10 cases and literature review. Med Oral Patol Oral Cir Bucal. v.14. n.11. p.593-596. 2009.

13. LARRY J. PETERSON; EDWARD ELLIS; JAMES R,; HUPP MYRON R.TUCKER.. Cirurgia Oral e Maxilofacial Comtemporânea, Guanabara Koogan S. A. 2º ed., p.531.1996.

 

 

Endereço para correspondência:
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