SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
vol.14 número2 índice de autoresíndice de assuntospesquisa de artigos
Home Pagelista alfabética de periódicos  

Revista de Cirurgia e Traumatologia Buco-maxilo-facial

versão On-line ISSN 1808-5210

Rev. cir. traumatol. buco-maxilo-fac. vol.14 no.2 Camaragibe Abr./Jun. 2014

 

 

Fratura de Côndilo Mandibular em Criança: Tratamento Ortopédico-Funcional

 

Fracture of Condyle Mandibular in Children: Functional Orthopedic Tretment

 

 

Paulo Renato Barchi MarcolinoI; Raphaela Sá dos Santos GomesII; Paulo Alexandre da SilvaIII

I Graduando em Medicina e Cirurgião Dentista Pós Graduado em Cirurgia e Traumatologia Buco Maxilo Facial.
II Cirurgião Dentista Residente, 2o Ano, em Cirurgia e Traumatologia Buco Maxilo Facial e Especialista em Dor Oro Facial e Odontologia Hospitalar.
III Cirurgião Dentista, Mestre e Especialista em Cirurgia e Traumatologia Buco Maxilo Facial.

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

As fraturas de côndilo mandibular são as mais freqüentes do osso mandibular, tendo uma prevalência de 34 a 45%, e eventualmente ocorrem em jovens e adultos. O tratamento dessas fraturas é controverso, indo desde o tratamento funcional ortopédico a redução com fixação dos cotos fraturados de forma aberta. Neste trabalho descrevemos uma técnica conservadora e altamente resolutiva, descrevendo como modelo um paciente de 5 anos de idade, vítima de queda da mesma altura, com fratura alta e cominutiva do côndilo mandibular direito, proporcionando ao mesmo desoclusão dental, assimetria facial, artralgia e dificuldade de abertura de boca. Foi realizado artrocentese e na sequência instalação de aparelho ortopédico do tipo Bimler A, visando intervenção mínima nas articulações epifisárias. O Tratamento teve uma duração clínica de 6 meses e acompanhamento por 2 anos, com resultados extremamente satisfatórios.

Descritores: Tratamento Conservador, Fratura de Côndilo Mandibular; Crianças.


ABSTRACT

The mandibular condyle fractures are the most frequent of the mandibular bone, having a prevalence 34 - 45%, and generally occur in young adults. The treatment of these fractures is controversial, ranging from functional orthopedic treatment until reduction with fixation of the fractured stumps openly. In this paper we described a case of the patient with 5 years old, victim of the fall, with comminuted condilar fracture, in temporomandibular join left, while providing dental malocclusion, facial asymmetry, arthralgia and difficulty mouth opening. Was accomplished conservative treatment, throught of the arthrocentesis and installation of orthopedic device, type Bimler A, aiming minimal intervention at the epiphyseal joints still forming. The treatment had a clinical duration of 6 months and 2 years clinical follow-up, with extremely satisfactory results.

Descriptors: Conservative Treatment, Mandibular Condyle Fracture; Children.


 

 

INTRODUÇÃO

As fraturas de côndilo mandibular são as mais freqüentes do osso mandibular, tendo uma prevalência de 34 a 45%, e eventualmente ocorrem em jovens e adultos. Estas fraturas estão geralmente relacionadas às causas traumáticas, tais como: acidente automobilístico, agressão física e queda.3 Entretanto, podem ocorrer em crianças, de zero (0) a doze (12) anos, somando cerca de 44,4% de todas as fraturas envolvendo o osso mandibular. 8

O tratamento das fraturas de côndilo mandibular em crianças é controverso, indo do conservador ao cirúrgico, passando por todas as suas vertentes, como: o funcional ortopédico, bloqueio maxilo-mandibular em redução funcional, redução com fixação dos cotos fraturados de forma aberta, etc.1,3.

O tratamento funcional inspira-se nos princípios fisiológicos, onde os côndilos são estimulados pela ação dos músculos da mastigação, principalmente o pterigóideo lateral, orientando o reparo e remodelamento ósseo, como descrito na teoria da matriz funcional de MOSS e no princípio de aposição e reabsorção óssea de Wolff. 7,8.

O trabalho por nós proposto objetiva a apresentação de caso clínico e sugeri um protocolo para tratamento de fratura de côndilo mandibular em crianças de modo conservador e funcional. Visando a não interferência cirúrgica nas cartilagens epifisárias, não alterando assim o desenvolvimento do terço médio facial.

 

CASO CLÍNICO

Paciente de 5 anos de idade, sexo masculino, vítima de queda da própria altura com trauma em mento, procurou nosso serviço, imediatamente após o trauma, juntamente com seus pais, queixandose de algia em região pré-auricular esquerda e dificuldade de abertura de boca. Ao exame clínico comprovamos assimetria facial, desoclusão dental, abertura bucal de 13 milímetros (mm) e fortes dores à palpação da região pré-auricular esquerda, sugerindo quadro de fratura de côndilo mandibular. O diagnóstico foi confirmado através de tomografia computadorizada em cortes coronais e axiais de 2 mm. Sugerimos um tratamento conservador ortopédico funcional associado `a artrocentese da articulação temporomandibular (ATM) e fisioterapia motora. O paciente permaneceu internado e recebeu tratamento físico para evitar edema, compressas de bolsa de gelo na região pré-auricular esquerda, e 30 gotas de dipirona sódica em caso de dor e(ou) febre.

 

 

 

 

 

Na manhã do primeiro dia pós trauma, foi realizado em Centro Cirúrgico, uma sedação com 7,5 miligramas (mg) de midazolam, de modo endovenoso, e na sequencia artrocentese da ATM esquerda, associada à investigação da cavidade articular via artroscópio. Foi observado conteúdo sanguinolento no interior da cavidade articular, o qual foi removido com 200 mililitros (ml) de solução fisiológica a 0,9% de cloreto de sódio aquecido à 39ºC. Ainda com o paciente sedado fizemos a manipulação dos cotos fraturados, de modo a reaproxima-los anatomicamente; na sequencia segui-se a moldagem dos arcos superior e inferior com alginato e registro, orientado, da máxima intercuspidação habitual (MIH) em cera 7.

Através dos modelos de gesso dos arcos dentais e o registro em cera 7, pode ser confeccionado aparelho ortopédico de Bimler A, o qual foi instalado três dias após o trauma. Iniciou-se os acompanhamentos clínicos semanais com a nossa equipe, mensais com a ortodontia e ortopedia funcional dos maxilares, e foram prescritos 2 sessões semanais de fisioterapia motora, técnica de Rocabado (1979), por 6 meses. Os exercícios fisioterápicos consistem em uma variação de movimento para melhorar a mobilidade por meio de alongamento das estruturas de tecido mole como músculo ou cápsula articular, incluindo:

- Exercícios isométricos para fortalecer os músculos e melhorar a coordenação.

- Exercícios repetitivos para melhorar a biomecânica da articulação e da função muscular.

- Exercícios posturais para reduzir o esforço muscular e articular.

- Exercícios de alongamento para aumentar a variação de movimento articular e alongar o tecido mole.

 

 

 

Com 6 meses de tratamento o aparelho ortopédico de Bimler A foi removido, fizemos a mensuração do valor da abertura bucal, 35 mm, conferimos a oclusão dental, movimentos de lateralidade protrusão e retrusão mandibular. Nova tomografia computadorizada em cortes coronais e axiais de 2 mm foi solicitada, onde foi observado excelente remodelamento condilar.

Foram realizados exames de Tomografia de controle aos 24 meses de tratamento, o paciente apresentava-se com uma abertura de boca de 45 mm, corretos movimentos mandibulares e boa oclusão dental, salientando que o mesmo apresenta-se atualmente com dentadura mista. O controle com TC foram realizadas também aos 36 , 42 e 60 meses sendo que neste último foi ressonância magnética. Em todos os exames de TC foram observados uma perfeita remodelação condilar, sendo impossível observar a região previamente fraturada. A RM mostrou o disco articular normoposicionado em repouso e função.

 

 

 

 

 

SUGESTÃO PARA TRATAMENTO DAS FRATURAS DE CÔNDILO MANDIBULAR EM CRIÂNÇAS.

INDICAÇÃO: Crianças > 5 anos / Paciente e pais colaboradores

• TEMPOS CLÍNICOS

• Diagnóstico;

• Artrocentese;

• Manipulação manual dos cotos fraturados;

• Moldagem dos arcos dentais;

• Registro da MIH em cera 7;

• Instalação de aparelho de Bimler;

• Fisioterapia funcional, técnica de ROCABADO, por 6 meses;

• Acompanhamentos semanais;

• Remoção do aparelho ortopédico de Bimler com 6 meses;

• Acompanhamento clínico por 24 meses.

 

DISCUSSÃO

A deficiência no tratamento da fratura condilar pode promover alteração no desenvolvimento do terço médio - inferior da face no transcorrer de três anos, pelo fato do côndilo estimular o crescimento mandibular, principalmente do ramo mandibular e por sua vez a intercuspidação dentária. 2,5,8 Concordando com o achado dos autores citados, nos prontificamos a tratar a fratura condilar mandibular do paciente, que se encontrava em pleno estágio de desenvolvimento esquelético.

A equipe, disposta a manter os movimentos mandibulares de forma adequada e sustentar o potencial de crescimento mandibular; propôs tratar de modo conservador e funcional a fratura, visando mínima interferência no centro de crescimento mandibular 6,10. É sabido o côndilo sendo umas das zonas de crescimento ósseo mandibular, o tratamento isolado da fratura com fixação poderia resultar em seqüelas como uma diferença no desenvolvimento unilateral do ramo mandibular no lado afetado, sendo assim o protocolo de tratamento proposto sugere um equilíbrio do desenvolvimento mandibular e oclusal do paciente durante a fase de recuperação d fratura e do pós-operatório 2.

Siqueira et al. (1997) apresentaram um caso de fratura de côndilo mandibular bilateral em crianças de 5 anos tratada de modo conservador com aparelho ortopédico Bionator de Balters, por 4 meses, obtendo bons resultados. No caso clínico exposto, objetivamos a otimização do resultado, por isso tratamos a fratura com aparelho ortopédico de Bimler A, por 6 meses, visto que o paciente apresentava sérias tendências à perfil esquelético facial tipo I de Angle, e este aparelho promover um bom estimulo do m. pterigóideo lateral. Sua mecânica é utilizada para remover interferências indesejáveis durante o crescimento e desenvolvimento fisiológico das estruturas estomatognaticas atuando diretamente sobre o sistema neuromuscular, que comanda o desenvolvimento ósseo dos maxilares. Dessa forma, atuando precoce e diretamente sobre a dinâmica mandibular, muscular, facial e óssea, usando as 4 forças naturais; a do crescimento e desenvolvimento; a da erupção; a da postura e movimentos da língua, e da postura e movimentos da mandíbula, não comprometendo o crescimento e desenvolvimento mandibular. Neste caso clinico o uso desse aparelho esta indicado a fim de evitar um atraso no crescimento mandibular do paciente.2.

Antecedendo a instalação do aparelho, optamos pela realização de artrocentese, minimizando chances de anquilose em ATM. Indo de encontro com a literatura atual, a qual relata que todo trauma de grande intensidade em mento pode gerar hemartrose e desenvolver anquilose na ATM, justificando a lavagem dessa articulação. 9

Na tentativa de intensificar o poder ortopédico do aparelho do Bimler A, foi prescrito 6 meses de fisioterapia motora, técnica de Rocabado, duas vezes por semana. Nossa opção vai de encontro a literatura, a qual ainda relata que por haver um alongamento das fibras musculares oferece ao paciente aumento da amplitude bucal e diminuição da mialgia local. 6,9

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O tratamento conservador funcional para fraturas condilares em crianças, através de aparelho de Bimler, associado à artrocentese e fisioterapia apresenta excelentes resultados, desde que se tenha rigoroso controle periódico, bem como boa colaboração do paciente e dos pais.

 

REFERÊNCIAS

1.CAUBI, A. F; COUTINHO, M. F; LIMA, A; PUNGS, M, S; SIMÕES, K. C. Fratura de côndilo: Método de tratamento mais preconizados. Rev. Cir. Traumatol. Buco maxilo facial, 2001; (1): 39 - 45.         [ Links ]

2.COCCARO, P. J. Restitution of Mandibular Form After Condylar Injury in Infancy. Am. J. Orthod. 1969; (55) : 32 – 48.

3.DIJKSTRA, P. U; STEGENGA, B; BONT, L. G. M; BOS, R. R. M. Function Impairment and Pain After Closed Treatment of Fractures of the Mandibular Condyle. J Trauma. 2005; (2): 422 - 28.

4.ELLIS III, E; THROCKMORTON, G. S. Treatment of Mandibular Condylar Process Fractures: Biological Considerations. J Oral Maxillofac Surg. 2005; (63): 115 – 34.

5.ENLOW, D. H. A Morphologic Analysis of Facial Growth. Am J Orthodontics, 1966; (52) 283 - 300.

6.GALLETTI, P. S; MARCHESI, A; CUDIA, G. The Funcional Therapy of Condilar Fractures: a Kinesiographic Follow - up. Minerva Stomatol. 1990; (39) 849 -53.

7.MOSS, M.L. Osteogenesis of Acellular Teleost Bone. Am. J. Anat. 1961; (108) 99 - 110.

8.ORHAN, G; AHMET, K. Remodelling Following Condylar Fractures in Children , J Cranio Maxillofac Surg. 2001; (29) 232 – 37.

9.ROCABADO, M. Cabeza e Cuelo – Tratamiento Articular. Buenos Aires: Intermedica, 1979.

10.SIQUEIRA, J. T. T. Fratura Bicondilar em Crianças: Tratamento Conservador Com Aparelho Ortopédico. J Bras Ortod Ortop Maxilar. 1997; (9): 19 - 34.

 

 

Endereço para correspondência:
Faculdade de Odontologia de Pernambuco - FOP
Av. Gal. Newton Cavalcanti,1650 - Tabatinga
Camaragibe/PE - CEP: 54753-220