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Revista de Cirurgia e Traumatologia Buco-maxilo-facial

versão On-line ISSN 1808-5210

Rev. cir. traumatol. buco-maxilo-fac. vol.15 no.1 Camaragibe Jan./Mar. 2015

 

Artigo Original

 

Custo das hospitalizações por infecções focais dentárias em um município do sul do Brasil

 

Cost of hospitalizations for dental focal infections in a city in southern Brazil

 

 

Morgana FavettiI; Andressa Raquel SpohrII; Renata Zolin FloresIII; Tamara HornIV; Tuane BenettiV; Eduardo Dickie de CastilhosVI; Marcos Antonio TorrianiVII; Tania Izabel BighettiVIII

 

I Cirurgiã-dentista, Faculdade de Odontologia da Universidade Federal de Pelotas, Pelotas, Rio Grande do Sul, Brasil
II Cirurgiã-dentista, Faculdade de Odontologia da Universidade Federal de Pelotas, Pelotas, Rio Grande do Sul, Brasil
III Cirurgiã-dentista, Faculdade de Odontologia da Universidade Federal de Pelotas, Pelotas, Rio Grande do Sul, Brasil
IV Acadêmica, Faculdade de Odontologia da Universidade Federal de Pelotas, Pelotas, Rio Grande do Sul, Brasil
V Cirurgiã-dentista, Faculdade de Odontologia da Universidade Federal de Pelotas, Pelotas, Rio Grande do Sul, Brasil
VI Doutor em Epidemiologia, Departamento de Odontologia Social e Preventiva, Faculdade de Odontologia da Universidade Federal de Pelotas, Pelotas, Rio Grande do Sul, Brasil
VII Doutor em Cirurgia Buco-Maxilo-Facial, Departamento de Cirurgia Buco-Maxilo-Facial, Faculdade de Odontologia da Universidade Federal de Pelotas, Pelotas, Rio Grande do Sul, Brasil
VIII Doutora em Saúde Pública, Departamento de Odontologia Social e Preventiva, Faculdade de Odontologia da Universidade Federal de Pelotas, Pelotas, Rio Grande do Sul, Brasil

Endereço para correspondência

 

 


 

RESUMO

Infecções focais dentárias podem causar complicações sistêmicas e resultar em internação hospitalar. Conduziu-se estudo descritivo de casos de infecções focais dentárias, perfil dos pacientes internados no Pronto-Socorro de Pelotas-RS, e estimativa dos custos dessas internações no período de 2008/2013 com dados provenientes da Faculdade de Odontologia da UFPel. A descrição das variáveis foi realizada por frequências absolutas e relativas, mediana, média/desvio-padrão. A estimativa do custo foi realizada por meio da média dos valores das Autorizações de Internações Hospitalares com CID K04/K05, repassados pela SMS-Pel. Dos 417 registros coletados, 52,8% eram mulheres, tinham entre 18-39 anos de idade (55,9%) e eram oriundos de Pelotas-RS (95%). A média etária foi de 25,5 anos (± 13,7 anos). Dos 417 indivíduos atendidos, 88,5% foram medicados, prevalecendo combinações de medicamentos (67,6%). A falta de registros foi observada para todas as variáveis, exceto sexo. Foram identificadas 63 internações. O custo médio para o município foi de R$ 347,67. Das urgências observadas, 6,9% eram decorrentes de infecções focais dentárias, sensíveis a intervenções na Atenção Básica. Considerando custos em internações de urgências odontológicas, e, sendo possível preveni-las, sugerem-se novas abordagens sobre o tema. É necessário qualificar registros para adequado monitoramento dessa demanda, verificando seu impacto na redução das internações.

Palavras-chave: Infecção focal dentária. Custos e análise de custo. Hospitalização. Sistema Único de Saúde. Custos e análise de custo.


 

ABSTRACT

Dental focal infections can cause systemic complications and result in hospitalization. We conducted a descriptive case study of dental focal infections, patients characteristics admitted to the Emergency Room of Pelotas, and estimated costs of hospital admissions in the period 2008/2013 with data from the School of Dentistry Federal University of Pelotas. The description of the variables was performed by absolute and relative frequencies, median, mean and standard deviation. The cost estimate was performed using average values of Authorizations Hospitalizations with ICD K04 / K05, provided by the SMS-Pel. Of the 417 selected records, 52.8% were women, aged between 18-39 years old (55.9%) and originating from Pelotas (95%). Mean age was 25.5 years (± 13.7 years). Of total 417 individuals, 88.5% were prescribed, whichever drug combinations (67.6%). The lack of records was found for all variables except sex. Were identified 63 hospitalizations. The average cost for the city was (R$ 347.67). Of the emergencies observed, 6.9% were due to sensitive interventions in primary care dental focal infections. Considering costs for dental emergencies admissions, and prevent thembeing possible, were suggest new approaches to the topic. It is necessary to qualify records for proper monitoring of this demand, checking its impact in reducing hospitalizations.

Key words: Dental focal infection. Referral and consultation. Hospitalization. Health System. Costs and Cost analysis.


 

INTRODUÇÃO

As infecções focais dentárias são complicações polimicrobianas, resultantes de alterações originadas em alguma estrutura dentária ou periodontal. Em pacientes adultos, a maior prevalência ocorre acima dos 30 anos1.

O diagnóstico preciso é fundamental para adoção da terapia adequada o mais rápido possível, impedindo, assim, o surgimento de outras complicações, que, apesar de raras, não podem ser descartadas, quando se considera sua morbidade. As complicações dependem do tipo e da localização do processo, da virulência dos microrganismos envolvidos e do status do sistema imune do hospedeiro2.

O protocolo de tratamento geralmente inclui remoção da causa, drenagem e antibioticoterapia, podendo ser realizado na rede básica de saúde. Se essas intervenções não forem feitas adequadamente, podem gerar uma demanda excessiva nos serviços de atendimento de urgência e uso inadequado de antibióticos, gerando resistência3. Esse agravo frequentemente remete à necessidade de internação, em que o tempo médio é de cerca de cinco dias, até a resolução ou controle da infecção4.

No município de Pelotas/RS, a rede básica de saúde bucal é constituída por 45 unidades básicas de saúde, e as internações são feitas em mais de um serviço. Em não havendo estudos que apontem o significado das internações por problemas de origem bucal para os serviços de saúde no município, o objetivo desta pesquisa foi descrever o perfil dos pacientes com infecções focais dentárias e a necessidade de internação hospitalar, além de estimar os custos que estas representam para a rede pública de saúde do município de Pelotas/RS.

 

METODOLOGIA

Trata-se de um estudo observacional transversal descritivo, aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Pelotas (Parecer n0 416.751).

Foi desenvolvido em três fases de coleta de dados relativos a:

1. Casos com diagnóstico de infecção focal dentária, no período de fevereiro de 2008 a dezembro de 2013, no sistema de registro dos atendimentos da Residência em Cirurgia e Traumatologia BucoMaxiloFacial (CTBMF) da Faculdade de Odontologia da Universidade Federal de Pelotas (FO-UFPel),que desenvolve atividades no Pronto-Socorro Municipal de Pelotas (PSMSPel)e no Hospital Universitário São Francisco de Paula, da Universidade Católica de Pelotas (HUSFP-UCPel);

2. Casos de internações que foram realizadas no Serviço de Arquivo Médico e Estatística (SAME) do HUSFP-UCPel e no PSMSPel: a partir do acesso a prontuários, sendo que os dados relativos a 2008 e 2009, coletados a partir dos livros mensais e de 2010 a 2013 a partir de sistema informatizado;

3. Valores repassados nas Autorizações de Internações Hospitalares (AIH) com Classificação Internacional de Doenças (CID) K04 (Doenças da polpa e dos tecidos periapicais) e K05 (Gengivite e doenças periodontais) no período de 2008 a 2013, registrados no Setor de Regulação e Contratualização da Secretaria Municipal de Saúde de Pelotas (SMSPel).

As variáveis de estudo foram: nome do paciente; data do atendimento; sexo; idade em anos completos; município em que reside; prescrição de medicação: sim (1) / não (2); abordagem cirúrgica: sim (1) / não (2); internação: sim (1) / não (2); tempo de internação em dias; outros procedimentos realizados: sim (1) / não (2) e tipo.

A estimativa do custo de internação foi rea-lizada por meio da média dos valores repassados nas Autorizações de Internações Hospitalares (AIH) com Classificação Internacional de Doenças (CID) K04 e K05.

Foi realizado um estudo-piloto, para se identificarem possíveis problemas na ficha de coleta como também verificar o tempo médio para a coleta dos dados de interesse.

Os dados foram coletados e armazenados em planilhas específicas, digitadas em dois bancos independentes e validados, utilizando-se o programa Epi Data, versão 3.1.

Para as variáveis qualitativas, foram calculadas frequências absolutas e relativas, e para as variáveis quantitativas, a mediana, a média e o desvio-padrão. Os resultados foram descritos e apresentados em tabelas.

 

RESULTADOS

A partir das fichas da Residência de (CTBMF), foram observados 417 registros de atendimento (Tabela 1), de um total de 6.019 fichas (6,9%), com maior proporção de indivíduos do sexo feminino (52,8%), na faixa etária de 18 a 39 anos (55,9%). Eram provenientes de Pelotas/RS (95%) e foram atendidos nos anos de 2009 e 2013 (28,8% e 27,1% respectivamente). A idade média dos indivíduos atendidos foi de 25,5 anos (± 13,7 anos). Foram registradas 16 internações (Tabela 2). Dos 417 indivíduos atendidos, 88,5% foram medicados, sendo que as combinações de medicações prevaleceram (67,6%). Outros procedimentos foram realizados para 89 indivíduos, sendo que 60,7% se referiram a encaminhamentos para atendimento odontológico (Tabela 3). A falta de registros foi observada para todas as variáveis analisadas, exceto sexo.

A partir dos dados do SAME do HUSFP-UCPel e do PSMPel, foram identificadas 47 internações, sendo que, em 25 prontuários, não havia informações sobre prescrição de medicamentos. Nos registros das 22 internações em que havia prescrição de medicamentos, tratava-se de analgésicos, antiinflamatórios e antibióticos.

A partir dos dados repassados pela Secretaria Municipal de Saúde de Pelotas, foram identificadas 265 internações originadas por CID K04 (Doenças da polpa e dos tecidos periapicais) e CID K05 (Gengivite e doenças periodontais), sendo que o valor pago para cada uma dessas internações independia dos dias que o paciente permaneceu internado. Além disso, nos valores repassados aos serviços contratados, estavam inclusas medicações e o material necessário para possíveis procedimentos, de acordo com o CID. O valor médio dessas internações foi de R$ 347,67.

 

 

 

 

 

 

 

DISCUSSÃO

Os resultados do presente estudo mostraram que os atendimentos oriundos de infecções focais dentárias realizados no PSMPel referiram-se em sua maior parte a adultos, moradores do município de Pelotas, com uma leve predominância do sexo feminino, que foram medicados e encaminhados para assistência odontológica. Também apontaram limitações nos registros.

Alguns estudos internacionais mostraram que, entre a população que tem acesso a serviços odontológicos a predominância, é do sexo feminino5. Isso poderia ser explicado em parte pelo fato de que as mulheres teriam maior disponibilidade de tempo para comparecer às unidades de saúde pública no horário de funcionamento; embora a diferença aqui detectada não seja de grande monta, o que poderia indicar que a procura nos casos de urgência independe de disponibilidade e sim de necessidade.

As Diretrizes da Política Nacional de Saúde Bucal foram elaboradas e propostas no ano de 20046. O município de Pelotas passou por uma série de mudanças, visando à reestruturação do modelo de assistência em saúde bucal a partir de 2012. Isso se deu com a inserção das primeiras ESB na ESF, inauguração do Centro de Especialidades Odontológicas (CEO) e elaboração de protocolos de referência e contra-referência7. Essas mudanças tendem a melhorar o acesso aos serviços odontológicos, entretanto, por serem recentes, quando se observam os dados obtidos nesta pesquisa, ainda não revelam uma melhora significativa dos atendimentos nas UBS, visto que, nos anos de 2009, foram atendidos 124 (29,7%) e, em 2013, 113 (27,1%) casos no PSMS-Pel devido à infecção focal dentária.

Um dos aspectos importantes deste estudo é fazer uma reflexão sobre as hospitalizações oriundas de causas dentárias que podem ser consideradas sensíveis a cuidados ambulatoriais e/ou evitáveis8. A Atenção Básica constitui o primeiro nível de atenção do Sistema Único de Saúde (SUS). Pressupõe um conjunto de ações, voltadas para a promoção da saúde, prevenção de agravos, diagnóstico, tratamento, reabilitação e manutenção da saúde, empregadas de modo individual ou coletivo3. As ações desenvolvidas expressam os princípios e as diretrizes da Política Nacional de Saúde Bucal6 que contemplam os seguintes pressupostos: qualificação da atenção básica de maneira que tenha qualidade e seja resolutiva, articulação da rede básica com toda a rede de serviços, integralidade das ações, utilização da epidemiologia e informações do território para o planejamento bem como o acompanhamento do impacto das ações por meio de indicadores6.

As infecções de origem dentária, periapical ou periodontal, podem ser prevenidas na Atenção Básica por meio de educação em saúde e escovação dental supervisionada e suas sequelas recuperadas mediante de procedimentos restauradores e periodontais básicos, todos financiados pelo Piso da Atenção Básica. Muitos dos casos já infectados podem ser tratados na Atenção Básica e ser resolvidos antes do agravo que determine uma internação, contudo, quando não ocorre a intervenção adequada, esse quadro vai evoluindo, muitas vezes devido à negligência do próprio paciente, e o agravo costuma induzi-lo a procurar as emergências, por considerar que a Atenção Básica não irá resolvê-lo9. A dificuldade de conseguir "fichas" para atendimento, somado ao fato de, muitas vezes, ter que ir para as filas em madrugada para conseguir uma consulta, faz com que a maioria da população opte por procurar o atendimento no hospital, pois acredita que, assim, será atendido mais rapidamente. Cabe destacar que o Pronto Atendimento da FO-UFPel também atende os casos de urgência diurna, entretanto esses dados não se incluíram na pesquisa.

O acesso aos serviços odontológicos de maneira regular ainda é restrito a uma pequena parcela da população com percentuais que representam, em média, 32,8%10. Ao se reportar esse percentual para a população de Pelotas/RS a partir de estimativas populacionais11, significa que em torno de 220.416 habitantes não têm acesso a serviço odontológico de maneira regular, ficando os demais dependentes dos serviços de urgência. Ao se considerar que deste total, em média 70% dependem, exclusivamente, do serviço público, os 417 casos identificados no PSMSPel representam em torno de 3 entre 1.000 habitantes do município que necessitaram de serviço de urgência, por não terem suas necessidades odontológicas resolvidas na Atenção Básica.

Atualmente o município de Pelotas/RS dispõe de 51 unidades básicas de saúde, sendo que 45 delas contemplam serviços de saúde bucal com 64 cirurgiões-dentistas e 17 auxiliares de saúde bucal12. Considerando a média de 70% da população SUS dependentes no Brasil, isso representa uma relação 1,1 cirurgião-dentista para cada 4.000 habitantes, proporção próxima da estabelecida pela Política Nacional de Atenção Básica para as Equipes de Saúde Bucal (ESB) na Estratégia de Saúde da Família (ESF)13. Porém, se sabe que essa distribuição não é homogênea no município, bem como suas diretrizes têm sido incorporadas pelos profissionais da saúde bucal, de forma a modificarem suas práticas com inserção de ações de promoção de saúde e prevenção de doenças bem como ampliação de ações assistenciais na Atenção Básica14.

A efetividade da Atenção Básica é de interesse para os políticos, planejadores e gestores em saúde. Pacientes submetidos a cuidados ambulatoriais de qualidade deficiente se apresentarão ao sistema de saúde novamente com doença avançada, com uso mais frequente dos serviços de emergência, estando mais propensos a necessitar de cuidados mais caros e com, provavelmente, resultados menos favoráveis. Os valores totais pagos pelas hospitalizações evitáveis devem ser interpretados como possibilidades de economias no sistema local de saúde que, dirigidos para a Atenção Básica, poderiam aumentar a efetividade dos cuidados15.

Além disso, procedimentos mais complexos, como endodontias e cirurgias periodontais, também podem ser encaminhados aos CEOs, que têm financiamento específico16.

Sabe-se, também, que podem ocorrer internações de caráter social, ou seja, situações em que os pacientes, embora não tenham necessidade de internação, permanecem internados para receberem dosagem correta da medicação, bem como alimentação adequada. É importante que seja considerado também que, além do custo para o SUS, tem-se o custo social, isto é, o paciente que necessitou de internação e por esse motivo deixou de ir trabalhar.

A gestão municipal tem-se empenhado na busca de incentivos financeiros para a organização, ampliação e reestruturação dos serviços com a inclusão das Unidades de Pronto Atendimento (UPA) desde 2010 e, nesse sentido, é importante a inclusão de serviços de saúde bucal nestes espaços, para reduzir a busca da população pelos serviços hospitalares17. Nesse sentido, é importante a inclusão de serviços de saúde bucal nesses espaços para atender a grande demanda de urgências odontológicas em horários de não funcionamento das UBS. Com isso, espera-se uma diminuição na procura por atendimento no PSMPel devido a infecções focais dentárias e menos casos em que as infecções estejam agravadas. Somado a isso, é necessário um sistema que seja resolutivo, integral e equânime, com uma prática preventiva e não apenas curativa, promovendo saúde, onde todos tenham acesso ao tratamento necessário.

A busca de serviços de urgência pela população através de hospitais e não pela Atenção Básica foi observada em Belo Horizonte por Pires et al.14. Esse aspecto merece ser investigado no município de Pelotas, pois pode ser um dos motivos da alta busca por atenção no Pronto-Socorro.

No acesso equitativo à saúde, ao invés da criação de demandas a partir da oferta indiscriminada de serviços, os serviços é que precisam estruturar-se a partir das exigências e dos problemas de saúde dos cidadãos14. Este é um dos motivos do estabelecimento das Redes de Atenção à Saúde com o objetivo de caracterizar os diversos pontos de entrada dos usuários dos serviços e organizá-los de forma resolutiva18.

Outro aspecto a ser considerado pela SMSPel diz respeito à contratação da prestação de serviços para municípios da região. Embora o percentual de indivíduos não residentes no município e que procuraram o PSMPel tenha sido de 2,9%, na transição entre o Pacto pela Saúde e o Contrato Organizativo de Ação Pública (COAP), há metas e indicadores previstos para as pactuações que devem ser considerados; pois podem interferir nos recursos financeiros repassados pelo nível federal ao município19. Este estudo analisou dados relativos a um período anterior à reestruturação da saúde bucal no município de Pelotas/RS, e os resultados podem não mais representar a realidade atual. Possivelmente inserção das primeiras ESB na ESF, a instalação do CEO e o estabelecimento de protocolos de referência e contra-referência impactaram positivamente na diminuição das hospitalizações, embora isso só possa ser confirmado com uma análise mais específica e precisa dos dados relativos. Porém a mudança de modelo de atenção é um processo, que envolve a participação da gestão, dos profissionais e da comunidade. Os resultados de pesquisas como esta podem contribuir com a reorganização dos serviços, apontando, talvez, para a ampliação do sistema, de forma a torná-lo mais abrangente e racional.

Nesta pesquisa, as buscas em prontuários evidenciaram a precariedade das informações a exemplo do que foi apontado no estudo de Bittencourt et al.20 em revisão de literatura de artigos publicados em revistas científicas, no período de 1984 a 2003, sobre aplicações dos dados do Sistema de Informação Hospitalar do SUS (SIH/SUS). Os autores apontaram a necessidade de maior envolvimento dos profissionais de saúde na valorização dos registros. No presente estudo, não se encontrou nos prontuários o diagnóstico efetuado pelos profissionais com a codificação pela CID, mas esta apareceu nos valores repassados nas Autorizações de Internações Hospitalares (AIH).

Estratégico para a decisão clínica e gerencial, para o apoio à pesquisa e formação profissional, atualmente o registro é considerado critério de avaliação da qualidade da prestação de serviços de saúde, sendo ponto-chave para informar acerca do processo de trabalho. Para tal faz-se necessário ter informações confiáveis por meio de prontuários com qualidade do registro em saúde, mediante incentivo à sua estruturação com campos obrigatórios, de forma padronizada. Ter um sistema de informação efetivo é uma estratégia para contribuir com a avaliação na perspectiva de promover a garantia de qualidade dos serviços.

 

CONCLUSÃO

Os resultados deste estudo apontaram que a maioria dos casos de procura por serviço de emergência do PSMPel cuja motivação é por infecções focais dentárias, poderiam ser evitadas com um adequado tratamento nas UBS. O valor médio das internações por causas de origem dentária no período de 2008 a 2013 foi de R$ 347,67. Considerando o montante de recursos estimado em internações oriundas de urgência odontológica, e a capacidade de prevenir essas situações com intervenções na Atenção Básica, sugerem-se novas abordagens sobre o tema a fim de melhor entender o fenômeno.

Medidas que qualifiquem o registro são necessárias para permitir o adequado monitoramento dessa demanda por meio do preenchimento completo e correto das fichas e prontuários de dados, facilitando, assim, o seu uso para futuras pesquisas.

 

REFERÊNCIAS

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18. Brasil. Presidência da República. Casa Civil. Subchefia para Assuntos Jurídicos. Decreto n0 7.508, de 28 de junho de 2011. [Regulamenta a Lei no 8.080 de 19 de setembro, para dispor sobre a organização do Sistema Único de Saúde – SUS, o planejamento da saúde, a assistência à saúde e a articulação interfederativa, e dá outras providências].Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2011/decreto/D7508.htm. Acesso em 26 mai 2014.

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Endereço para correspondência:
Morgana Favetti
R. Alvaro Chaves, núm. 2015 , apto. 203
CEP: 96010-760
Pelotas, RS – Brasil
e-mail: morganafavetti@yahoo.com.br

 

Recebido: 02/12/2014
Aceito: 19/03/2015