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Revista de Cirurgia e Traumatologia Buco-maxilo-facial

versão On-line ISSN 1808-5210

Rev. cir. traumatol. buco-maxilo-fac. vol.15 no.1 Camaragibe Jan./Mar. 2015

 

Artigo Original

 

Prevalência de cistos dentígeros na Universidade Federal do Paraná

 

Dentigerous cysts prevalence at Federal University of Paraná

 

 

Guilherme dos Santos TrentoI; Paola Fernanda Cotait de Lucas CorsoII; Gabriela DottoIII; Isadora Fernanda KleinIV; Rafaela ScariotV; Delson João da CostaVI

 

I Residente do Serviço de Cirurgia e Traumatologia Bucomaxilofaciais da UFPR
II Residente do Serviço de Cirurgia e Traumatologia Bucomaxilofaciais da UFPR
III Cirurgiã-dentista pela UFPR
IV Cirurgiã-dentista pela UFPR
V Professora da Residência em Cirurgia e Traumatologia Bucomaxilofaciais da UFPR e Professora do Programa de Graduação e Pós-Graduação da Universidade Positivo
VI Professor da Residência em Cirurgia e Traumatologia Bucomaxilofaciais da UFPR

Endereço para correspondência

 

 


 

RESUMO

O cisto dentígero destaca-se como o mais comum entre os cistos odontogênicos de desenvolvimento dos ossos maxilares. Frequentemente são encontrados em exames radiográficos de rotina devido a alterações na cronologia de erupção dentária. O tratamento dessas lesões varia de acordo com a presença de sintomatologia dolorosa, tamanho e proximidade com estruturas anatômicas nobres. O objetivo deste trabalho foi avaliar a prevalência de cisto dentígero no Serviço de Cirurgia e Traumatologia Buco-Maxilo-Facial da Universidade Federal do Paraná, entre 2008 e 2010. Durante esse período, foram avaliados 24 prontuários de pacientes com cisto dentígero. Dados, como gênero, idade, localização e forma de tratamento da lesão, foram coletados. Os resultados mostraram predileção pelo gênero masculino (63%), com maior incidência na segunda década de vida (42%), estando geralmente localizado na região posterior da mandíbula (62%). A principal forma de tratamento foi a enucleação associada ou não à extração do elemento dentário envolvido (75%). Todos os tratamentos mostraram-se eficazes com regressão da lesão após acompanhamento clínico e radiográfico.

Palavras-chave: Cisto Dentígero; Patologia; Mandíbula; Epidemiologia.


 

ABSTRACT

The dentigerous cyst stands out as the most common among odontogenic cysts development of the jaws. They are often found in routine radiographic examination due to changes in timing of tooth eruption. The treatment of these lesions varies according to the presence of painful symptoms, size and proximity to significant anatomical structures. The objective of this study was to evaluate the prevalence of dentigerous cystin Surgery and Traumatology Oral and Maxillofacial at Federal University of Paraná between 2008 and 2010. During this period were evaluated 24 medical records of patients with dentigerous cyst. Data such as gender, age, location and method of treatment of the injury were collected. The results showed a predominance of male patients (63%), with the highest incidence in the second decade of life (42%) and is usually located in the posterior mandible (62%). The main form of treatment was enucleation with or without the extraction of the involved tooth (75%). All treatments were effective with regression of the lesion after clinical and radiographic follow-up.

Descriptors: Dentigerous Cyst; Pathology, Mandible; Epidemiology.


 

INTRODUÇÃO

Dentre os cistos odontogênicos, o cisto dentígero destaca-se como um dos mais estudados devido às suas características clínicas e radiográficas específicas.1 É considerado o cisto mais comum entre os cistos odontogênicos de desenvolvimento e o segundo cisto mais prevalente2-4, respondendo por 25,3% de todos os cistos maxilares da população brasileira.5

A formação desse cisto parece ser resultado do acúmulo de líquido entre o epitélio reduzido do esmalte e o esmalte ou entre as camadas do epitélio reduzido do esmalte.5 A expansão do cisto é relacionada ao aumento da osmolaridade, resultado da passagem de células inflamatórias e líquido inters-ticial para dentro do cisto assim como da descamação de células epiteliais provenientes da cápsula cística para o lúmen do cisto.6

Clinicamente, os cistos dentígeros são lesões benignas, assintomáticas, de evolução lenta sendo, normalmente, encontrados em exames radiográficos de rotina ou devido à falha na erupção de algum elemento dental.1 Radiograficamente, caracteriza-se por uma imagem radiolúcida unilocular bem circunscrita e margem esclerótica associada à coroa de um dente incluso.7,8 O diagnóstico definitivo é obtido após avaliação histopatológica apresentando cápsula constituída por camada de tecido conjuntivo com revestimento interno de fino tecido epitelial pavimentoso estratificado.9

O tratamento mais comum associado a cistos dentígeros é a enucleação associada à extração do elemento dental envolvido. Quando a erupção do elemento dental pode ser considerada, este pode ser deixado em sua posição após remoção parcial da parede cística. Cistos dentígeros de grandes dimensões podem ser tratados através da marsupialização, que permitirá a descompressão do cisto, resultando na redução do defeito ósseo. Esses cistos podem, então, ser removidos após algum tempo, com procedimento cirúrgico menos agressivo.10

O objetivo deste trabalho foi traçar um perfil de pacientes com cisto dentígero por meio dos dados obtidos nos prontuários no Serviço de Cirurgia e Traumatologia Buco-Maxilo-Facial da Universidade Federal do Paraná.

 

METODOLOGIA

Um estudo retrospectivo foi conduzido com base em prontuários de pacientes atendidos no Serviço de Cirurgia e Traumatologia Buco-Maxi-lo-Facial no Departamento de Estomatologia na Faculdade de Odontologia da Universidade Federal do Paraná, entre os anos de 2008 e 2010, relativos aos casos de lesões diagnosticadas como cistos dentígeros.

Foram coletados os dados dos pacientes (gênero e idade) e, também, os dados clínicos (localização e tratamento). A localização da lesão foi registrada a partir da divisão da mandíbula e maxila em região anterior – região dos dentes incisivos e caninos bilateral - e posterior – região entre os dentes pré-molares e molares bilateral.

Dados coletados sem confirmação de exa-me histopatológico ou informações insuficientes foram excluídos da amostra.

 

RESULTADOS

Durante o período da pesquisa, foram diagnosticados e tratados vinte e quatro casos de cistos dentígeros, os quais 63% são do gênero masculino (n=15) e 37%, do gênero feminino (n=9).

A faixa etária variou de oito a quarenta e oito anos, sendo a maioria dos casos diagnosticados e tratados na segunda década de vida, totalizando aproximadamente 42%. Nas terceira e quinta décadas de vida, foram encontrados quatro casos em cada uma, apenas um caso na quarta década e cinco casos na primeira década de vida. A idade média encontrada foi de dezoito anos.

Quanto à localização, 62% das lesões, ou seja, quinze casos foram descritos na região posterior da mandíbula. O segundo local de predileção foi a região anterior da maxila, apresentando 29% dos casos. Dois casos apresentavam-se localizados na região posterior da maxila enquanto que, na região anterior da mandíbula, nenhum cisto dentígero foi descrito. A localização das lesões apresenta-se de forma mais evidente associado ao terceiro molar inferior.

Em relação ao tipo de tratamento aplicado, observamos que, em 22 casos (92%), optou-se pela enucleação da lesão. Desses casos, dez pacientes tiveram associação de extração do elemento dentário envolvido. Outros tipos de tratamento de escolha foram: marsupialização (n=1) e descompressão cística com dreno (n=1).

 

DISCUSSÃO

A maior prevalência de cistos dentígeros no gênero masculino, encontrada em nosso trabalho, pode ser evidenciada por outros autores, como Yeo et al., em 2007.11 Além disso, Mourshed et al., 1964, em uma análise de cento e oitenta casos de cistos dentígeros, relatou uma proporção entre o gênero masculino e feminino de 1.6:1,12 semelhante aos nossos achados com essa proporção, sendo 1.7:1. No entanto, Dias et al., em 2014, encontraram uma proporção de praticamente 1:1 entre os gêneros13.

Em 2009, Costa14 relatou que, na maioria das publicações, grande parte dos cistos dentígeros são diagnosticados em pacientes com idades compreendidas entre 11 e 20 anos, concordando com nosso estudo que apresentou uma frequência de 42% de casos na segunda década de vida. Entretanto, alguns autores referirem que é o cisto mais comum em populações pediátricas com frequências entre 20.7% e 45%. Browneem, 1971, suspeita que o fato de haver casos na quinta década de vida15 – nosso estudo aponta quatro casos – deve-se ao fato de ser um descobrimento tardio da lesão de cisto dentígero.

Mourshed em 1964 e Shear em 1999 apresentaram dados semelhantes ao nosso estudo, ao apontar que os cistos dentígeros estão localizados com maior frequência, na região posterior da mandíbula, seguido da região anterior de maxila.12,16 Dias et al., em 2014, evidenciaram discreta predileção pela mandíbula.13 Tal conclusão provavelmente está associada ao frequente envolvimento com terceiros molares inferiores impactados, caninos superiores e, às vezes, a dentes supranumerários superiores. No entanto, Yeo et al., em 2007, chegaram a resultados que mostravam a maxila levemente mais afetada que a mandíbula, 50,9% e 49,1%, respectivamente.11

Segundo Smith e Kellman17, em 2005, o tratamento cirúrgico mais empregado ao cisto dentígero é a enucleação do cisto e remoção do dente envolvido. Em nosso estudo, tal método de tratamento foi aplicado em aproximadamente 92% dos casos, sendo o método de associação mais utilizado. Em alguns casos, observamos que o elemento dentário pode ser preservado, quando se trata de pequenos cistos, os quais podem ser enucleados mais facilmente. Em nosso estudo, tal técnica foi o segundo método mais utilizado com bons resultados no período de postergação.

Ainda, Smith e Kellman relatam que uma fase inicial descompressiva da lesão de cisto dentígero, aplicando a técnica de descompressão ou a de marsupialização diminuirá o tamanho do cisto e do defeito ósseo, sendo perfeitamente aplicado em casos de cistos extensos ou em crianças em que os germens dentários permanentes podem ser lesados ou desvitalizados, ao se realizar uma enucleação. Tal afirmação defende dois casos de nosso estudo, pois, após a lesão apresentar seu tamanho diminuído, foram removidas com maior facilidade. Em nossa experiência, observamos que essas duas técnicas requerem maior cuidado e atenção do paciente e profissional respectivamente para acompanhamento da evolução das lesões pela maior chance de infecção devido à entrada de restos alimentares e dificuldade de higienização no local. Portanto, a técnica foi bem empregada para ambos os pacientes que apresentaram cistos extensos durante a primeira década de vida com comprometimento de estruturas nobres da região afetada.

Até o presente momento, não encontramos registros de recidiva em nenhum dos casos estudados nesta pesquisa.

Podemos destacar o segundo maior número de casos das lesões encontrar-se na primeira década de vida, o que muitos relatos afirmam ser raro. Apesar da pequena amostra estudada, os tratamentos preconizados têm apontado para índices satisfatórios de sucesso a logo prazo.

 

CONCLUSÃO

Observamos perfil epidemiológico semelhante a outros autores, com predileção dos cistos dentígeros pelo gênero masculino, região posterior de mandíbula e tratamento mais comum sendo a enucleação. Entretanto, encontramos maior incidência do aparecimento dessas lesões em pacientes na segunda década de vida, diferente da maioria dos resultados encontrados anteriormente.

 

REFERÊNCIAS

1. Neville BW, et al. Patologia oral e maxilo-facial. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2002, p. 590-593.         [ Links ]

2. Falkinhoff P, Amer M. Dentigerouscystsinchildren. Int J Oral MaxillofacSurg 1999;28:36.

3. Regezi JA, Sciubba J. Oral Pathology: Clinical-PathologicCorrelations. 2nd ed. Philadelphia, PA: WB Saunders, 1993:326-32.

4. Tsukamoto G, Sasaki A, Akiyama T, et al. A radiologicanalysisof dentigerouscystsand odontogenickeratocysts associated with a mandibular third molar. Oral Surg Oral Med Oral Pathol Oral RadiolEndod 2001;91:743-7.

5. Grossmann SM, Machado VC, Xavier GM, et al. Demographic profile of odontogenic andselected nonodontogeniccystsin a Brazilianpopulation. Oral Surg Oral Med Oral Pathol Oral RadiolEndod 2007;104:35-41. 6. Ziccardi B, Egglesten TI, Schneider RE. Using fenestration technique to treat a large dentigerous cyst. J Am Dent Assoc 1997;128:201-5.

7. Safira LC, Paim JM, Carneiro Jr B, Queiroz CS, Oliveira TB, Ramalho LP, et al. Cisto dentígero em mandíbula: relato de caso clínico. R. Ci. méd. biol. 2009;8(2):225-9.

8. Motamedi MH, Talesh KT. Management of extensive dentigerous cysts. Br. Dent. J. 2005;198(4):203-6.

9. Domingues AM, Gil JN. Cistos odontogênicosintra-ósseos-Diagnóstico e tratamento. Livraria Santos Editora Com. Imp. Ltda., 2007.

10. Bataineh AB, Rawashdeh MA, AlQudah MA. Theprevalenceof inflammatoryanddevelopmental odontogeniccystsin a Jordanianpopulation: a clinicopathologicstudy. Quintessence Int2004; 35: 815–819.

11. Yeo JF, etal. Clinicopathologicalstudyof dentigerouscystsinSingaporeandMalaysia. Malaysian J Pathol 2007; 29(1): 41-47.

12. Mourshed F. A roentgenographic study of dentigerous cysts: III. Analysis of 180 cases. Oral Surg Oral Med Oral Pathol1964; 18: 66-73.

13. Dias D, et al. PerfilEpidemiológico de pacientescom diagnostic de quistoodontogênicoemumauniversidade de odontologia. Rev Port Estomatolog Med Dent Cir Maxilofac. 2014; 55(4):238-42.

14. Costa PS. Estudo da incidência de cistos odontogênicoshistopatologicamente diferenciados numa população portuguesa [dissertação]. Porto: Universidade do Porto. 2009.

15. Browne RM. Metaplasia and degeneration in odontogenic cysts in man. J Oral Pathol 1971; 1: 145-8.

16. Shear M. Cistos da Região Bucomaxilofacial. 3rd ed. São Paulo, Brazil: Livraria Santos Editora, 1999.

17. Smith JL, Kellman RM. Dentigerous cyst presenting as a head and neck infections. Otolaryngol Head Neck Surg. 2005; 133(2): 715-7.

 

 

Endereço para correspondência:
Universidade Federal do Paraná
Avenida LotharioMeissner, 632 - Jardim Botânico
Curitiba, Paraná, Brasil

e-mail:
guilhermetrento@yahoo.com.br

 

Recebido: 30/01/2015
Aceito: 19/03/2015