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RGO.Revista Gaúcha de Odontologia (Online)

versão On-line ISSN 1981-8637

RGO, Rev. gaúch. odontol. (Online) vol.58 no.1 Porto Alegre Jan./Mar. 2010

 

ORIGINAL ORIGINAL

 

Saúde bucal e sua associação com o estado nutricional e a condição socioeconômica em adolescentes

 

Oral health and its association with nutritional status and socioeconomic condition in adolescents

 

 

Maria Goreti Aléssio CrispimI; Luciane Peter GrilloI,1; Elisete Navas Sanches PrósperoI; Aline Brandão MariathII

IUniversidade do Vale do Itajaí, Saúde e Gestão do Trabalho. Rua Uruguai, 458, Centro, 88302-202, Itajaí, SC, Brasil
IIUniversidade de São Paulo, Faculdade de Saúde Pública. São Paulo, SP, Brasil

 

 


RESUMO

OBJETIVO: Avaliar a saúde bucal de adolescentes e sua associação com o estado nutricional e a condição socioeconômica.
MÉTODOS: A população foi constituída por 313 adolescentes, com idade entre 15 e 19 anos. O índice CPO-D foi avaliado utilizando-se o formulário proposto pela Organização Mundial da Saúde para levantamentos epidemiológicos em saúde bucal. Para o diagnóstico do estado nutricional, calculou-se o índice de massa corporal, classificado conforme o padrão de referência do National Center for Health Statistics e os pontos de coorte recomendados pela Organização Mundial da Saúde. Os dados socioeconômicos foram obtidos pelo questionário da Associação Brasileira de Anunciantes/Associação Brasileira de Institutos de Pesquisa de Mercado. Adotou-se nível de significância de 5%.
RESULTADOS: Observou-se predominância de adolescentes do sexo masculino (70,9%) e de 15 anos (31,3%). A maioria dos adolescentes apresentava CPO-D maior que zero (81,2%), era eutrófica (88,5%) e foi classificada socioeconomicamente como C e D (49,2% e 38,0%, respectivamente). Houve aumento significativo das médias do índice de CPO-D com a idade (F=44,65; p<0,001). Encontraram-se maiores prevalências de CPO-D maior que zero entre o sexo masculino, entre os adolescentes mais jovens e entre aqueles de classe socioeconômica C. Não houve associação significativa entre a classificação do CPO-D e o estado nutricional.
CONCLUSÃO: Destaca-se a necessidade de maior enfoque para a Odontologia preventiva nos serviços de atenção básica em saúde, com o compromisso das ações de saúde coletivas nos diferentes níveis do governo.

Termos de indexação: condições sociais; estado nutricional; saúde bucal; saúde do adolescente.


ABSTRACT

OBJECTIVE: To assess the oral health of adolescents and its association with nutritional status and socioeconomic condition.
METHODS: The population consisted of 313 adolescents, aged between 15 and 19 years. DMFT index was assessed using the form proposed by the World Health Organization for epidemiological surveys in oral health. For the diagnosis of nutritional status, body mass index was calculated, classified in accordance with the standard reference of the National Center for Health Statistics and the cut off points recommended by the World Health Organization. Socioeconomic data were obtained using the questionnaire of the Brazilian Association of Advertisers/Brazilian Association of Market Research Institutes. The level of significance adopted was 5%.
RESULTS: Predominance of male adolescents (70.9%) aged 15 years (31.3%) was observed. The majority of the adolescents had DMFT higher than zero (81.2%), were eutrophic (88.5%), and were classified socioeconomically as Classes C and D (49.2% and 38.0%, respectively). There was a significant increase in DMFT index means with age (F = 44.65, p <0.001). Greater prevalences of DMFT higher than zero were found among males, among younger adolescents and among those of socioeconomic class C. There was no significant association between the classification of the DMFT and nutritional status.
CONCLUSION: We point out the need for greater focus on preventive dentistry in the primary health care services, with commitment to collective health actions at the different levels of government.

Indexing terms: social conditions; nutritional status; oral health; adolescents health.


 

 

INTRODUÇÃO

A cárie dentária e a doença periodontal são problemas de saúde bucal comuns em todo o mundo, acometendo entre 50% e 99% das pessoas na maioria das comunidades1. Diversos fatores contribuem para que os adolescentes, em especial, constituam um dos grupos de risco para a ocorrência destas doenças.

Primeiramente, nesta fase, ocorre um período Primeiramente, nesta fase, ocorre um período denominado de dentição mista e há mudanças não somente em nível dental, mas também na saliva e na gengiva2. Em segundo lugar, com a diminuição da vigilância aos cuidados referentes à higiene bucal dos filhos por parte dos pais, alguns adolescentes realizam sua higiene adequadamente, enquanto outros podem tornar-se resistentes a essa tarefa3-4." Finalmente, as transformações do organismo durante a adolescência, especialmente aquelas relacionadas ao ganho de massa óssea e de peso, aumentam a necessidade energética, o que pode tornar a dieta altamente cariogênica3.

A alimentação e a nutrição desempenham um importante papel na saúde bucal. O alimento relaciona-se com os dentes de modo tópico, pelo seu contato, podendo influenciar a formação e o metabolismo da placa bacteriana de acordo com sua composição química e característica física. Já a nutrição relaciona-se com os dentes de maneira sistêmica, ao agir na sua formação e crescimento, determinando, assim, seu tipo de resposta à ação da placa bacteriana5. A mudança de hábitos alimentares dos brasileiros, que tem levado à substituição dos alimentos ricos em fibras e nutrientes por alimentos industrializados ricos em gorduras e carboidratos, facilita o surgimento de problemas odontológicos, mesmo com a exposição a fatores de proteção amplamente difundidos, como os fluoretos6. Neste contexto, pode-se afirmar que a cárie e a obesidade têm um componente etiológico comum, na medida em que a maior prevalência de cárie poderia estar relacionada à obesidade ou à ingestão de sacarose.

A condição social, por sua vez, tem sido enfatizada nas últimas décadas como um importante determinante das condições de saúde bucal7-10 e diversos estudos têm abordado a relação entre a classe social e a cárie dentária ou doença periodontal11-13. Em estudo conduzido com adultos e idosos atendidos pelo Programa de Saúde da Família de Juiz de Fora (MG) e Cuiabá (MT), Figueiredo et al.14 mostraram que as pessoas com melhor condição socioeconômica possuíam estilo de vida mais saudável em saúde bucal, fazendo frequentemente uso conjunto de escova, creme dental e fio dental. Em geral, a análise das condições socioeconômicas aponta que diferenças pronunciadas de renda, não somente promovem dificuldades de acesso aos serviços odontológicos, mas também colocam os indivíduos em desvantagem quanto à ocorrência de problemas de saúde bucal15-16.

O levantamento de dados a partir de estudos epidemiológicos realizados na Odontologia é fundamental para a avaliação das necessidades dos vários grupos etários, proporcionando uma melhor organização do atendimento, com programações específicas para a promoção da saúde bucal17. No entanto, ainda são poucos os trabalhos encontrados na literatura nacional acerca da saúde bucal de adolescentes. Assim, com este estudo, objetivou-se avaliar a saúde bucal desta faixa etária, relacionando-a ao seu estado nutricional e à sua condição socioeconômica.

 

MÉTODOS

A população foi constituída por adolescentes com idade entre 15 e 19 anos, matriculados no Colégio Agrícola de Camboriú, unidade da Universidade Federal de Santa Catarina, que oferece cursos técnicos de nível médio e pós-médio a alunos provenientes de todas as regiões do estado. A instituição está localizada no município de Camboriú, próximo ao litoral norte de Santa Catarina, a cerca de 82 km de Florianópolis e tem como principais atividades econômicas o comércio, a indústria, a agropecuária, a mineração de granito e mármore e o turismo ecológico e rural.

O Colégio Agrícola de Camboriú, instituição de ensino pública e gratuita, foi criado em 8 de abril de 1953, após ser firmado um acordo entre os governos da União e do Estado de Santa Catarina. Suas atividades pedagógicas tiveram início em 1962, e eram voltadas prioritariamente para o ramo da agropecuária. Atualmente, oferece ainda formação profissional na área de informática e meio ambiente, cursos que tiveram início em 2000. O colégio oferece regime de internato e semi-internato, com benefícios envolvendo alimentação, saúde (psicológica, odontológica e medicina geral) bem como instalações adequadas de lavanderia e asseio corporal para o educando. Os adolescentes que fazem parte do internato alimentam-se de acordo com o cardápio e os horários estabelecidos pela instituição, realizando três refeições diárias (café da manhã, almoço e jantar). No regime de semi-internato, os alunos que ficam durante todo o dia na instituição podem realizar o almoço no local, e contam com alojamentos onde podem realizar sua higiene pessoal.

Durante os dois anos de estudo (2005 e 2006) havia 780 alunos matriculados na instituição, distribuídos em 28 turmas. Em 2005 estavam matriculados 470 alunos, dos quais 310 tinham idade entre 15 e 19 anos, 62 alunos com idade superior a 20 anos e 90 eram menores de 15 anos. Em 2006 foram matriculados 285 alunos: destes havia 110 com idade superior a 20 anos, 69 menores de 15 anos e 50 com idade entre 15 e 19. A população de interesse para este trabalho totalizou 360 adolescentes, na faixa etária de 15 a 19 anos.

Limitou-se a faixa etária em 15 a 19 anos para possibilitar a comparação dos resultados do presente estudo àqueles obtidos a partir do Projeto Saúde Bucal Brasil (Projeto SB Brasil). Esse projeto trata-se de um levantamento epidemiológico de âmbito nacional, que objetivou produzir informações sobre as condições de saúde bucal da população brasileira e subsidiar o planejamento e avaliação de ações nessa área nos diferentes níveis de gestão do Sistema Único de Saúde18.

Os exames odontológicos foram realizados no consultório da instituição, com luz artificial e secagem prévia dos dentes, utilizando-se espelho plano e sonda ball point, especialmente desenvolvida para avaliar o Índice Periodontal Comunitário (CPI)18. Esse tipo de exame bucal foi categorizado por Pereira & Moreira19 como exame clínico tipo II (consultório-método visual/tátil), e mostra-se mais eficiente em relação ao exame clínico tipo I (epidemiológico-método visual/tátil).

A avaliação do índice dos Dentes Cariados, Perdidos e Obturados (CPO-D), no indivíduo ou em uma determinada população estudada17,20, foi realizada utilizando o formulário proposto pela Organização Mundial da Saúde21 para levantamentos epidemiológicos em saúde bucal. Os dados referentes ao uso de flúor, fluorose dentária, anormalidades dento-faciais, oclusão, doença periodontal e alterações no tecido mole não foram investigados nesse estudo18.

Realizou-se a calibração do único profissional (odontólogo) avaliador da saúde bucal, conforme preconizado pela Organização Mundial da Saúde21, visando estabelecer padrões uniformes para o exame e determinar parâmetros aceitáveis. A confiabilidade dos dados foi medida através de percentuais de concordância e coeficiente Kappa, sendo que a calibração intra-examinadora foi satisfatória (Kappa = 0,98).

Para o diagnóstico do estado nutricional, coletaram-se o peso e a estatura e calculou-se o índice de massa corporal. Para a aferição do peso corporal utilizou-se balança eletrônica da marca Kratos-Cas® (Embu, São Paulo, Brasil) (capacidade máxima de 150kg e sensibilidade de 50g), com os adolescentes trajando roupas leves e de pés descalços, de pé sobre a plataforma da balança e no centro da mesma, com o peso do corpo distribuído igualmente em ambos os pés e com os braços ao lado do corpo. Para a verificação da estatura utilizou-se um estadiômetro da marca SECA® (escala de precisão de 0,1cm), com os avaliados descalços e eretos sobre a base do mesmo, com pés unidos e membros superiores pendentes ao lado do corpo, colocando as superfícies posteriores dos calcanhares, as nádegas e a região occipital em contato com a escala de medida. A cabeça foi orientada de modo que a linha de visão ficasse perpendicular ao corpo, ou seja, paralela ao solo. A referência para a mensuração foi o ponto mais alto da cabeça com pressão suficiente para comprimir o cabelo22. Após o cálculo do índice de massa corporal, os adolescentes foram classificados conforme o padrão de referência do National Center for Health Statistics23, segundo percentis de acordo com o sexo e a idade, em conformidade com os pontos de corte recomendados pela Organização Mundial da Saúde22.

Os dados socioeconômicos foram obtidos por meio de um questionário baseado na posse e quantidade de itens como televisores, rádios, aspiradores de pó, máquinas de lavar roupa, automóveis, banheiros no domicílio, presença de empregada mensalista e grau de instrução do responsável pelo domicílio. A totalização dos pontos correspondentes a cada item indicou a classificação dos adolescentes respondentes em cinco estratos: A (rico), B (médio-alto), C (médio-médio), D (médio-baixo) e E (pobre)24.

Após as avaliações, foram entregues os resultados individuais aos adolescentes e realizadas as orientações necessárias. Solicitou-se aos pais a assinatura de um termo de consentimento, em que constavam todas as etapas do estudo. O estudo cumpriu todos os princípios éticos contidos na Declaração de Helsink e atendeu às legislações brasileiras específicas para a realização de estudos com seres humanos, tendo sido aprovado pela Comissão de Ética em Pesquisa da Universidade do Vale do Itajaí, sob o protocolo 469/2004 e pela direção do Colégio Agrícola de Camboriú.

Aplicou-se o teste do qui-quadrado para avaliar a associação entre as variáveis qualitativas. Em função do número amostral, para fins de análises estatísticas, agruparam-se os adolescentes com idades de 18 e 19 anos, os com sobrepeso e obesidade, bem como aqueles das classes sociais A e B, e D e E. Os valores de CPO-D foram testados em relação à sua normalidade, a partir dos valores de assimetria e curtose, sendo considerados não normais (alta assimetria à direita - curtose negativa). Desta forma, optou-se por analisar as possíveis diferenças entre os valores de CPO-D de acordo com a faixa etária por meio da prova não paramétrica de Kruskall-Wallis, e posterior comparação de grupos a partir do teste de Dunn. Adotou-se nível de significância de 5% (p<0,05).

 

RESULTADOS

Dos 360 adolescentes elegíveis para o estudo, 47 optaram por não participar do mesmo alegando motivos particulares, sendo então avaliados 313 indivíduos. A distribuição dos adolescentes avaliados, segundo as variáveis sexo, idade, índice de CPO-D, estado nutricional e classificação socioeconômica, está demonstrada na Tabela 1. Com relação ao sexo e faixa etária, observou-se predominância de adolescentes do sexo masculino e de 15 anos de idade. A maioria dos adolescentes apresentava CPO-D maior que zero (81,2%), era eutrófica (88,5%) e foi classificada socioeconomicamente como C e D (49,2% e 38,0%, respectivamente).

 

 

Os valores médios e a dispersão do CPO-D dos adolescentes por faixa etária são apresentados na Tabela 2. A prova de Kruskall-Wallis mostrou diferença significativa entre as faixas etárias (F=44,65; p<0,001). O teste de Dunn identificou diferença significativa entre todas as faixas etárias, à exceção das faixas de 15 e 16 anos.

 

 

A Tabela 3 mostra as associações entre a classificação do índice de CPO-D e as variáveis sexo, idade, estado nutricional e classificação socioeconômica. Observaram-se maiores prevalências de CPO-D maior que zero entre o sexo masculino, entre os adolescentes mais jovens e entre aqueles de classe socioeconômica C. Não foi encontrada associação significativa entre a classificação do CPO-D e o estado nutricional.

 

 

DISCUSSÃO

Entre os adolescentes avaliados, observou-se média de CPO-D igual a 6,5. Este resultado corrobora com aqueles encontrados pelo Projeto SB Brasil 2003 - Condições de Saúde Bucal na População Brasileira 2002-2003, que verificou, para a faixa etária de 15 a 19 anos, médias de CPO-D iguais a 6,17 e 5,77, respectivamente, para o Brasil e para a região Sul18. Segundo este mesmo levantamento epidemiológico de âmbito nacional, apenas 11,06% dos adolescentes brasileiros entre 15 e 19 anos apresentam CPO igual a zero, sendo os maiores percentuais nas regiões Sul e Sudeste (12,08% e 12,75%, respectivamente). Nesta pesquisa, 18,8% dos adolescentes apresentaram CPO-D igual a zero, percentual um pouco maior que aqueles relatados para o Brasil e para a região Sul.

Encontrou-se neste trabalho um aumento significativo da média do índice de CPO-D com a idade. Resultado semelhante foi apresentado pelo Projeto SB Brasil, no qual foi observada tendência de crescimento na prevalência da cárie em função da idade. Este fenômeno foi destacado no relatório divulgado pelo Ministério da Saúde como comum, tendo em vista que o CPO-D possui caráter cumulativo18.

No presente estudo, os adolescentes do sexo masculino apresentaram maior prevalência de CPO-D superior a zero. Pesquisas avaliando a saúde bucal de adolescentes são poucas, e em sua maioria não estratificam os níveis de CPO-D segundo sexo. Assim, torna-se difícil a comparação de resultados. Os achados deste estudo poderiam, quem sabe, refletir um maior cuidado de higiene oral e de prevenção desempenhado pelas adolescentes do sexo feminino. Contudo, mais variáveis precisariam ser avaliadas antes de se estabelecer uma possível relação entre o sexo e a saúde bucal. Sugere-se então, para próximos estudos, a inclusão de variáveis tais como o acesso aos serviços odontológicos e sua frequencia, além de conhecimentos no que diz respeito aos cuidados preventivos em saúde bucal, com análises estatísticas estratificadas pelo sexo.

Traebert et al.25 destacaram em seu trabalho que a cárie dentária apresenta etiologia multifatorial, dentre os quais encontram-se os dietéticos, especialmente a ingestão de sacarose. Desta forma, os autores afirmaram que a obesidade e a cárie dentária tendem a aumentar conjuntamente, principalmente devido ao aumento no consumo de açúcar estar relacionado a ambas as situações. Contudo, ainda há poucos estudos relacionando o impacto do estado nutricional sobre as condições de saúde bucal de indivíduos. Kantovitz et al.26 realizaram uma revisão bibliográfica de 1984-2004, selecionando publicações que tinham como temas centrais a cárie dentária e a obesidade. Encontraram somente três estudos com estas características, sendo que destes, apenas um mostrou a associação direta entre a obesidade e a cárie dentária.

Na população avaliada, não foi encontrada associação entre a saúde bucal e o estado nutricional, talvez pela predominância de eutrofia entre os adolescentes. Por outro lado, pode-se ainda hipotetizar que os maus hábitos alimentares, incluindo o consumo de sacarose, não ofereçam aporte energético suficiente para promover mudanças significativas no estado nutricional, mas que, aliados à falta de higiene adequada ou de cuidados de prevenção, interfiram nas condições de saúde bucal. Sugere-se para próximos estudos a avaliação do consumo alimentar de adolescentes, quantificando o consumo de açúcares simples e sua relação com a cárie. Neste trabalho, optou-se por utilizar somente o estado nutricional dos adolescentes, partindo do princípio que a obesidade, em geral, reflete tanto o consumo excessivo de gordura quanto de açúcares simples. Embora muitos alunos residam no colégio em regime de internato ou semi-internato, os mesmos têm acesso a uma lanchonete anexa à instituição, onde podem adquirir diversos gêneros alimentícios tais como biscoitos, chocolates, refrigerantes e balas. Além disso, apesar de as refeições oferecidas no colégio serem nutricionalmente balanceadas, nem todos os alunos realizam as refeições no local, e muitos alunos no regime de semi-internato, por exemplo, saem da instituição no horário de almoço para fazer sua refeição em casa, com familiares.

Jones & Worthington11 e Marcenes & Bonecker12 apontaram que a prevalência de cárie diminui à medida que melhora a condição socioeconômica, mesmo em áreas sem a adição de flúor à água de abastecimento público. Nesta pesquisa foi possível observar associação entre a saúde bucal e as condições socioeconômicas, sendo que os adolescentes pertencentes às classes sociais D e E apresentaram valores significativamente mais elevados de CPO-D quando comparados aos de outras classes sociais.

Moreira27, em estudo com adolescentes de 12 a 15 anos, encontrou maiores índices de CPO-D em estudantes de escola pública quando comparados aos de escola privada, demonstrando a polarização da doença e as condições socioeconômicas como determinantes do processo saúde-doença. Colares et al.28, por sua vez, ao avaliarem a saúde bucal de adolescentes em Recife (PE), concluíram que os estudantes de escolas particulares, com melhor condição socioeconômica, possuem uma visão mais preventiva da Odontologia, enquanto os alunos das escolas públicas, com uma condição socioeconômica menos favorável, apresentam uma visão mais curativa.

Além disso, Costa et al.29 destacaram que a população brasileira não tem cobertura em todas as classes socioeconômicas e culturais no que diz respeito à promoção e prevenção à cárie dentária. Eles citam, como exemplos, as áreas onde a água é sem flúor ou a população está excluída do acesso a programas preventivos, fazendo assim com que a melhoria nas condições de saúde e qualidade de vida não ocorra de forma homogênea.

Desta forma, no atual estudo, os maiores índices de CPO-D observados nos adolescentes de condição socioeconômica menos favorável poderiam estar relacionados tanto à dificuldade de acesso ao tratamento odontológico quanto à visão dos adolescentes sobre a Odontologia (neste caso, acreditando esta ter uma abordagem curativa). Em adição, a ausência de sintomas, muitas vezes observada ao início da instalação dos problemas bucais por adiar a busca pelo profissional e pelo tratamento odontológico, poderia estar implicada neste resultado.

Cabe destacar, ainda, que no Brasil somente 46% dos municípios apresentam fluoretação no abastecimento público de água. No entanto, na Região Sul este percentual sobe para 88% dos municípios18. Desta forma, apesar de este dado não ter sido por nós avaliado, é pouco provável que a presença de flúor na água dos municípios de origem dos adolescentes tenha influenciado estes resultados.

 

CONCLUSÃO

Os resultados desta pesquisa apontam a associação do sexo, da idade e da condição socioeconômica dos adolescentes, mas não de seu estado nutricional, com sua saúde bucal.

Além de proporcionarem um diagnóstico da saúde bucal da população estudada, estes resultados permitiram a implementação de atividades educacionais em higiene bucal para os adolescentes. Apesar de não ter se estabelecido uma associação entre a saúde bucal e o estado nutricional dos adolescentes, foram realizadas na instituição palestras visando ao estímulo à adoção de hábitos alimentares saudáveis.

Colaboradores

LP GRILLO coordenou o projeto, participou da interpretação dos resultados, da redação e da revisão do artigo. MGA CRISPIM e AB MARIATH coletaram dados, participaram da interpretação dos resultados, da redação e da revisão do artigo. ENS PRÓSPERO participou da análise estatística, da interpretação dos resultados e da revisão do artigo.

 

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Recebido em: 10/7/2008
Versão final reapresentada em: 15/4/2009
Aprovado em: 18/11/2009

 

 

1 Correspondência para / Correspondence to: LP GRILLO. E-mail: <grillo@univali.br>.