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RGO.Revista Gaúcha de Odontologia (Online)

versão On-line ISSN 1981-8637

RGO, Rev. gaúch. odontol. (Online) vol.59 no.1 Porto Alegre Jan./Mar. 2011

 

ORIGINAL ORIGINAL

 

Prevalência de maloclusões em escolares de baixo nível socioeconômico

 

Prevalence of malocclusion in schoolchildren with low socioeconomic status

 

 

Denise Maciel CarvalhoI,*; José Bento AlvesII; Maria Helena AlvesII

ISecretaria de Estado de Saúde de Minas Gerais, Gerência Regional de Saúde de Uberaba. Rod. Pref. Américo Gianetti, s/n., Ed. Minas, Serra Verde, Uberaba, MG, Brasil
IIUniversidade de Uberaba, Faculdade de Odontologia. Uberaba, MG, Brasil

 

 


RESUMO

OBJETIVO: Caracterizar a prevalência de maloclusões em escolares de 5 a 7 anos, com baixo nível socioeconômico e contribuir para o planejamento de ações de intervenção em Uberaba, Minas Gerais.
MÉTODOS: Foram selecionadas, aleatoriamente, três escolas públicas para participarem do estudo localizadas nos três distritos sanitários da cidade. As crianças foram examinadas em ambiente escolar por examinadora e auxiliares treinadas. Foi examinado o universo de crianças, cujos responsáveis consentiram a participação no estudo. O instrumento de coleta de dados utilizou itens que constam nas classificações de Fisk e Moyers e outros auxiliares no diagnóstico das maloclusões. Para verificar a relação entre as variáveis foi realizado o teste qui-quadrado. Os dados foram analisados no programa estatístico SPSS 14.0 e o nível de significância adotado foi
α<0,05.
RESULTADOS: Apresentaram algum tipo de maloclusão 87,7% das crianças, sendo que 55,8% de pele branca ou parda e oclusão tipo I (
χ2 = 39,210 p<0,0001). Apresentaram fala normal 88,6%, porém as crianças com 6 anos apresentaram um índice elevado de anormalidade na fala (49,2%), quando comparadas às demais (χ2 = 18,455 p<0,05). A prevalência de mordida cruzada foi igual a 12,6%.
CONCLUSÃO: A prevalência das maloclusões apresentou-se alta em escolares de 5 a 7 anos de baixo nível socioeconômico em Uberaba, Minas Gerais. Há necessidade de elaboração de propostas de orientação para as crianças e seus familiares, envolvendo o sistema de saúde pública municipal para a adoção de estratégias preventivas.

Termos de indexação: Criança. Estudantes. Má oclusão. Prevalência.


ABSTRACT

OBJECTIVE: To characterize the prevalence of malocclusion in children 5 to 7 years, with low socioeconomic status, and contribute to the planning of interventions in Uberaba, Minas Gerais, Brazil.
METHODS: We randomly selected three schools to participate in the study, located in three health districts. Children were examined in the school environment by trained examiners and assistants. We examined the population of children whose parents consented for their children to participate in the study. The instrument used for data items contained in the classifications of Fisk and Moyers and other aid in the diagnosis of malocclusion. The relationship between malocclusion and collected variables was determined using chi-square test. The data were analyzed with SPSS 14.0 and the level of significance was set at
α < 0.05.
RESULTS: 87.7% of children had some type of malocclusion, and 55.8% had white skin or brown and occlusion type I (
χ2 = 39.210 p<0.0001). 88.6% had normal speech, and children under 6 years showed a high rate of abnormality in speech (49.2%) compared with other children (χ2 = 18.455 p<0.05). The prevalence of crossbite was 12.6%.
CONCLUSION: The prevalence of malocclusion was high in children 5 to 7 years with low socioeconomic status in Uberaba, MG. It is important to develop guidelines for children and their families and to involve the public health system to implement preventive strategies.

Indexing terms: Child. Students. Malocclusion. Prevalence.


 

 

INTRODUÇÃO

A avaliação da oclusão, considerando aspectos de saúde pública, tem dois objetivos principais: primeiro, avaliar a necessidade e prioridade de tratamento; segundo, obter informações para planejar adequadamente os recursos necessários para o fornecimento de tratamento ortodôntico para a população1. Assim, a maloclusão é um problema de saúde pública que afeta diferentes faixas etárias e tem merecido, mundialmente, estudos epidemiológicos procurando analisar sua prevalência e distribuição nas diversas populações. O diagnóstico precoce das oclusopatias possibilita intervenções com medidas simples, de baixo custo e, portanto, viáveis quanto à sua execução no serviço público2-4.

Em uma análise histórica, Bast et al.5 e Graber6, afirmaram, respectivamente, em seus estudos, que apenas 4,8% das pessoas poderiam ser consideradas portadoras de oclusão normal e que as maloclusões são endêmicas e largamente espalhadas entre todos os povos do mundo, ocupando o terceiro lugar em ordem de importância dos problemas de saúde bucal, segundo a Organização Mundial de Saúde7.

Segundo Balters8, os contatos prematuros são bloqueios para o correto desenvolvimento da criança e seu diagnóstico e remoção precoces, bem como o tratamento das maloclusões, devem ser padronizados. Marques et al.9 determinaram a prevalência da maloclusão e verificaram a associação entre necessidade de tratamento ortodôntico e determinados aspectos psicossociais. A prevalência de maloclusão foi de 62,0% em adolescentes de 10 a 14 anos e a necessidade normativa de tratamento ortodôntico de 52,2%. Os resultados sugeriram que fatores psicossociais devem ser incorporados aos critérios clínicos ao se considerar a decisão para o tratamento ortodôntico.

Leite-Cavalcanti et al.10 observaram que a prevalência de hábitos de sucção foi elevada entre crianças de 3 a 5 anos de idade, variando de 70,0% a 77,4%, enquanto as maloclusões estavam presentes em 87,0%. Nesse estudo aproximadamente 84,2% das crianças tinham história de alimentação artificial e 79,9% apresentavam maloclusão no momento do exame.

Tendo em vista a importância das maloclusões enquanto problema de saúde pública e a relevância do diagnóstico, monitoramento e avaliação das ações de saúde, em especial da saúde bucal, realizou-se este estudo, que teve por finalidade caracterizar sua prevalência em crianças de 5 a 7 anos de idade, com baixo nível socioeconômico, e possibilitar o planejamento de ações de promoção, prevenção, recuperação e reabilitação pertinentes às anormalidades da oclusão na referida população em Uberaba, Minas Gerais.

 

MÉTODOS

Foram selecionadas, aleatoriamente, três escolas públicas para participarem do estudo, localizadas distintamente nos três distritos sanitários de Uberaba, com base no seguinte critério de inclusão: presença de pelo menos 200 crianças entre 5 e 7 anos de idade matriculadas em cada escola, com predomínio daquelas com baixo nível socioeconômico, segundo referência da direção das escolas.

Uberaba apresenta três distritos sanitários, segundo a Secretaria Municipal de Saúde, desde 1992; distrito 1 (Sudeste), distrito 2 (Oeste) e distrito 3 (Nordeste). Previamente à etapa de coleta de dados, solicitou-se à Secretaria Municipal de Saúde de Uberaba a base de dados relativa à localização geográfica dos distritos sanitários, que foi utilizada como indicador para a equivalente localização das escolas.

O estudo obteve a anuência do Comitê de Ética em Pesquisas com Seres Humanos da Universidade de Uberaba, sob o parecer 032/06 e foi financiado por bolsa do Programa de Apoio a Pesquisa da Universidade de Uberaba. O trabalho da auxiliar de pesquisa foi custeado por uma bolsa PIBIC Júnior (FAPEMIG).

As crianças foram examinadas após o consentimento formal obtido pela assinatura de dois Termos de Consentimento Livres e Esclarecidos, sendo um para o diretor da escola e outro para o responsável direto pela criança. Foi examinado o universo de crianças da faixa etária, cujos responsáveis consentiram com o exame. Não foi realizado, portanto, sorteio das crianças participantes. As crianças foram examinadas por uma equipe composta por uma acadêmica e uma auxiliar de pesquisa, em ambiente escolar. A examinadora utilizou máscaras, luvas e afastadores de tecido mole descartáveis para cada criança, respeitando as orientações de Biossegurança ditadas pela Organização Mundial de Saúde (OMS) para estudos epidemiológicos11. A observação foi realizada com as crianças sentadas e a examinadora em pé. Foi escolhido um local bem iluminado, com luz natural, ventilado e próximo à fonte de água. A auxiliar trabalhou sentada e foi responsável pelo preenchimento do instrumento de coleta de dados, bem como por organizar o material e conduzir as crianças ao local do exame.

Previamente ao início dos exames, foi realizado um treinamento teórico-prático da dupla examinadora-auxiliar, sendo 8 horas para o treinamento teórico e o prático de 16 horas, em 4 dias, sendo realizado em outra escola pública, não participante do estudo. Foram examinadas cerca de 20 crianças de cada idade, correspondendo a um total de 58 crianças de 5 a 7 anos. Assim, foi realizada a calibração intra-examinadora, que repetiu os exames duas vezes, nas mesmas crianças, em dias alternados, obtendo-se um nível aceitável de concordância (Kappa > 0,85)11.

O instrumento de coleta de dados foi composto pelos itens: dados pessoais, exame extraoral e exame intraoral, sendo que, antes dos exames físicos, foi realizada entrevista com a criança para o preenchimento dos dados pessoais. Nesse momento eram realizadas as observações relativas à fala. Posteriormente, eram realizados os exames físicos extraoral e intraoral.

O instrumento foi composto por itens que constam na classificação de Fisk12 e na classificação de Moyers13 para dentição decídua, além de itens de fácil identificação, auxiliares no diagnóstico de más oclusões: simetria facial; perfil facial; postura labial, sendo observado nesse item o selamento dos lábios; posição dos lábios superior e inferior, se normal, protuído ou retruído; padrão de deglutição, avaliado pela posição da língua após solicitação para a criança engolir; respiração, se normal ou bucal, sendo avaliada durante o exame físico, através da observação de uma ou mais alterações: mordida aberta, cruzada, topo-a-topo e overjet (protusão dentária), bem como da postura da criança em pé (se apresentava um ou mais dos seguintes sinais: cabeça anteriorizada, abdome e/ou ombros protuídos); fala, sendo avaliada a presença de dislalia durante a entrevista realizada para preenchimento dos dados pessoais do instrumento de coleta de dados; e, por fim, a presença de hábitos deletérios (morder os lábios, roer unhas, chupar chupetas e/ou dedos, ou outro citado durante a entrevista).

Os dados foram digitados em planilha do programa SPSS 14.0, e analisados de acordo com os objetivos deste estudo. As variáveis quantitativas foram submetidas ao teste de normalidade de Kolmorgokov-Smirnov. Para verificar a relação entre os parâmetros requeridos foi utilizado o teste de qui-quadrado. O nível de significância para todos os testes foi < 0,05.

 

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Foram examinadas 570 crianças, de 5 a 8 anos de idade, uma vez que foram incluídas algumas crianças que já haviam completado 8 anos pois estavam nas salas das crianças com 7 anos. A taxa de resposta foi igual a 91,5%. A média e mediana de idade foram, respectivamente, 6,5 e 7,0, com desvio-padrão igual a 0,863.

Das 570 crianças, 296 (51,9%) eram do sexo masculino e 274 (48,1%) do sexo feminino. Considerando a idade, 84 crianças (14,7%) tinham cinco anos, 200 (35,1%) seis anos, 228 (40,0%) sete anos e 57 (10,0%) oito anos. Em relação à cor da pele, observou-se que 441 crianças (77,4%) eram brancas e pardas, 41 (7,2%) negras, 86 (15,1%) mulatas, e uma criança (0,2%) era asiática.

De acordo com a simetria facial, 562 crianças (98,6%) apresentaram face simétrica em relação a 8 (1,4%) consideradas assimétricas. Levando em conta o perfil facial pesquisado nas crianças, o perfil reto, com 384 crianças (67,4%) superou o côncavo, com 51 crianças (8,9%) e o convexo, com 135 crianças (23,6%). A prevalência de postura labial normal foi de 509 (89,3%), superando a falta de selamento 61 (10,7%).

A posição labial superior apresentou-se normal na maioria das crianças examinadas (472 = 82,8%), comparada com as posições protuída (86 = 15,0%) e retruída (12 = 2,1%). A posição labial inferior também se apresentou normal na maioria das crianças pesquisadas (383 = 67,3%), sendo que 173 (30,3%) apresentavam posição inferior protuída e 13 (2,3%) retruída. Apenas uma criança apresentou deglutição atípica.

Constatou-se que 559 (98,0%) crianças apresentaram respiração normal e 11 (1,9%) bucal. A maioria das crianças (505 = 88,6%) apresentou fala normal, em contraposição a 63 crianças (11,1%) com fala considerada anormal no momento do exame. Considerando os hábitos atuais, 19 crianças (3,3%) mordem os lábios, 13 (2,3%) chupam os dedos, 1 (0,2%) usa chupeta, 81 (14,2%) roem unha enquanto 431 (75,6%) não apresentaram nenhum dos hábitos em estudo. Mas vários autores afirmam que a sucção de chupeta é o hábito mais comum entre as crianças de baixa idade, sendo que a frequência do uso da chupeta varia de 34,1% a 65,4%14-19. O presente estudo não avaliou o hábito pregresso de sucção de chupeta, fato que não pode ser levado em consideração para explicar as maloclusões encontradas. Não foram mencionados pelas crianças outros hábitos que não os investigados no presente estudo.

Com relação ao trespasse vertical, observou-se que foi considerado normal em 251 crianças (44,0%), excessivo em 92 (16,1%), borda a borda em 132 (23,1%) e negativo em 91 (16,0%). Os resultados indicam que 297 (52,1%) crianças apresentaram trespasse horizontal normal, 122 (21,4%) excessivo, 137 (24,0%) borda a borda e 14 (2,5%) negativo. Setenta e duas (12,6%) crianças apresentaram mordida cruzada, enquanto a linha média da maxila foi coincidente em 482 (84,6%) crianças, havendo desvio para a esquerda em 34 (5,9%) e para a direita em 54 (9,5%). Encontrou-se maior número de linhas médias mandibulares coincidentes (298 = 52,3%), sendo 132 (23,1%) de desvio para a esquerda e 140 (24,5%) para a direita. Considerando o fechamento, o percentual de linhas médias coincidentes (555 = 97,4%) foi elevado em relação ao de desvio para a esquerda (11 = 1,9%) e para a direita (4 = 0,7%).

Os resultados indicaram que 469 (82,3%) crianças apresentaram dentição mista e 101 (17,7 %) dentição decídua. Considerando as 101 crianças com dentição decídua, observou-se que 64 (63,4%) apresentaram degrau terminal decíduo reto, 9 (8,9%) degrau mesial e 28 (27,7%) degrau distal. As oclusões apresentadas pelas crianças foram distribuídas entre os itens: normal, classe I, classe II e classe III, sendo: 70 (12,3%) normal, 314 (55,1%) classe I, 78 (13,7%) classe II e 107 (18,8%) classe III, de acordo com a classificação de Angle.

Observou-se, neste estudo, que 500 crianças (87,7%) apresentaram algum tipo de maloclusão, resultado semelhante ao encontrado por Leite-Cavalcanti et al.10, que examinaram 342 crianças de 3 a 5 anos (87%). Outros estudos epidemiológicos transversais registraram resultados semelhantes aos encontrados neste trabalho17,20-22. Entretanto, nos estudos de Sousa et al.18, Tomita et al.23 e Frazão et al.24 as maloclusões foram encontradas em, respectivamente, 53,9%, 45,0% e 48,97% da população.

A oclusão tipo I foi a mais prevalente em todas as idades, com destaque para as crianças de cinco anos de idade. Nenhuma criança de oito anos de idade apresentou oclusão considerada normal (Tabela 1). Segundo Marchionni et al.25, grande número de casos de maloclusão tem sua origem durante o período de dentição mista. Nesta fase, não há previsão de crescimento ósseo na região mesial aos primeiros molares permanentes, ficando estabelecido o espaço que acomodará os dentes remanescentes que ainda vão irromper.

 

 

Frazão et al.24 mencionam que vários estudos vêm rejeitando a suposição de que características externas visíveis como a cor da pele expressam uma medida consistente representativa de outras características de um indivíduo ou população, admitindo que a maior parte das variações oclusais seja resultado da interação de fatores ambientais e genéticos em cada grupo populacional do que entre os diferentes grupos populacionais. Estes autores não encontraram diferenças entre os tipos de oclusão nos grupos étnicos branco e pardo, como no presente estudo. Ao agrupar estas duas categorias e analisá-las com os outros grupos étnicos, observou-se que a maior parte das crianças examinadas tinha cor da pele branca e parda e oclusão tipo I, com destaque para as crianças de cor negra, que apresentaram a maior prevalência de oclusão classe I que as demais crianças (Tabela 2).

 

 

A Tabela 3 demonstra a prevalência de maloclusões segundo sexo, com os meninos apresentando maior proporção de oclusão normal, classe II e III que as meninas, que apresentaram maior proporção de oclusão classe I que os meninos, no presente estudo, indicando haver diferença significante entre os sexos na prevalência de maloclusão, sendo mais encontradas nos meninos que nas meninas. Entretanto, outros estudos na literatura não evidenciaram haver diferenças entre os sexos9,24.

 

 

Em relação à fala constatou-se que as crianças com seis anos apresentaram um índice elevado de anormalidade quando comparadas às demais e as crianças com oito anos apresentaram menor proporção de anormalidades. A maioria das crianças examinadas apresentou fala normal (Tabela 4).

 

 

Quando comparados anormalidades da fala e sexo, observou-se que os meninos apresentaram mais anormalidades que as meninas (Tabela 5). Foram investigadas ainda as seguintes relações que não apresentaram significância estatística: idade e hábitos (χ2 = 13,854 p=0,537); oclusões e hábitos (χ2 = 34,469 p=0,098); oclusões e fala (χ2 = 16,200 p=0,369).

 

 

As anomalias de oclusão encontradas predominantemente na idade de seis anos indicam que esse resultado pode estar relacionado ao fato de se iniciar, nesse período, a transição entre as dentições (decídua para permanente), podendo-se dizer o mesmo das anormalidades da fala, que foram encontradas principalmente nessa idade, uma vez que resquícios de fala primitiva podem estar presentes nas idades mais precoces do estudo.

Outros estudos, como os realizados por Trottman & Elsbach26, destacaram a importância de se detectar precocemente os casos de maloclusão com mordida cruzada, de modo a eliminar as interferências que podem causar desvios nos processos normais de crescimento e desenvolvimento facial e dos arcos dentários porque, na opinião desses autores, a mordida cruzada posterior não se autocorrige. Portanto, se estiver presente na dentadura decídua e não for tratada, implicará em continuidade na dentadura permanente, como também apontam Silva Filho et al.22 podendo levar à assimetria craniofacial. Com relação ao tratamento, geralmente, quanto mais precocemente é implantado, maiores as possibilidades de resultados estáveis. Tratamentos tardios contam com menor capacidade de adaptação e mais limitações27.

O conhecimento sobre a etiologia da maloclusão é essencial, porque a sua correção requer a eliminação das causas, para que assim se possam categorizar os fatores etiológicos em uma ordem que facilite o diagnóstico e o tratamento. Considerando a etiologia das maloclusões, os hábitos orais foram mencionados em vários estudos como um agente em potencial para o seu desenvolvimento28-29.

Na área da saúde, que inclui a saúde bucal, atitudes preventivas devem estar presentes em todas as atividades. No caso das maloclusões, sabe-se que pequenas intervenções podem minimizar o desenvolvimento de problemas que, no decorrer do tempo, podem se transformar em grandes desvios, acarretando graves conseqüências para a vida de seus portadores.

A obtenção da normalidade da oclusão bucal e sua preservação devem ocorrer através da implantação de medidas preventivas básicas, como programas de educação para a saúde, com a inclusão de orientações para eliminação de hábitos e posturas incorretas, por exemplo. A abordagem dos programas deve ser multiprofissional, com a equipe de saúde bucal atuando em conjunto com outros profissionais da saúde.

O conhecimento da situação de saúde bucal de grupos populacionais por meio de inquéritos epidemiológicos é fundamental para o desenvolvimento de propostas de ações adequadas às suas necessidades e riscos, bem como para a possibilidade de comparações que, a posteriori, permitam avaliar o impacto dessas ações. Conhecendo a situação epidemiológica, é possível planejar e executar com eqüidade os serviços.

Durante os últimos anos, observando-se os inquéritos epidemiológicos realizados, tem-se identificado uma demanda crescente por tratamento ortodôntico, que pode ser consequência do declínio da cárie dentária, de uma maior consciência e expectativa com relação à saúde bucal ou de uma maior disponibilidade de tratamento odontológico. Acredita-se, entretanto, que a prevalência e a severidade das maloclusões têm aumentado, basicamente, pela reduzida função e eficiência mastigatória que possibilitam um crescimento ósseo adequado, fruto dos hábitos e estilos de vida modernos.

O município de Uberaba apresenta, como outras localidades brasileiras, perfil epidemiológico semelhante ao panorama citado, com a doença cárie controlada, apresentando condições de incluir as maloclusões nas ações de promoção de saúde e prevenção na rotina das equipes de saúde bucal. Pelo exposto, pode-se dizer que as maloclusões são um problema de saúde pública entre escolares de baixo nível socioeconômico em Uberaba, Minas Gerais, devendo este assunto receber mais atenção de todas as autoridades envolvidas.

 

CONCLUSÃO

Observou-se que neste estudo realizado em Uberaba, Minas Gerais, as maloclusões foram encontradas em 87,7% da população estudada, sendo que aproximadamente 13,0% das crianças examinadas apresentaram mordida cruzada. Apesar de encontrado predomínio de situações de normalidade nos demais itens, a alta prevalência de maloclusões, principalmente tipo I, vem corroborar a importância desse problema para esta faixa etária. Provavelmente as maloclusões desempenham importante papel nas alterações de postura e posição labial, bem como de fala, deglutição, trespasse e linha média verificadas no presente estudo.

Considerando os resultados apresentados, percebe-se a necessidade da elaboração de propostas de orientação e instrução para as crianças e seus familiares, envolvendo ativamente o sistema de saúde pública municipal que adota a estratégia saúde da família na atenção à saúde da população.

Agradecimentos

Às crianças participantes e suas famílias, pelo consentimento dos exames bucais; aos diretores das escolas participantes, pela receptividade e reconhecimento da importância do trabalho; à Gisele Ariane Alves Silva, bolsista PIBIC Júnior (FAPEMIG) pela valiosa colaboração, atuando como auxiliar de pesquisa. À Professora Dra. Fernanda Oliveira Magalhães pela ativa colaboração nas análises estatísticas do estudo.

Colaboradores

Todos os autores participaram ativamente de todas as etapas de elaboração deste artigo.

 

REFERÊNCIAS

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Recebido em: 13/11/2008
Versão final reapresentada em: 26/3/2009
Aprovado em: 18/5/2009

 

 

* Correspondência para / Correspondence to: DM CARVALHO. E-mail: <denise.carvalho@saude.mg.gov.br>.