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RGO.Revista Gaúcha de Odontologia (Online)

versão On-line ISSN 1981-8637

RGO, Rev. gaúch. odontol. (Online) vol.59 no.2 Porto Alegre Abr./Jun. 2011

 

ARTIGO ORIGINAL / ORIGINAL ARTICLE

 

Percepções e condutas de médicos pediatras com relação à promoção de saúde bucal

 

Pediatricians' perceptions and procedures regarding promotion of oral health

 

 

Osmar Pereira NUNES I; Eloísa Helena CORRÊA BRUSCO I; Larissa Corrêa BRUSCO I; Berenice PERUSSOLO I; Eduardo Grigollo PATUSSI I

I Universidade de Passo Fundo, Faculdade de Odontologia, Departamento de Odontopediatria.

Endereço para correspondência

 

 


 

RESUMO

Objetivo
Avaliar as percepções e condutas de médicos pediatras da cidade de Passo Fundo, Rio Grande do Sul, em relação à saúde bucal.

Métodos
Enviou-se um questionário com perguntas abertas e fechadas para todos os pediatras (n=45) da cidade, desses 24 (53,3%) retornaram o questionário.

Resultados
A média de idade dos participantes foi de 44,5 anos, sendo 58,3% do sexo feminino. Todos relataram que orientam as mães sobre saúde bucal, 54,2% recomenda que a primeira consulta ao odontopediatra seja realizada antes do primeiro ano de vida, 20,8% após um ano de idade e 25,0% após os dois anos. A higiene da boca do bebê deve ser feita com gaze umedecida segundo a maioria dos pediatras. Ainda, 33,3% orientam que a higiene bucal do bebê deve ser iniciada após os seis meses de idade. Quanto aos alimentos cariogênicos, 62,5% recomendam não oferecer à criança, 16,7% como sobremesa, porém 16,7% orientam que sejam fornecidos à vontade. Quanto ao uso da mamadeira, a maioria dos médicos (70,8%) não a recomenda, 20,8% recomenda e 8,3% depende da situação. O uso da chupeta foi contraindicado por 91,6% dos pediatras. Em relação ao uso de fluoreto sistêmico, 83,3% não costuma prescrevê-lo. Quanto ao dentifrício fluoretado, 16,6% o indica antes de um ano de idade, 33,3% a partir dos 2 anos, 33,3% após os 3 anos de idade, e 16,7% relatam desconhecer a época ideal.

Conclusão
Observou-se que a maioria dos pediatras questionados possui conhecimento sobre promoção de saúde bucal, porém, alguns conceitos e condutas necessitam ser reavaliados.

Termos de indexação: Higiene bucal. Odontopediatria. Saúde bucal.


 

ABSTRACT

Objective
This study assessed pediatricians' perceptions and procedures in the city of Passo Fundo, Rio Grande do Sul, Brazil, regarding oral health.

Methods
A questionnaire was sent to all pediatricians in the city (n = 45) and 24 (53.3%) answered the questionnaire.

Results
Most participants (58.3%) were females and the mean age of the sample was 44.5 years. All of them reported informing mothers about oral health and 54.2% recommend that a pediatric dentist should be seen before the first year of life, 20.8% between the first and second years of life and 25% after the second year of life. Most pediatricians believe that the baby's mouth should be cleaned with moisturized gauze. One-third (33.3%) of the pediatricians advise the mothers to start oral hygiene at six months of age. Most pediatricians (62.5%) recommend against cariogenic foods, 16.7% recommend they should only be consumed as dessert and 16.7% believe they can be consumed freely. Most pediatricians (70.8%) were against the use of bottles, 20.8% recommended them and 8.3% said that their position depended on the situation. Nearly all pediatricians (91.6%) recommended against the use of pacifiers. Systemic fluoride is not usually prescribed by 83.3% of the pediatricians. Some (16.6%) of the doctors recommend fluorinated toothpaste before the first year of age, 33.3% recommend after the second year of age, 33.3% recommend after the third year of age and 16.7% do not know the best time to start its use.

Conclusion
Most interviewed pediatricians know how to promote oral health; however, some concepts and conducts need to be reassessed.

Indexing terms: Oral hygiene. Pediatric dentistry. Oral health.


 

 

INTRODUÇÃO

A atenção à saúde bucal nos primeiros anos de vida é de fundamental importância, podendo significar a diferença entre manter uma condição favorável, ou a necessidade de um tratamento invasivo, o qual muitas vezes pode levar a perda prematura de elementos dentários1-5. Desta forma, torna-se importante uma abordagem multidisciplinar em pediatria, objetivando a atenção precoce para oferecer melhores condições de saúde à criança1-10. Nesse sentido, dentre os profissionais que têm um contato mais frequente com a criança na faixa etária de 0 a 3 anos de idade, o médico pediatra desempenha um importante papel na prevenção, uma vez que tem a oportunidade de entrar em contato com os pais logo após o nascimento do bebê11-15.

Segundo Galbiatti et al.16, a odontologia para bebês está fundamentada na educação e na prevenção, sendo a conscientização dos pais a chave principal para educar e motivar, devendo ela ser realizada através de orientações sobre a importância da boca, da dentadura decídua, da amamentação natural, do conceito de cárie dentária como doença e da existência de medidas preventivas eficazes.

Entretanto, embora exista uma tendência mundial em relação à atenção precoce em odontopediatria17-21, no Brasil encontra-se um grande desequilíbrio quando se compara o acesso ao odontopediatra com ao do pediatra, tanto na saúde pública como na particular, pois os pais levam seus bebês ao médico no primeiro ano de vida, como rotina, não acontecendo o mesmo em relação ao odontopediatra22.

Com isso, justifica-se a preocupação em se verificar os cuidados que o médico tem em relação à orientação de saúde bucal de seus pacientes, principalmente, para que a criança adquira hábitos saudáveis desde bebê, alcançando a fase de dentadura permanente com dentes hígidos e adequado desenvolvimento do complexo craniofacial.

Diante do exposto, o artigo visa avaliar as percepções e condutas de médicos pediatras da cidade de Passo Fundo, Rio Grande do Sul, em relação à saúde bucal.

 

MÉTODOS

O presente estudo é definido como transversal. A população do estudo foi composta por todos os médicos pediatras atuantes na cidade de Passo Fundo (RS). Para a obtenção dos nomes e endereços dos médicos pediatras de Passo Fundo, foi contatado o Conselho Regional de Medicina do Estado do Rio Grande do Sul (CREMERS) e a Unimed Planalto Médio. Os critérios de exclusão adotados envolveram o profissional aposentado, ou não assinar o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. Inicialmente, constavam na lista de médicos, em Passo Fundo, cinquenta pediatras. Destes, dois estavam aposentados, dois não residiam mais em Passo Fundo, um faleceu durante a pesquisa e 21 não aceitaram responder ao questionário. Dessa forma a população do presente estudo foi composta por 24 médicos pediatras. Foram tomados todos os cuidados necessários com os dados dos participantes do estudo. O projeto de pesquisa foi previamente submetido ao Comitê de Ética e Pesquisa da Universidade de Passo Fundo e aprovado sob o parecer 308/2007.

A coleta de dados foi feita pelo próprio pesquisador, utilizando-se de um questionário com questões abertas e fechadas relativas à promoção de saúde bucal, tais como: uso de fluoreto, consumo de alimentos cariogênicos, controle da dieta, uso de chupeta e da mamadeira, início da higiene bucal e época da primeira visita ao cirurgião-dentista (Quadro 1). O contato com o médico, na maioria das vezes, foi feito por meio da secretária, que passava ao profissional uma carta contendo o questionário e o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido no qual era informado a respeito dos objetivos da pesquisa, bem como dos responsáveis pela mesma. Após, aproximadamente, dez dias o pesquisador retornava para recolher o questionário e o Termo de Consentimento assinado pelo participante.

Após a obtenção e organização dos dados, com o auxílio do software Statistical Package for the Social Sciences (SPSS) versão 13.0, uma análise estatística descritiva foi realizada.

 

RESULTADOS

A população do presente estudo foi composta por 24 médicos pediatras da cidade de Passo Fundo (RS). Da população do estudo, 58,3% pertencia ao sexo feminino, sendo a média de idade dos participantes de 44,5 anos. Quanto ao tempo de formado, verificou-se que 58,3% dos médicos graduaram-se há mais de 20 anos, sendo 62,5% formados em instituições privadas. Com relação ao local onde exercem a profissão, 62,5% trabalham tanto em ambiente público como particular.

A Tabela 1demonstra as frequências simples e percentuais das condutas e percepções dos médicos pediatras com relação às variáveis: orientação às mães, primeira consulta odontológica, higiene bucal e alimentos cariogênicos. De acordo com a Tabela 1, todos os participantes do estudo orientam as mães sobre saúde bucal. Com relação à primeira consulta odontológica, 54,2% recomendam que a primeira consulta ao odontopediatra seja realizada aos seis meses de vida, sendo 20,8%, com um ano de idade, e 25,0% após os 2 anos.

Para a questão sobre como a higiene da boca do bebê deve ser feita, a maioria dos médicos orienta que a limpeza seja feita com gaze umedecida, sendo que alguns recomendam usar fralda. Além disso, 66,7% orientam que a higiene bucal do bebê deve ser iniciada ao nascer, 33,3% orientam que esta inicie após os seis meses de idade (Tabela 1).

Os resultados da Tabela 1 também demonstram que 62,5% dos médicos pediatras recomendam que a mãe não ofereça alimentos cariogênicos à criança, 16,7% só como sobremesa, porém 16,7% orientam que sejam fornecidos à livre demanda.

Na Tabela 2 observam-se as frequências simples e percentuais das condutas e percepções dos médicos pediatras com relação às variáveis: mamadeira, chupeta e uso de fluoreto. Os resultados apresentados na Tabela 2 demonstram que 70,8% dos pediatras não recomendam o uso da mamadeira, 20,8% recomendam e 8,3% recomendam dependendo da situação. O uso da chupeta foi contraindicado por 91,7% dos pediatras, sendo que 2 (8,3%) pediatras que a indicam recomendam sua remoção antes dos 2 anos de idade.

Em relação ao uso de fluoreto sistêmico, 83,3% não costuma prescrevê-lo. Quanto ao dentifrício fluoretado, 16,6% o indica antes de um ano de idade, 33,3% a partir dos 2 anos, 33,3% após os 3 anos de idade, e 16,7% relatam desconhecer a época ideal (Tabela 2).

 

 

 

 

 

 

 

DISCUSSÃO

O município de Passo Fundo (RS) fica situado no Planalto Médio, região norte do estado, com uma área territorial de 780,4km2 e 183.300 habitantes23. A cidade possui 46 ambulatórios com gabinete odontológico com 94 cirurgiões-dentistas trabalhando na rede pública. Entretanto, especificamente para o atendimento odontológico infantil existe apenas um ambulatório municipal24. Com isso, a população coberta por atendimento odontológico especializado principalmente em clínica para bebês é baixa, tornando-se fundamental a colaboração dos médicos pediatras para a promoção de saúde.

Os médicos pediatras têm papel fundamental na promoção de saúde bucal, pois estes profissionais são os primeiros a serem procurados pelos pais e exercem forte influência no aconselhamento quanto a hábitos saudáveis para a criança. Desta forma, torna-se importante uma abordagem multidisciplinar em pediatria, tendo como objetivo a atenção precoce para oferecer melhores condições de saúde à criança1-10.

Nesse sentido, na busca por uma integração profissional, participaram do presente estudo 24 (53,3%) médicos pediatras atuantes na cidade de Passo Fundo (RS). O tamanho da amostra é considerado bom para esse tipo de estudo, onde se depende da colaboração de terceiros para a resposta de questionários. Outros estudos, realizados anteriormente, utilizando uma metodologia da mesma natureza que a deste estudo, observaram uma porcentagem de participantes semelhante4,7,19.

Da mesma forma que a literatura consultada, a maioria dos pediatras (58,3%) pertencia ao sexo feminino, com uma média de 44,5 anos de idade, trabalham em ambiente público e privado, e, além disso, são formados há mais de 20 anos7,8,14.

De acordo com o resultado da questão sobre a orientação de mães sobre saúde bucal, verificou-se que 100% dos profissionais orientam às mães sobre a importância de hábitos saudáveis e da higienização da boca do bebê. Embora medidas de prevenção devam ser implantadas em qualquer idade, é na criança que se pode conseguir o maior benefício. Quanto mais precoce for a adoção de práticas voltadas para a saúde bucal, maior o sucesso alcançado, o que tem sido comprovado pelo atendimento de bebês25.

Com relação à primeira consulta ao odontopediatra, 54,2% dos entrevistados recomendam que seja realizada aos seis meses de vida, enquanto que 20,8% após 1 ano e 25,0% após os 2 anos de idade. Esses resultados estão de acordo com estudos anteriores8,19. Entretanto, Schalka & Rodrigues17 relataram que a maioria dos médicos (54,2%) orienta a primeira consulta entre 2 e 3 anos de idade; 15% ainda orientam a primeira consulta somente depois dos 4 anos e 18,7% dizem que encaminham mas não mencionam a idade. Segundo Paiva et al.1, 31,6% dos pediatras consideram um ano de idade a melhor época, mas a maioria deles (43,9%) aconselham esta visita entre dois e meio e 3 anos de idade. Maltz & Lacerda2 e Figueiredo et al.6 constataram que, aproximadamente, 74% pediatras declaram recomendar que a primeira consulta seja realizada entre 0 e 3 anos de idade. Bönecker et al.26 recomendam que a primeira visita da criança ao dentista ocorra antes dos 12 meses de idade, para que os pais recebam orientações no sentido de prevenção integral odontopediátrica.

A orientação para a primeira consulta é o ponto fundamental de colaboração do médico pediatra na promoção de saúde bucal. Principalmente, quando a criança é encaminhada no período compreendido entre a erupção do primeiro dente decíduo, em torno dos 6 meses de vida, e o primeiro ano de vida da criança15,21. Este comparecimento precoce ao consultório odontológico possibilitará o trabalho conjunto dos pais e do odontopediatra na prevenção de futuros problemas dentários.

Para Machado et al.27, o primeiro contato do bebê com o odontopediatra é de extrema importância. O ideal é que as primeiras experiências sejam agradáveis, iniciadas com a familiarização, as instalações e o pessoal da clínica. Uma maneira de tornar a primeira experiência odontológica do bebê positiva é divulgar junto à comunidade a importância da procura pelo atendimento odontológico tão logo os primeiros dentes irrompam na boca. Desta forma, será possível realizar a prevenção primária e assim evitar a ocorrência da cárie precoce da infância, condição que comprometerá a relação positiva entre bebê, família e odontopediatra. A introdução precoce do hábito de higiene bucal nos bebês é muito importante não somente para prevenir a cárie precoce da infância, mas para criar o hábito. Esses autores citam as dedeiras, as escovas especialmente desenhadas para bebês, a gaze e a fralda de tecido, entre os dispositivos mais facilmente encontrados, que possibilitam a limpeza dos dentes do bebê.

A questão aberta relativa à como a higiene bucal do bebê deve ser feita demonstrou que a maioria dos pediatras orienta que a limpeza seja realizada com gaze umedecida, sendo que alguns recomendam usar fralda. Aguiar et al.28 constatou que o material mais utilizado para este procedimento foi a fralda, provavelmente em função de seu custo financeiro ser baixo e também pelo fato de estar associado ao bebê desde o nascimento. Nos resultados de Scavuzzi et al.11 56,7% recomendaram o uso da escova dental desde o início da erupção dentária. Para Pomarico et al.19 51,5% dos médicos recomendam que a limpeza da boca do bebê deva ser feita com gaze ou fralda embebida em água.

Em relação ao início desta higiene, 66,7% dos médicos acreditam que deve ser iniciada ao nascer, 20,8% aos seis meses, 4,2% aos doze meses e ainda 8,2% aos dois anos de idade. Cavalcanti et al.12 relataram que 84,0% dos médicos pesquisados têm por hábito informar e orientar seus pacientes sobre higiene bucal, contudo não houve concordância sobre a época em que deva ser iniciada, bem como sobre o modo como deva ser realizada. Em outro estudo realizado três anos depois, Cavalcanti et al.8 encontraram o resultado de que 69,2% orientam os pais a iniciarem a higiene bucal antes do primeiro dente decíduo irromper, enquanto que 15,4% afirmam que o início deve ser após a erupção do primeiro dente decíduo.

Segundo o guia de orientação para saúde bucal nos primeiros anos de vida, desenvolvido pela Associação Brasileira de Odontopediatria, Sociedade Paranaense de Pediatria e Conselho Regional de Odontologia do Paraná, a higienização buco-dentária do bebê deve ser iniciada após a erupção do primeiro dente decíduo, utilizando-se gaze, tecido macio ou dedeira de borracha ou silicone, duas a três vezes ao dia10.

Quanto a alimentos cariogênicos, no presente estudo, os pediatras pesquisados recomendam não oferecer à criança (62,5%), uma vez por semana (4,2%), apenas como sobremesa (16,7%), porém 16,5% orientam que sejam fornecidos à livre demanda. Os resultados obtidos revelam um número muito alto (16,5%) de pediatras que ainda recomendam que alimentos adoçados sejam fornecidos sem restrição alguma, o que é preocupante devido o risco de cárie associado ao uso abusivo do açúcar.

Segundo Guedes-Pinto25 o período de socialização primária ocorre nos primeiros anos de vida e caracteriza-se, dentre outros fatores, pelo estabelecimento das primeiras rotinas. A educação sobre saúde deve ter início nessa fase e, tratando-se de dieta, os hábitos estabelecidos precocemente influenciarão o padrão futuro da alimentação. O padrão de consumo de açúcar instalado precocemente é mantido durante toda a infância, o que leva a concluir que o padrão de dieta ligado ao desenvolvimento de lesões de cárie futuras pode já estar estabelecido aos 12 meses de idade. Dessa forma, a utilização do açúcar deve ser evitada nos primeiros dois anos de vida10.

O uso da chupeta foi contraindicado por 91,7% dos pediatras, sendo que apenas 8,3% recomendam dependendo da situação, orientando sua remoção antes dos dois anos de idade. Esses resultados vão de encontro à literatura pesquisada1,8,19,29. Entretanto, de acordo com o guia de orientação para saúde bucal nos primeiros anos de vida, o uso da chupeta não é recomendado, pois o aleitamento materno supre todas as necessidades da fase oral, mas, se utilizada, deve ser limitada até aos 18 meses de idade10.

De acordo com os resultados obtidos sobre o uso de mamadeira, a maioria dos médicos (70,8%) não recomenda seu uso, 20,8% recomendam e 8,3% dizem depender da situação. Estes dados são semelhantes aos encontrados por Scavuzzi et al.11 em que 86,7% dos pediatras entrevistados não recomendam o uso de mamadeira. Segundo o guia de orientação para saúde bucal nos primeiros anos de vida, o uso da mamadeira não deve ser recomendado, mas, se utilizada, deve ser limitada ao primeiro ano de vida do bebê e apenas para o leite10.

Durante o aleitamento materno a criança aprende a posicionar corretamente a língua, ganhando tônus adequado que viabilizará as corretas funções orais, possibilitando uma boa oclusão por afastar hábitos como sucção do polegar e chupetas, pois satisfaz sua necessidade neural de sucção. Apesar de não passar fome com o uso da mamadeira, fica sempre uma falta desta satisfação neural, impulso este que a acompanha desde o útero materno, levando a criança a sugar o polegar, o lábio inferior ou a própria língua4.

Utilizando a mamadeira a criança aprende a engolir e perde a sincronia com a respiração, facilitando uma tendência à respiração bucal, pois todo o organismo, que inclui o sistema estomatognático do qual a boca faz parte, desenvolve-se sob dois tipos de estímulo: o genotípico, que vem da herança genética, portanto hereditário; e o paratípico, este se iniciando com a respiração nasal no recém-nascido. Se a respiração for feita pela boca, deixa de excitar as terminações neurais das fossas nasais, dando início a uma atrofia funcional, relativa à capacidade respiratória e ao desenvolvimento das fossas nasais e seus anexos, o que repercute negativamente no desenvolvimento dos maxilares4.

O fluxo da mamadeira não incentiva os movimentos de protrusão e retrusão, a língua fica parada, realizando apenas um movimento de vai-e-vem, funcionando como uma válvula, impedindo, desta forma, que o bebê se afogue. Mesmo com o orifício pequeno, o trabalho muscular será deficiente, sendo os músculos mastigatórios pouco exigidos, e irão se desenvolver predominantemente os músculos bucinadores4.

Em relação ao uso de fluoreto sistêmico, 83,3% não costuma prescrevê-lo, entretanto, 16,7% dos pediatras afirmaram prescrever. Esses resultados estão de acordo com estudos anteriores1,8,19,29. Buzalaf et al.30 constataram que embora 100,0% dos médicos pediatras tenham declarado não prescrever polivitamínicos contendo íon flúor, 46,8% receitam polivitamínicos com alto teor de íon flúor sem saber. Desses profissionais, 25,0% informaram a idade em que fazem esta prescrição: de 21 dias a um mês de idade, 4,2%; de 3 a 6 meses de idade, 8,3%; de 1 a 3 anos, 12,5%. Os resultados indicam uma provável falta de conhecimento desses profissionais da presença do íon flúor na composição desses medicamentos.

Os resultados positivos obtidos mediante o uso de íon flúor no controle da cárie dentária são indiscutíveis e reconhecidos cientificamente. No entanto, a ingestão excessiva desse composto no período de formação dos dentes pode levar à fluorose dentária, cuja prevalência vem aumentando a partir da década de 1980. Embora haja consenso da relação existente entre o uso de fluoretos e a redução de cárie dentária, é preciso entender que o íon flúor é uma substância tóxica e, como tal, pode causar efeitos colaterais quando altas doses são ingeridas agudamente ou, mesmo, baixas doses cronicamente30.

Quanto a questão sobre a idade ideal de introdução do dentifrício fluoretado, 16,6% o indica antes de um ano de idade, 33,3% a partir dos 2 anos, 33,3% após os 3 anos de idade, e 16,7% relatam desconhecer a época ideal. Resultados semelhantes foram encontrados em estudo anterior realizado por Scavuzzi et al.11, 73,3% dos pediatras recomendavam a introdução do dentifrício fluoretado antes dos 3 anos de idade.

O uso de creme dental fluoretado não é recomendado em crianças até dois anos de idade. Em crianças de 3 a 6 anos, indica-se quantidade reduzida de creme dental com concentração de 500 ppm (partes por milhão) de íon flúor10.

O entendimento da dinâmica de desenvolvimento da doença cárie tem possibilitado ao Odontopediatra, prevenir sua ocorrência e obter grande êxito no seu controle. A colaboração dos médicos pediatras é de fundamental importância tanto na orientação dos pais e responsáveis a respeito de comportamentos saudáveis para evitar as doenças bucais, quanto no encaminhamento o mais cedo possível ao odontopediatra. Uma maior integração entre pediatras e odontopediatras qualificará cada vez mais o atendimento de ambos, dessa maneira fundamentando as orientações e reforçando as práticas educativas em saúde.

 

CONCLUSÃO

Através das respostas obtidas, observou-se que de modo geral, a maioria dos pediatras questionados na cidade de Passo Fundo (RS), possui conhecimento sobre promoção de saúde bucal. Entretanto, foi possível constatar que existe a necessidade da implantação de ações práticas voltadas para a interação entre médicos pediatras e odontopediatras. Sendo assim, a mãe passaria a receber informações durante seu pré-natal, estando inserida em um programa educativo, ocorrendo a conscientização das mesmas sobre a saúde bucal de seus filhos, desde ainda bebês.

 

Colaboradores

OP NUNES foi responsável pela ideia, revisão bibliográfica e redação do artigo. EHC BRUSCO orientou e participou da redação do artigo. LC BRUSCO co-orientou, organizou, analisou o banco de dados e participou da redação do artigo. B PERUSSOLO foi responsável pela coleta de dados, correção e redação do artigo. E G PATUSSI foi responsável pela elaboração do questionário e redação do artigo.

 

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Endereço para correspondência:
OP NUNES
Universidade de Passo Fundo,
Faculdade de Odontologia,
Departamento de Odontopediatria.
Rod. BR 285, São José, 99052-900,
Passo Fundo, RS, Brasil.

e-mail:
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Recebido: 14/8/2009
Aceito: 11/6/2010