SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
vol.59 número3 índice de autoresíndice de assuntospesquisa de artigos
Home Pagelista alfabética de periódicos  

RGO.Revista Gaúcha de Odontologia (Online)

versão On-line ISSN 1981-8637

RGO, Rev. gaúch. odontol. (Online) vol.59 no.3 Porto Alegre Jul./Set. 2011

 

ARTIGO REVISÃO / REVIEW ARTICLE

 

Receptores Toll-Like: ativação e regulação da resposta imune

 

Toll-Like Receptors: regulation of the immune responses

 

 

Eduardo Gomes FERRAZI; Bruno Botto de Barros da SILVEIRAI; Viviane Almeida SARMENTOII; Jean Nunes dos SANTOSII

IUniversidade Federal da Bahia, Faculdade de Odontologia
IIUniversidade Federal da Bahia, Faculdade de Odontologia, Departamento de Apoio Diagnóstico e Terapêutica

Endereço para correspondência

 

 


 

ABSTRACT

Toll-like receptors are surface molecules that are present in the host's defence cells. They play an important role in detection and recognition of microbial pathogens. They generate signals that induce the production of inflammatory cytokines for activation of innate immune responses. In humans, ten Toll-like receptors have been identified and designated (TLR1-10) with different functions specific to particular microbial components. Although Toll-like receptors play a key role in protecting the host against infectious and inflammatory processes, and there must be a balance between the activation and inactivation of these receptors to avoid an excessive inflammatory or immune response, as it occurs in systemic autoimmune and chronic inflammatory diseases, such as systemic lupus erythematosus and rheumatoid arthritis. Thus, much research in this field has sought to achieve a better understanding of the mechanisms by which Toll-like receptor signalling may be regulated. The main objective of this study is to review the literature on Toll-like receptors, emphasizing the generation of signals and the immune responses developed in recognition of microbial components for these receptors.

Termos de indexação: Autoimmunity. Immunity. Toll-Like Receptors.


 

RESUMO

Os receptores Toll-Like são moléculas de superfície, presentes nas células de defesa do hospedeiro, responsáveis pelo reconhecimento de estruturas microbianas e na geração de sinais, que levam à produção de citocinas proinflamatórias essenciais para a ativação das respostas imunes inatas. Em seres humanos, dez homólogos da proteína Toll já foram identificados e assim classificados (TLR1-10) cada um com diferentes funções específicas para determinado componente microbiano. Embora os receptores Toll-Like desempenhem um papel primordial na defesa do hospedeiro contra os processos infecciosos e inflamatórios, deve haver um equilíbrio entre a ativação e inativação destes receptores para evitar uma resposta inflamatória ou imunológica excessiva, como ocorre nas doenças crônicas inflamatórias e autoimunes sistêmicas, como o lúpus eritematoso sistêmico e a artrite reumatóide. Dessa forma, diversas pesquisas neste campo têm procurado alcançar um melhor entendimento dos mecanismos de ativação dos receptores Toll-Like. O objetivo principal deste estudo é fazer uma revisão de literatura sobre os receptores Toll-Like, ressaltando a geração dos sinais e as repostas imunológicas desenvolvidas no reconhecimento das diversas estruturas microbianas por estes receptores.

Termos de indexação: Auto-imunidade. Imunidade. Receptores Toll-Like.


 

 

INTRODUÇÃO

Os receptores Toll-Like (TLR) são proteínas transmembranas altamente conservadas que desempenham papel importante na detecção e reconhecimento de patógenos microbianos, bem como na geração de sinais para a produção de proteínas e citocinas proinflamatórias1-3.

A proteína Toll foi originalmente descoberta na década de 1990, em insetos do gênero Drosophila, sendo essencial para a proteção das moscas contra as infecções fungicas. Em 1997 foi identificado e caracterizado um homólogo da proteína Toll em humanos sendo denominado de receptor Toll-Like. A partir desta data, dez receptores Toll humanos foram identificados e classificados (TLR1-10) exercendo papel importante na detecção e reconhecimento de patógenos e na indução de atividade antimicrobiana pela ativação dos sistemas de imunidade inata e adquirida4-6.

Os receptores Toll-Like funcionam como receptores de reconhecimento padrão (PRR) presentes nos macrófagos, nas células dendríticas e nos neutrófilos (leucócitos polimorfonucleares ou PMN), responsáveis pelo reconhecimento dos padrões moleculares associados a patógenos (PAMP), os quais são expressos por um amplo espectro de agentes infecciosos, como bactérias grampositivas e gram-negativas, vírus DNA e RNA, protozoários e fungos1,6-8. Dessa forma, a ativação da imunidade inata a partir da associação PRR-PAMP é um passo crucial no desenvolvimento da imunidade adquirida contra os antígenos específicos4.

Localização e características dos receptores Toll-Like

Os receptores Toll-Like 1, 2, 4, 5, 6 estão presentes na membrana plasmática, de modo que eles contêm domínios intracelular, devido à presença de proteínas do tipo TIR (MyD88, TIRAP, TRIF e TRAM) e extracelular (repetições ricas em leucina - LRR), enquanto que os receptores Toll-Like 3, 7, 8, 9 e 10 estão localizados intracelularmente, ou seja, nos endossomos e não possuem domínio extracelular. O domínio TIR é requerido para iniciar a geração dos sinais intracelulares, visto que a proteína MyD88 está presente em todos os receptores, exceto no TLR39-10.

Alguns receptores Toll-Like funcionam aos pares de modo que esta associação forma um receptor ativo simples. O dímero TLR1-TLR2 reconhece os PAMPs de bactérias gram-positivas, incluindo lipoproteínas, lipopeptídeos, peptideoglicanos e o ácido lipoteicoico. A associação TLR2-TLR6 é responsável pelo reconhecimento do ácido lipoteicoico da parede de bactérias gram-positivas e do zimosan (polissacarídeo derivado de fungos). O dímero TLR4-TLR4 reconhece o lipopolissacarídeo da parede celular de bactérias gram-negativas, a proteína F de alguns vírus e outros constituintes do hospedeiro como os oligossacarídeos do ácido hialurônico e o fibrinogênio. O dímero TLR7-TLR8 é responsável pelo reconhecimento do RNA viral de fita simples do vírus da gripe. O TLR2 reconhece o glicosilfosfatidilinositol de alguns parasitas, a exemplo do Trypanosoma cruzi. O TLR3 liga-se à fita dupla do RNA viral. O TLR5 reconhece a flagelina de algumas bactérias gram-positivas e negativas. O TLR9 é responsável pelo reconhecimento do DNA bacteriano e viral. Em relação ao TLR10, sua função permanece desconhecida11-13.

Cada receptor Toll-Like tem sua própria via de sinalização intrínseca e induz respostas biológicas específicas contra micro-organismos. Quando algum PAMP é reconhecido por algum receptor Toll-Like específico, a proteína MyD88 recruta as cinases associadas ao receptor da interleucina-1(IRAK-1 e IRAK-4) para ativar o fator 6 associado ao receptor do fator de necrose tumoral (TRAF6). Este ativa o fator de crescimento β associado à cinase 1 (TAK1), que, por sua vez, promove a ativação do complexo IKK formado por duas subunidades catalíticas (IKKα e IKKβ) e por uma subunidade regulatória (NEMO/ IKKγ). Este complexo promove a fosforilação do IκB e a sua degradação resulta no fator de transcrição nuclear (NF-κB), que será translocado ao núcleo para induzir a expressão das citocinas inflamatórias e das moléculas de adesão4,7,10-11,14.

As citocinas liberadas em resposta à ativação dos receptores Toll-Like pelos micro-organismos, como exemplo a IL-1 produzida pelos macrófagos e células epiteliais, promovem o recrutamento de leucócitos e outros macrófagos para o local da infecção. A IL-2 liberada pelos linfócitos Th1 promove a ativação dos linfócitos B e a proliferação de células T. As IL-4 e IL-5 produzidas pelos linfócitos Th2 induzem a produção da IgE (permite a degranulação de mastócitos e basófilos, com a liberação de histamina, fatores quimiotáticos para eosinófilos e neutrófilos, além de induzir reações de hipersensibilidade imediata). A IgA (permite a opsonização de parasitas facilitando a fagocitose pelo macrófago e ativação do complemento) respectivamente pelos linfócitos B. A IL-12 produzida por macrófagos e células dendríticas, promove a diferenciação dos linfócitos T em Th1 e a ativação das células NK, ambas responsáveis em secretar o interferon-γ (IFN-γ), que atua na ativação de macrófagos e dos linfócitos TCD8+10,14.

Quando o lipopolissacarídeo ou RNA viral são reconhecidos pelos TLR4 e TLR3 respectivamente, presentes nos macrófagos ou nas células dendríticas, a proteína TRIF promove a ativação do complexo formado pelas subunidades (NAP1, IKKε, TBK1 e TRAF3), a qual promove a fosforilação de diferentes fatores reguladores de interferon (IRF-3, IRF-5 e IRF-7). Dessa forma, o IRF-3 ativado é translocado para o interior do núcleo e induz a expressão de genes para a produção de interferons do tipo I (IFN-α e IFN-β)4,7,10-11,14.

Os interferons do tipo I produzidos induzem a maturação das células dendríticas, aumenta a atividade humoral dos linfócitos B, induzem a diferenciação dos linfócitos T CD8+, inibem a replicação viral e evitam a disseminação do processo infeccioso, a partir do recrutamento de linfócitos e monócitos. Além disso, as citocinas inflamatórias liberadas pelas células dendríticas ativam os linfócitos T a se diferenciarem em linfócitos Th1 (secretam IL-2, IFN-γ e TNF-β) e em linfócitos Th2 (liberam a IL-4, IL-5, IL-6, IL-9, IL-10 e IL-13). O fator de necrose tumoral (TNF) produzido pelos macrófagos promove a auto ativação de macrófagos para a liberação de IL-124,10.

Receptor Toll-Like e regulação da resposta imune

A presença de um equilíbrio entre a ativação e inativação dos Receptores Toll-Like, torna-se necessária para evitar uma resposta inflamatória ou imunológica excessiva, como ocorre nas doenças crônicas inflamatórias e autoimunes. A ativação dos Receptores Toll-Like pode ser regulada por várias moléculas que mantêm um equilíbrio entre saúde e doença, a partir de receptores reguladores intra e extracelulares4. A hipoatividade dos Receptores Toll- Like pode resultar em grande susceptibilidade a patógenos, enquanto uma hiperatividade está associada a algumas doenças autoimunes, como o lúpus eritematoso sistêmico, doenças cardiovasculares e artrite reumatóide. Além disso, a ativação desregulada do fator nuclear (NF-kB) contribui para o desenvolvimento do câncer, e o mecanismo molecular de controle da ativação deste fator nos linfócitos representa motivo de intensa pesquisa4,15.

Algumas formas solúveis dos Receptores Toll- Like têm sido relacionadas aos reguladores extracelulares da resposta proinflamatória, como exemplo a sTLR2, produzida por uma modificação postranslacional do TLR2, expressa em monócitos do plasma humano. A inibição da sTLR2 aumenta a expressão da resposta celular aos lipopolipeptídeos bacterianos. Em relação à sTLR4, variante do TLR4, é expressa no mecanismo de inibição da ativação do fator de transcrição nuclear NF-κB na produção de TNF-α mediado pelo LPS, a partir do bloqueio da proteína MD-2 recrutada pelo complexo TLR4-CD144,14.

Os reguladores intracelulares ocorrem a partir das cinases que regulam a expressão das moléculas proinflamatórias a partir da ativação dos Receptores Toll- Like. A proteína solúvel sMyD88 reverte a produção das citocinas inflamatórias a partir do sequestro da cinase IRAK-4, e, como consequência, evita a fosforilação da IRAK-1 e IRAK-4, responsáveis pela produção do fator de transcrição nuclear NF-κB. Além disso, o TGF-β bloqueia a sinalização do Receptor Toll-Like devido a degradação da proteína MyD88, o que pode representar a chave da resposta antiinflamatória ocasionada por este fator. Além disso, a IL-10, IL-13 e o TGF-β são consideradas citocinas regulatórias, ou seja, uma grande quantidade de IL-10 produzida pelos linfócitos Th2 é capaz de inibir a produção de IL-12, e, consequentemente, não ocorre a diferenciação dos linfócitos T em células Th1, assim como a IL-12 é capaz de inibir a proliferação dos linfócitos Th2, promovendo um equilíbrio da resposta imune4,14.

Receptores Toll-Like e doenças humanas

O reconhecimento de agentes patogênicos e a sinalização através de um mecanismo inato, que envolvam o domínio TIR, mostram-se presentes entre os organismos16. Isto está de acordo com a conclusão de que o sistema imunológico inato demonstra alto grau de homologia entre mamíferos, insetos e plantas e, aparentemente, têm sido altamente preservados durante a evolução17. A variação genética entre os diferentes TLR4 de mamíferos é mais elevada na região LRR extracelular, visto que a variação mais forte nesta região, envolvida no reconhecimento dos PAMP, é provavelmente o resultado da pressão evolutiva por agentes patogênicos no hospedeiro18.

Embora os Receptores Toll-Like desempenhem um papel primordial na defesa do hospedeiro contra os processos infecciosos e inflamatórios, algumas doenças são ocasionadas pelo polimorfismo destes receptores. Diversas pesquisas demonstram a relação entre os polimorfismos do TLR4 e a susceptibilidade a sepsis, doença aterosclerótica, asma, infecções por Candida albicans, periodontites crônicas, bronquiolite severa ocasionada pelo Vírus Respiratório Sincicial (RSV), transplantes e doença de Crohn19-20. O polimorfismo do TLR5 tem sido associado à pneumonia ocasionada pela bactéria Legionella pneumophila4.

O lúpus eritematoso sistêmico caracteriza-se como uma doença inflamatória crônica de etiologia desconhecida e de natureza autoimune devido à produção de autoanticorpos e a formação de imunocomplexos21. Pacientes com lúpus eritematoso, frequentemente apresentam mutações nos genes responsáveis pela codificação do DNA, como as DNase-I, DNase-II e DNase-III. Uma forma de DNA não metilada (CpG-DNA) é reconhecida pelo TLR9 dos endossomos das células dendríticas plasmocitóides, as quais produzem IFNs do tipo I, visto que altos níveis de IFN estão associados à quebra da tolerância periférica e consequentemente lideram a resposta autoimune4,22. A ativação do TLR 9 pela administração de agonistas como o CpG-DNA ou oligodeoxinucleotídeo sintético CpG-ODN, induz forte ativação imune dos linfócitos Th1, ativação das células NK, células TCD8+, como forma de proteção intracelular ou eliminar a infecção crônica. Dessa forma, as pesquisas relacionadas aos TLR 9 têm surgido como uma ferramenta poderosa na geração da imunidade adaptativa Th1 e evoluído para o aumento da eficácia da vacinação23.

Receptor Toll-Like e doença periodontal

Doença periodontal é um termo muito abrangente, uma vez que envolve enfermidades que atingem os tecidos gengivais, os tecidos conjuntivos periodontais e o osso alveolar. Trata-se de uma doença que abrange inúmeras causas e induz aos mais variados sintomas sendo, todavia, caracterizada por um grupo de lesões que afetam os tecidos de sustentação dos dentes nos seus alvéolos24.

A placa bacteriana é considerada o principal agente etiológico da doença periodontal, a qual é constituída por micro-organismos predominantemente Gram-negativos anaeróbios, cujo acúmulo nos tecidos leva a uma resposta inflamatória crônica, promovida pelo contato das células do epitélio da mucosa com metabólitos, enzimas, toxinas e fatores de colonização das bactérias24-27.

Embora a placa bacteriana seja o principal fator etiológico da doença periodontal, a resposta imune do hospedeiro determina a susceptibilidade à doença, uma vez que existe um delicado equilíbrio entre os micro-organismos encontrados na placa e a resposta do hospedeiro26. Em indivíduos sadios, a resposta imunológica proporciona uma defesa específica e bem regulada, impedindo, deste modo, o desenvolvimento da doença periodontal28.

Componentes bacterianos como o lipopolissacarídeo, encontrados na parede celular de bactérias Gram-negativas, representam importantes e potentes estimuladores de secreção celular de várias citocinas e fatores de crescimento via mediada por Receptores Toll-Like. A ligação do lipopolissacarídeo ao TLR4 induz produção de citocinas inflamatórias da resposta imune inata, que contribuem com a destruição tecidual29.

Citocinas e quimiocinas estão envolvidas na imunopatogênese da doença periodontal por induzir a migração seletiva de distintos tipos celulares e por promover a manutenção de subtipos de leucócitos específicos nos tecidos periodontais30.

Inúmeras pesquisas têm demonstrado relação entre a progressão da doença periodontal e a expressão de citocinas do tipo Th1 nos sítios de inflamação, como as IL-1, IL-2, IFN-γ e o TNF-α, sendo que a IL-1β, IL-6, TNF-α e mediadores lipídicos de prostaglandina E2 (PGE2) que estimulam macrófagos e induzem alterações no tecido conjuntivo e matriz extracelular29,31-32. Entretanto, outros estudos como o de Lappin et al.33 demonstraram o envolvimento também das citocinas da via humoral e da resposta imune Th2, sendo as células envolvidas nesta resposta muito mais abundantes nas lesões periodontais. As citocinas IL-4, IL-5, IL-6, IL-8 e IL-10, por exemplo, estão envolvidas na ativação e proliferação de linfócitos B e, em última análise, na produção de IgG e IgA específicas aos micro-organismos que causam a infecção. Dessa forma, é o fator nuclear κB (NF-κB), o fator de transcrição proteico responsável por iniciar a transcrição de várias citocinas, fatores de crescimento e moléculas de adesão, como: TNF-α, IL-1, IL-6, IL-8 entre outros, que pode ser regulado por numerosas espécies reativas de oxigênio, sendo essa regulação transcricional, importante no desenvolvimento da inflamação mediada por citocinas29.

 

DISCUSSÃO

Os Receptores Toll-Like são proteínas transmembranas que reconhecem os padrões moleculares em classes específicas de agentes patogênicos sinalizando uma série de eventos que levam à expressão de genes proinflamatórios2-3. Após a identificação do papel do gene Toll da drosophila, o TLR4, primeiro homólogo em humanos dos Receptores Toll-Like foi reconhecido, e desde então muitas pesquisas nesta área são desenvolvidas e diversos outros receptores de membrana da família Toll foram identificados4-5. Dentre os diversos Receptores Toll-Like já conhecidos, os TLR2 e TLR4 são os mais bem estudados em razão da grande variedade de células que os expressam em suas superfícies e suas consequentes repercussões no organismo humano4.

O TLR4 é um importante agente receptor de patógenos que reconhece, além de estruturas fúngicas e de agentes micobacterianos patogênicos, lipopolissacarideos de bactérias gram-negativas. Dois polimorfos do TLR4, Asp299Gly e Thr399Ile, foram identificados em alterar a função do receptor. Alguns, mas nem todos os estudos, propõem que estes polimorfos podem conduzir a uma redução de citocinas e um aumento da susceptibilidade a infecções por bacilos Gram. O primeiro polimorfo identificado dos Receptores Toll-Like foi o alelo Asp299Gly dos TLR4. Este polimorfismo está associado à redução da resposta de sinalização ao lipopolissacarideos in vitro e redução das respostas das vias aéreas à inalação do lipopolissacarideos bacteriano. Este alelo também está associado à bronquiolite severa gerada pelo vírus respiratório sincicial, responsável pela ativação do precursor do TLR434. A exposição ao LPS agrava asma preexistente, provavelmente, aumentando a inflamação das vias aéreas35-37.

A asma está associada ao reconhecimento do lipopolissacarideos e de endotoxinas das bactérias gramnegativas, devido a uma falta de regulação da diferenciação dos linfócitos T em células Th1 e Th2. Ou seja, as reações alérgicas estão associadas ao polimorfismo dos TLRs 2, 4, 7 e 9, devido à diferenciação dos linfócitos T em células Th2, as quais produzem a IL-4 responsável em ativar os linfócitos B a produzirem IgE, imunoglobulina associada as reações de hipersensibilidade imediata2.

Alguns estudos sugerem que o polimorfismo humano do TLR4 é responsável pelo desenvolvimento da aterosclerose, como por exemplo, o polimorfo Asp299Gly, o qual está associado à redução do risco para aterosclerose da artéria carótida, assim como em eventos coronarianos agudos, auxiliando uma melhora na resposta terapêutica38-39. Os estudos também demonstram que pessoas portadoras deste alelo, apresentam baixos níveis de citocinas proinflamatórias circulantes no sangue, tais como IL-6, fibrinogênio e moléculas de adesão a células vasculares38. Uma possível explicação é que a proteção contra a inflamação vascular proporcionada pelo polimorfo Asp299Gly foi maior do que o impacto danoso das infecções mais frequentes observadas nestas pessoas.

Os TLR2 possuem algumas formas polimórficas da sua estrutura genética, refletindo no reconhecimento de peptídeos bacterianos e, consequentemente, na resposta a determinados patógenos. A tuberculose é ainda uma das principais causas de morte em todo o mundo. É causada pela Mycobacterium tuberculosis e está associada a fatores genéticos que podem predispor o indivíduo à progressão da doença. A sua patogênese envolvem alguns componentes do sistema imune, especialmente os macrófagos. Os estudos de Crevel et al.40 e Means et al.41 demonstram que múltiplos componentes do Mycobacterium também ativam os macrófagos, principalmente através dos TLR2. Entretanto, Lorenz et al.42 relataram que o polimorfismo do TLR2 (Arg753Gln) pode levar a uma redução das respostas dos macrófagos para os peptídeos bacterianos, resultando em uma atenuada resposta imunitária no hospedeiro.

Embora respostas iniciais das citocinas desempenhem um papel importante na defesa do hospedeiro, a sua entrada na circulação sistêmica pode levar a uma injúria microvascular generalizada. Alguns Receptores Toll-Like, como exemplo do TLR2, TLR4 e TLR6, são expressos em cardiomiócitos e podem desempenhar um papel crítico na falência cardiovascular que ocorre durante a sepse. A sinalização via TLR4 em cardiomiócitos é supostamente responsável, pelo menos em parte, principalmente pela produção de TNF-α, IL-1β e de óxido nítrico, ocasionando danos no coração e disfunção ventricular esquerda43-44.

De acordo com os estudos de Mori et al.45 ao avaliar a localização dos TLRs 2 e 4 no tecido gengival de pacientes com periodontite a partir da análise imunohistoquímica, os autores observaram que quantidade de células positivas ao TLR2 foi maior do que ao TLR4, visto que quando ocorre a invasão de bactérias gram-negativas, os macrófagos reconhecem primeiramente o lipopolissacarideos através do TLR4 e, posteriormente, os outros componentes bacterianos são reconhecidos pelos TLR2. Esta diferença de estímulo pode explicar as altas taxas de células positivas ao TLR246.

Kajita et al.24 observaram que além da expressão dos TLRs 2, 4 e 5 na gengivite e periodontite, os TLRs 7 e 9 foram encontrados nas amostras avaliadas, demonstrandoque os vírus estão presentes no tecido gengival, no fluído crevicular e na placa subgengival na presença de doença periodontal. Dessa forma, os autores concluem que a expressão dos diferentes Receptores Toll-Like no tecido periodontal indica a possibilidade da presença de antígenos bacterianos e virais, que podem estar envolvidos no mecanismo de patogenicidade da doença periodontal.

O papel dos Receptores Toll-Like na progressão das doenças virais, ainda não está totalmente elucidado. Determinadas proteínas virais que se ligam diretamente aos TLR poderiam ser alvos terapêuticos importantes, capazes de suprimir ou ativar receptores de sinalização em diversos contextos clínicos. A defesa do hospedeiro contra o vírus envolve a produção IFN tipo I que é orientada pela expressão gênica dos fatores IRF-3, IRF-5 e IRF- 7, com a consequente ativação de respostas antivirais, antiproliferativas e imunorregulatórias47. Entre outros, o vírus do Herpes Simples foi demonstrado induzir a produção de IFN tipo I por células dendríticas plasmocitoides através de um mecanismo que envolve a ativação TLR948. A indução da imunidade inata da mucosa, por agonistas do TLR9, poderia proporcionar proteção contra estes vírus49. Atualmente, agonistas sintéticos dos TLR7 e TLR8, como imiquimod, têm sido descobertos como um bom tratamento para patógenos virais e câncer de pele50 .

O TLR9 reconhece o dinucleotídeo CpG-DNA não metilado bacteriano ou viral, e pode estar relacionado em aplicações terapêuticas. A ativação deste receptor induz tanto imunidade inata quanto adaptativa. O TLR9 ao induzir a ativação de uma resposta imune inata, pode ser aplicado na prevenção ou tratamento de doenças infecciosas, e os promotores de resposta imune adaptativa podem ser aproveitados no desenvolvimento de vacinas22.

O TLR9 expresso nas células dendríticas plamocitoides reconhece o dinucleotídeo CpG não metilado, que é relativamente comum no genoma bacteriano. Entretanto, o genoma dos vertebrados apresenta dinucleotídeos CpG altamente metilados. A ativação do TLR9 pela administração de agonistas como o CpG-DNA ou oligodeoxinucleotídeo sintético CpG-ODN induz forte ativação imune do Th1 com a secreção de IFN do tipo 1, ativação das células NK, células TCD8+, como forma de proteção intracelular ou na eliminação da infecção crônica. Pesquisas têm mostrado o TLRs9 promissor para o aumento da eficácia da vacinação, e têm surgido o TLRs9 como uma ferramenta poderosa na geração da imunidade adaptativa Th123.

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os mecanismos de regulação da resposta dos Receptores Toll-Like devem ser bem controlados durante a resposta de defesa aos micro-organismos, como forma de evitar a sua ativação excessiva causando injúrias ao hospedeiro. É possível um melhor entendimento destes mecanismos de ativação para alcançar o sucesso no desenvolvimento de novas estratégias terapêuticas para as doenças inflamatórias e autoimunes.

Colaboradores

EG FERRAZ, BBB SILVEIRA, VA SARMENTO e JN SANTOS participaram de todos os processos para elaboração do artigo.

 

REFERÊNCIAS

1. Kawai T, Akira S. The role of pattern-recognition receptors in innate immunity: update on Toll-like receptors. Nat immunol. 2010;11(5):373-84.         [ Links ]

2. Goldman M. Translational Mini-Review Series on Toll-like Receptors: Toll-like receptor ligands as novel pharmaceuticals for allergic disorders. Clin Exp immunol. 2007;147(2):208-16.

3. Albiger B, Dahlberg S, Henriques-Normark B, Normark S. Role of the innate immune system in host defence against bacterial infections: focus on the Toll-like receptors. J Intern Med. 2007;261(6):511-28.

4. Arancibia SA, Beltrán CJ, Aguirre IM, Silva P, Peralta AL, Malinarich F, et al. Toll-like Receptors are key participants in innate immune responses. Biol Res. 2007;40(2):97-112.

5. Parker LC, Prince LR, Sabroe I. Translational mini-review series on Toll-like receptors: networks regulated by Toll-like receptors mediate innate and adaptive immunity. Clin Exp immunol. 2007;147(2):199-207.

6. Bowie AG. Translational mini-review series on Toll-like receptors: recent advances in understanding the role of Toll-like receptors in anti-viral immunity. Clin Exp immunol. 2007; 147(2):217-26.

7. Hennessy EJ, Parker AE, O'Neill LAJ. Targeting Toll‑like receptors: emerging therapeutics? Nature Rev Drug Discov. 2010;9:293- 307.

8. Iwasaki A, Medzhitov R. Regulation of adaptive immunity by the innate immune system. Science. 2010;327(5963):291-5.

9. McGettrick AF, O'Neill LAJ. Localisation and trafficking of Tolllike receptors: an important mode of regulation. Curr Opin Immunol. 2010;22(1):20-7.

10. Uematsu S, Akira S. Toll-like receptors and type I interferons. J Biol Chem. 2007;282(21):15319-24.

11. Kumar H, Kawai T, Akira S. Toll-like receptors and innate immunity. Biochem Biophys Res Commun. 2009;388(4):621-5.

12. Miyake K. Innate immune sensing of pathogens and danger signals by cell surface Toll-like receptors. Semin Immunol. 2007;19(1):3-10.

13. Papadimitraki ED, Bertsias GK, Boumpas DT. Toll like receptors and autoimmunity: a critical appraisal. J Autoimmun. 2007; 29(4):310-8.

14. O'Neill LAJ. How Toll-like receptors signal: what we know and what we don't know. Curr Opin Immunol. 2006;18(1):3-9.

15. Hayden MS, Ghosh S. Shared principles in NF-kB signaling. Cell. 2008;132(3):344-62.

16. Barton GM, Kagan JC. A cell biological view of Toll-like receptor function: regulation through compartmentalization. Nat Rev Immunol. 2009;9(8):535-42.

17. Ishii KJ, Koyama S, Nakagawa A, Coban C, Akira S. Host innate immune receptors and beyond: making sense of microbial infections. Cell. 2008;3(6):352-63.

18. Smirnova I, Poltorak A, Chan EK, Mcbride C, Beutler B. Phylogenetic variation. and polymorphism at the toll-like receptor 4 locus (TLR4). Genome Biol. 2000;1(1):1-10.

19. Dahmer MK, Randolph A, Vitali S, Quasney MW. Genetic polymorphisms in sepsis. Pediatr Crit Care Med. 2005;6(Suppl. 3):S61-S73.

20. Peeters H, Bogaert S, Laukens D, Rottiers P, De Keyser F, Darfeuille- Michaud A, et al. CARD15 variants determine a disturbed early response of monocytes to adherent-invasive Escherichia coli strain LF82 in Crohn's disease. Int J Immunogenet. 2007; 34(3):181-91.

21. Sales LAR, Falabella MEV, Falabella JM, Teixeira HGC, Figueiredo CMS. Relação entre doença periodontal e lupus eritematoso sistêmico. RGO - Rev Gaúcha Odontol. 2008;56(2):189-93.

22. Kumagai Y, Takeuchi O, Akira S. TLR9 as a key receptor for the recognition of DNA. Adv Drug Deliv Rev. 2008;60(7):795-804.

23. Krieg AM. Development of TLR9 agonists for cancer therapy. J Clin Invest. 2007;117(5):1184-94.

24. Kajita K, Honda T, Amanuma R, Domon H, Okui T, Ito H, et al. Quantitative messenger RNA expression of Toll-like receptors and interferon-a1 in gingivitis and periodontitis. Oral Microbiol Immunol. 2007;22:398-402.

25. Lang NP, Schätzle MA, Löe H. Gingivitis as a risk factor in periodontal disease. J Clin Periodontol. 2009;36(Suppl. 10):3-8.

26. Sigusch B, Eick S, Pfister W, Klinger G, Glockman E. Altered chemotactic behavior of crevicular PNMs in different forms of periodontitis. J Clin Periodontol. 2001;28(2):162-7.

27. Ferreira ACR, Chujfi ES. Análise da freqüência de doença periodontal em indivíduos acometidos por acidente vascular cerebral isquêmico no Hospital Universitário Sul-Fluminense de Vassouras e Santa casa de misericórdia de Barra do Piraí - RJ: alerta preventivo. RGO - Rev Gaúcha Odontol. 2006;54(3):203- 6.

28. Papapanou PN, Wennström JL, Gröndahl K. A ten-year retrospective study of periodontal disease progression. J Clin Periodontol. 1989;16(7):403-11.

29. Miyasaki KT. The neutorphil: Mechanism of controlling periodontal bacteria. J Periodontol. 1991;62(12):761-74.

30. Southerland JH, Taylor GW, Moss K, Beck JD, Offenbacher S. Commonality in chronic inflammation diseases: periodontitis, diabetes, and coronary artery disease. Periodontol 2000. 2006;40:130-43.

31. Tokoro Y, Yamamoto T, Hara K. IL-1 beta mRNA as the predominant inflammatory cytokine transcript: correlation with inflammatory cell infiltration into human gingival. J Oral Pathol Med. 1996;25(5):225-31.

32. Tsai CC, Ho YP, Chen CC. Levels of interleukin -1β and interleukin-8 in gingival crevicular fluids in adults periodontitis. J Periodontol. 1995;66(10):852-9.

33. Lappin DF, Macleod CP, Kerr A, Michell T, Kinanr D. Antiinflammatory cytokine IL-10 and T cell cytokine profile in periodontitis granulation tissue. Clin Exp Immunol. 2001;123(2):294-300.

34. Inohara N, Ogura Y, Fontalba A, Gutierrez O, Pons F, Crespo J, et al. Host recognition of bacterial muramyl dipeptide mediated through NOD2. Implications for Crohn's disease. J Biol Chem. 2003;278(8):5509-12.

35. Schwartz DA, Cook DN. Polymorphisms of the Toll-like receptors and human disease. Clin Infect Dis. 2005;41(7):S403-7.

36. Braun-Fahrlander C, Riedler J, Herz U, Eder W, Waser M, Grize L, et al. Environmental exposure to endotoxin and its relation to asthma in school-age children. N Engl J Med. 2002;347(12):869- 77.

37. Gehring U, Bischof W, Fahlbusch B, Wichmann HE, Heinrich J. House dust endotoxin and allergic sensitization in children. Am J Respir Crit Care Med. 2002;166(7):939-44.

38. Kiechl S, Lorenz E, Reindl M, Wiedermann CJ, Oberhollenzer F, Bonora E, et al. Toll-like receptor 4 polymorphisms and atherogenesis. N Engl J Med. 2002; 347(3):185-92.

39. Boekholdt SM, Agema WR, Peters RJ, Zwinderman AH, Wall EE, Van Der Reitsma PH, et al. Variants of toll-like receptor 4 modify the efficacy of statin therapy and the risk of cardiovascular events. Circulation. 2003;107(19):2416-21.

40. Crevel R, Ottenhoff THM, Meer WM. Innate immunity to mycobacterium tuberculosis. Clin Microbiol Rev. 2002;15(2):294- 309.

41. Means TK, Jones BW, Schromm AB, Fenton M. Differential effects of a Toll-like receptor antagonist on mycobacterium tuberculosis-induced macrophage responses. J Immunol. 2001;166(6):4074-82.

42. Lorenz E, Mira JP, Cornish KL, Arbour NC, Schwartz DA. A novel polymorphism in the Toll-like receptor 2 gene and its potential association with staphylococcal infection. Infect Immun. 2000;68(11):6398-401.

43. Knuefermann P, Nemoto S, Baumgarten G, Misra A, Sivasubramanian N, Carabello BA, et al. Cardiac inflammation and innate immunity in septic shock: is there a role for toll-like receptors? Chest. 2002;121(4):1329-36.

44. Baumgarten G, Knuefermann P, Nozaki N, Sivasubramanian N, Mann DL, Vallejo JG. In vivo expression of proinflammatory mediators in the adult heart after endotoxin administration: the role of toll-like receptor-4. J Infect Dis. 2001;183(11):1617-24.

45. Mori Y, Yoshimura A, Ukai T, Lien E, Espevik T, Hara Y. Immunohistochemical localization of Toll-like receptors 2 and 4 in gingival tissue from patients with periodontitis. Oral Microbiol Immunol. 2003;18(1):54-8.

46. Matsuguchi T, Musikacharoen T, Ogawa T, Yoshikai Y. Gene expressions of Toll-like receptor 2, but not Toll-like receptor 4, is induced by LPS and inflammatory cytokines in mouse macrophages. J Immunol. 2000;165(10):5767-72.

47. Katze MG, He Y, Gale M. Viruses and interferon: a fight for supremacy. Nat Rev Immunol. 2002;2(9):675-87.

48. Krug A, Luker GD, Barchet W, Leib DA, Akira S, Colonna M. Herpes simplex vírus type 1 activates murine natural interferon-producing cells through toll-like receptor 9. Blood. 2004;103(4):1433-7.

49. Bowie AG, Haga IR. The role of Toll-like receptors in the host response to viruses. Mol Immunol. 2005;42(8):859-67.

50. Mcinturff JE, Modlin RL, Kim J. The role of toll-like receptors in the pathogenesis and treatment of dermatological disease. J Invest Dermatol. 2005;125(1):1-8.

 

Endereço para correspondência:
Eduardo Gomes FERRAZ
Universidade Federal da Bahia,
Faculdade de Odontologia.
Av. Araújo Pinho, 62, Canela,
40110-912, Salvador, BA, Brasil.
Camaragibe, PE, Brasil.

e-mail:
eg.ferraz@terra.com.br

Recebido: 19/12/2009
Aceito: 12/8/2010