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RSBO (Online)

versão On-line ISSN 1984-5685

RSBO (Online) vol.7 no.2 Joinville Jun. 2010

 

ARTIGO ORIGINAL DE PESQUISA ORIGINAL RESEARCH ARTICLE

 

Análise clínica de pacientes portadores de lesões cervicais não cariosas e sua relação com hábitos

 

Clinical analysis of patients with non-carious cervical lesions and its relation to habits

 

 

Ana Carolina Sobral de OliveiraI; Nicole Prata DamascenaI; Cristiane Salgado de SouzaII

IGraduandas em Odontologia – Universidade Federal de Sergipe (UFS) – Aracaju (SE)
IIProfessora efetiva de Dentística Restauradora da UFS. Mestre e Doutora em Dentística – Materiais Dentários – pela Faculdade de Odontologia de Bauru/USP-SP

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

INTRODUÇÃO E OBJETIVO: Este estudo teve por objetivo identificar a presença de lesões cervicais não cariosas (LCNCs) e correlacioná-las com a presença de contatos dentários prematuros e hábitos alimentares, parafuncionais e de higiene envolvidos em seu desenvolvimento.
MATERIAL E MÉTODOS: Foram avaliados 100 pacientes da Universidade Federal de Sergipe, de ambos os gêneros, com idade de 18 a 64 anos, de acordo com critérios para identificação de LCNCs. Os indivíduos responderam ao questionário com perguntas referentes a idade, gênero, dieta, hábitos parafuncionais e hábitos de higiene. Na identificação de lesões cervicais, as faces vestibulares e linguais ou palatinas foram examinadas. Posteriormente os pacientes que apresentaram LCNCs foram avaliados em relação à presença de algum contato prematuro. A análise estatística para avaliar as associações dos hábitos com a presença de LCNCs foi feita por meio do teste qui-quadrado de Pearson. Em alguns casos foi utilizado o teste exato de Fisher. Para comparar a média de idade foi empregado o teste T-Student. Em todas as situações foi considerado o nível de significância de 5% (p < 0,05).
RESULTADOS: Os resultados foram analisados estatisticamente e não foi encontrada associação entre a presença de LCNCs e os hábitos avaliados, com exceção de mastigação unilateral.
CONCLUSÃO: A ocorrência de LCNCs não pode ser atribuída somente a um único fator etiológico. A maior frequência de lesões foi em pré-molares, seguidos pelos molares, e a menor ocorrência, entre os incisivos e os caninos. Há elevada frequência de pessoas com contatos prematuros na amostra de pacientes com lesão. O avançar da idade dos pacientes está diretamente relacionado com a presença das lesões.

Palavras-chave: lesões cervicais não cariosas; hábitos; contatos prematuros.


ABSTRACT

INTRODUCTION AND OBJECTIVE: This study aimed to identify the presence of non-carious cervical lesions (NCLs) and correlate them to the presence of premature dental contacts and eating, parafunctional and hygiene habits involved in its development.
MATERIAL AND METHODS: 100 patients were evaluated at the Federal University of Sergipe, both genders, aged 18 to 64 years, according to criteria for identifying NCLs. Individuals answered to the questionnaire with questions regarding age, gender, diet, parafunctional and hygiene habits. In the identification of cervical lesions, the vestibular and lingual or palatine faces were examined. Subsequently, the patients who presented NCLs were evaluated for the presence of a premature contact. Statistical analysis to evaluate the associations of habits with NCLs was performed using the Pearson's chi-square test. In some cases the Fisher's exact test was used. The T-Student test was used in order to compare the mean age. In all cases the significance level of 5% (p < 0.05) was considered.
RESULTS: The results were statistically analyzed and no association between the presence of NCLs and the evaluated habits was found, except for unilateral mastication.
CONCLUSION: The occurrence of NCLs cannot be attributed only to a single etiological factor. The highest frequency of lesions was in premolars, followed by molars, and the lowest occurrence was between incisors and canines. There is a high frequency of patients with premature contacts in the sample of patients with lesion. The increasing age of patients is directly related to the presence of lesions.

Keywords: non-carious cervical lesions; habits; premature contacts.


 

 

Introdução

A perda da estrutura dentária pode ser causada por fraturas acidentais, anomalias, cáries ou estar relacionada ao desgaste fisiológico. Essa perda de tecido duro expõe dentina e cemento, com consequente sensibilidade dentinária e desconforto estético para o paciente [4].

Classicamente, as lesões resultantes da perda da estrutura dentária não relacionadas com a lesão por cárie têm sido atribuídas a processos de abrasão, atrição, erosão e abfração. Alguns autores [34, 42] afirmam que a abrasão pode se dar por processo friccional mecânico que não resulte da mastigação, como, teoricamente, a escovação e o uso de dentifrícios abrasivos. É o desgaste patológico do dente, provocado por um processo mecânico anormal. A atrição é o resultado da oclusão dentária e envolve, portanto, o contato entre dentes antagonistas, seja em situações funcionais ou parafuncionais. A abfração é o resultado de forças da mastigação e da parafunção mastigatória que levam à degradação das estruturas mineralizadas dos dentes à distância dos pontos de contatos oclusais. A erosão dental ocorre como uma perda progressiva dos tecidos dentais causada por um processo químico que não envolve ação bacteriana [3].

Vale ressaltar que o termo "erosão" é o mais utilizado atualmente, mas existe uma forte tendência para a utilização de "corrosão". Grippo et al. (2004) [15] afirmaram que o conceito de erosão é conhecido como a perda progressiva de material em uma superfície sólida por causa da interação mecânica entre a superfície e um fluido. Porém eles acrescentaram também que nenhum fluido dentro da cavidade bucal é tão poderoso que consiga afetar os dentes. Dessa maneira, sugeriu-se que o termo "erosão" fosse substituído por "corrosão" para denotar dissolução química dos dentes.

As lesões cervicais não cariosas (LCNCs) são caracterizadas pela perda da estrutura dentária na região cervical dos dentes próximos à junção cemento-esmalte e em relação aos fatores de risco. Estudos atuais já sugerem a natureza multifatorial [8]. Alguns autores propuseram a sobrecarga oclusal como fator primário e a abrasão e/ou a dissolução como fator secundário [14]. Outros afirmaram que nenhum processo é o maior responsável pelo início ou pelo desenvolvimento da lesão, mas quando iniciada a perda da estrutura por um processo este torna o dente mais susceptível aos danos dos demais [43].

A prevalência das LCNCs vem aumentando à medida que se eleva a expectativa de vida da população [8], variando de 5 a 85%, independentemente da forma e da etiologia [21]. Todavia estudos epidemiológicos não são comuns, por conta da dificuldade em obter e comparar dados de diferentes populações, que apresentam características próprias e metodologia pouco padronizada [7].

Diante dessas considerações, percebe-se que a predominância de lesões cervicais não cariosas é alta e a sua etiologia ainda não está bem esclarecida. Portanto, este estudo é importante, uma vez que avaliará aspectos clínicos dessa patologia, como também a sua relação com hábitos alimentares, parafuncionais e de higiene, pois teoricamente constituem possíveis fatores causais.

 

Material e métodos

O presente estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de Sergipe (n.º CAAE – 0045.0.107.000-08) e respeitou todas as atribuições definidas na Resolução CNS 196/96.

A amostra foi composta aleatoriamente por 100 pacientes atendidos nas Clínicas de Dentística Restauradora II do Departamento de Odontologia da Universidade Federal de Sergipe (UFS). Os pacientes selecionados foram convidados a fazer parte do estudo e assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido concordando com a sua participação na pesquisa, após explicação do pesquisador sobre os detalhes dela. Caso os pacientes não preenchessem os requisitos para a investigação, as informações eram devolvidas ao banco de dados sem alteração da classificação da fila de espera. Quando o paciente necessitou de qualquer outro tipo de tratamento odontológico foi encaminhado para as clínicas de graduação.

Cada indivíduo foi submetido a um exame clínico para verificar a presença de lesões cervicais não cariosas e suas características. O exame foi realizado utilizando-se isolamento relativo com o auxílio de sonda clínica n.º 5 (Duplex). Analisaram-se todas as faces de todos os dentes da arcada dentária de cada paciente.

Para coleta de dados aplicou-se um questionário respondido verbalmente pelos pacientes e anotado pelo pesquisador. O questionário constituiu-se de identificação do paciente e de perguntas pertinentes a hábitos de escovação, dieta ácida e hábitos parafuncionais.

Foram consideradas LCNCs somente as lesões visualmente detectadas ao exame clínico. Lesões restauradas não foram avaliadas. Excluíram-se também dentes com sinais e sintomas de alterações pulpares, dentes com amelogênese ou dentinogênese imperfeita e dentes tratados endodonticamente. Cada paciente analisado deveria apresentar mais de 20 dentes funcionais, que corresponde a uma das metas da Organização Mundial de Saúde (OMS) para o ano de 2010.

Os dentes com LCNC foram avaliados clinicamente em relação à oclusão em máxima intercuspidação habitual (MIH) e nos movimentos excursivos (protrusão, trabalho e balanceio). As prematuridades foram marcadas com tira de registro oclusal (AccuFilm) e anotadas na ficha clínica.

A caracterização dos participantes foi contemplada por uma análise descritiva das variáveis qualitativas por meio de tabelas e gráficos. Para as variáveis quantitativas foram calculadas as medidas de posição e dispersão. A fim de avaliar a associação entre as variáveis de hábitos de higiene, alimentares e parafuncionais com a LCNC, empregou-se o teste qui-quadrado de Pearson para independência. Nas tabelas de contingência em que a frequência esperada foi menor que cinco em mais de 20% das caselas, utilizou-se o teste exato de Fisher. Para comparar a média de idade entre o grupo com e sem lesão foi aplicado o teste T-Student. Em toda a análise adotou-se um nível de significância de 5%.

 

Resultados

Neste estudo foram avaliados 100 pacientes. A prevalência das lesões está descrita no gráfico 1, determinando dois grupos de pacientes: um sem presença de lesão cervical não cariosa (56 pacientes – 56%) e outro com presença de pelo menos um dente com lesão cervical não cariosa (44 pacientes – 44%).

 

 

O grupo de pacientes com lesão apresentou 148 dentes com a ocorrência dela, que variou de 1 a 12 dentes lesionados por paciente. A média foi de 3,36 lesões por pessoa, e 98,7% estavam localizadas na face vestibular.

Em relação ao grupo de dentes, os pré-molares foram os mais acometidos pela lesão (62,16%), seguidos pelos molares (24,32%); em menor frequência estavam os incisivos e os caninos (6,76%). Quanto à arcada dentária mais atingida, neste estudo houve pequena diferença, mas a mandíbula foi a mais afetada pela lesão (51,35%).

 

 

Dos pacientes com LCNC, 70,45% apresentaram pelo menos um contato prematuro, seja este na máxima intercuspidação habitual ou nos movimentos de lateralidade e de protrusão.

Questionário

Idade

O quadro I apresenta a análise descritiva da variável idade segundo os grupos com lesão e sem lesão, em que se verifica que para o grupo com lesão a média de idade, assim como a mediana, é superior à do grupo sem lesão. Além disso, essa diferença é significativa (p-valor = 0,021).

Gênero

Em relação ao gênero masculino e feminino, não houve diferença quanto à presença de LCNC, como é mostrado no quadro II.

Hábitos parafuncionais

No quadro seguinte, referente ao grupo de hábitos parafuncionais, não houve correlação entre relato de apertamento, bruxismo e mordeduras com a presença da lesão, porém os resultados mostraram que a mastigação unilateral influencia significativamente a presença dela (OR = 2,79; IC = 1,07-7,34).

 

Quadro III

Hábitos alimentares

No que se refere aos hábitos alimentares, neste estudo investigou-se a ligação entre refrigerantes e frutas e/ou sucos de frutas com a formação da lesão, porém não foi observada nenhuma correlação, como mostra o quadro IV. Para isso, questionou-se o consumo diário de alimentos e bebidas com caráter ácido; as possíveis respostas correspondiam a: não, às vezes (significa que o consumo não era feito em dias consecutivos) e todos os dias.

Hábitos de higiene

Em relação aos hábitos de higiene, questionou-se sobre: a frequência de escovação diária, que variava de uma a quatro ou mais escovações por dia; o tipo de escova – se esta tinha cerdas macias, médias ou duras; a direção da escovação – se realizada com movimento horizontal, vertical ou combinado; o tempo de substituição da escova; o uso de palitos de dente. Nos resultados não se encontrou nenhuma correlação com a presença de LCNC.

 

Quadro V

 

Discussão

A patogenia das lesões cervicais não cariosas ainda continua bastante contraditória, principalmente por causa da dificuldade em investigar e comparar dados clínicos juntamente com a complexidade das propriedades biofísicas da estrutura dental. Alguns autores afirmaram que estudos epidemiológicos acerca dessas lesões são pouco numerosos, considerando a alta incidência delas [1, 7]. Desde o estudo clássico de Lee e Eakle (1984) [19], a teoria de que a carga oclusal gera tensão de tração na região cervical, desenvolvendo assim lesões cervicais, tornou-se conhecida e questionada.

As características oclusais, a história relatada pelo paciente e as características morfológicas das lesões geralmente norteiam o profissional em direção a um fator etiológico específico [3]. Entretanto muitos autores em seus trabalhos concluíram que na maioria dos casos existe uma complexa interação dos diferentes fatores que dificultam a identificação de somente uma causa [4, 16, 22, 26, 31, 43]. Os resultados obtidos neste estudo reforçam a teoria multifatorial ou idiopática para a etiologia dessas lesões, ideia compartilhada pelos autores supracitados.

A grande maioria dos trabalhos clínicos sobre LCNC tentam correlacionar a presença das lesões, visualizadas após exame clínico, com dados obtidos por informações colhidas em questionários [4, 7, 25, 40, 43]. Seguindo o mesmo delineamento metodológico, foram realizados exames clínicos específicos para a determinação da presença ou não das lesões e o preenchimento de um questionário que abrangia as possíveis causas etiológicas delas.

Em seu estudo clínico, Takehara et al. (2008) [39] encontraram um resultado semelhante a este quanto à prevalência (49,1% dos pacientes avaliados apresentaram pelo menos uma LCNC). Já Molena et al. (2008) [25] concluíram que dos indivíduos pesquisados 77% tinham pelo menos uma LCNC. Contudo a amostra desta investigação foi de pacientes com idade entre 60 e 93 anos. As LCNCs são conhecidas por terem maior ocorrência em pacientes mais velhos [4, 7, 39, 40, 43, 44]. Lima et al. (2005) [21] obtiveram uma prevalência de 66% de pacientes com lesão. Santos et al. (2005) [34] realizaram uma abordagem indireta por meio de fichas clínicas arquivadas em um período de cinco anos. Diagnosticaram-se 226 lesões classe V, das quais 17% foram classificadas como lesões não cariosas.

Em relação ao grupo de dentes, neste estudo os pré-molares foram os mais acometidos pela lesão (62,16%), seguidos pelos molares (24,32%), e em menor frequência apareceram os incisivos e os caninos (6,76%); 98,7% estavam localizadas na face vestibular. Tais dados estão de acordo com a maioria dos trabalhos avaliados [3, 19, 31, 34, 45]. Somente Telles et al. (2006) [41] encontraram resultados em que os molares foram os dentes mais prevalentes. No que se refere à arcada dentária mais acometida, nesta pesquisa houve pequena diferença, mas a mandíbula foi a mais afetada pela lesão (51,35%). Em outros estudos a maxila foi a mais atingida [29, 39, 40, 44].

Os resultados deste trabalho mostram que a presença de lesões está associada com o avanço da idade dos pacientes. Isso também foi verificado em outros estudos clínicos [4, 7, 36, 39, 40, 43, 44]. Tal relação pode ser explicada pelo maior tempo que os dentes de pessoas mais velhas ficaram expostos aos fatores etiológicos, quando comparados com os dentes de pessoas mais jovens [7]. Porém Pegoraro et al. (2005) [29] não encontraram correlação entre idade e presença da lesão.

Dos pacientes com lesão, 70,45% apresentaram pelo menos um contato prematuro, seja este na máxima intercuspidação habitual ou nos movimentos de lateralidade e de protrusão. Esse resultado indica que existe uma frequência alta de carga oclusal exagerada entre os pacientes com LCNC. Alguns autores mostraram tanto em estudos clínicos quanto em laboratoriais que há correlação entre a carga oclusal e a presença de LCNC [30, 38]. Lee e Eakle (1984) [19] explicaram que quando a oclusão é ideal as forças mastigatórias durante a função são direcionadas ao longo eixo do dente e dissipada, além de resultar em mínima distorção da dentina e do esmalte. Quando a oclusão não é ideal, são geradas forças laterais que podem causar flexão no dente e criar tensão compressiva no lado em que o dente está recebendo força e tensão de tração no lado oposto. Entretanto Daley et al. (2009) [11] examinaram histopatologicamente LCNCs de dentes anteriores e concluíram que essas lesões resultam de associações entre o desgaste ácido, a abrasão e a esclerose dentinária, mas não constataram nenhuma evidência de fatores ligados a abfração.

Wood et al. (2009) [45] estudaram clinicamente o efeito de movimentos excursivos de lateralidade na progressão de lesões de abfração. Não encontraram correlação entre os pacientes que tiveram ajustes oclusais e os que não tiveram. Eles concluíram que os ajustes oclusais parecem não ter relação com a progressão de LCNCs. Do mesmo modo, Michael et al. (2009) [24] realizaram uma revisão de literatura sobre LCNC e concluíram que abfração ainda é um conceito teórico, uma vez que não é apoiado por evidências clínicas adequadas.

Em relação à associação entre hábitos parafuncionais e a presença de LCNC, outros autores, que também fizeram estudos clínicos e aplicaram questionários, não observaram ligação com a presença da lesão, assim como nesta investigação [5, 25, 29, 42]. Ommerborn et al. (2007) [27], por intermédio de seu estudo clínico com pacientes que relatavam bruxismo, encontraram associação desse hábito com a presença de LCNC. Já Shah et al. (2009) [35], que também pesquisaram a prevalência de LCNC em pacientes que demonstravam bruxismo, não verificaram diferenças estatísticas significantes. Quanto ao hábito de mastigação unilateral, o presente estudo mostrou haver uma relação com a presença da lesão. Os autores citados anteriormente não chegaram a esse mesmo resultado, com exceção de Bevenius et al. (1993) [5], que afirmaram que as pesquisas apontaram para um potencial de estresse unilateral ocasional.

Alguns autores também não averiguaram associação entre LCNC e uma dieta ácida, concordando com os resultados do presente trabalho [5, 25, 29]. Todavia, quando se trata de estudos laboratoriais, essa relação é confirmada [3, 18, 28, 37]. Correr et al. (2007) [10], por intermédio de análise in vitro, perceberam que dentes expostos a substâncias ácidas tiveram maior desgaste do que os expostos a substâncias neutras; concluíram também que a associação da abrasão com a erosão aumentava o desgaste somente em dentes decíduos e não apresentava alterações nos dentes permanentes. Lussi e Jaeggi (2008) [23] afirmaram que a erosão dental é uma doença multifatorial e que a interação de agentes químicos, biológicos e fatores comportamentais é fundamental e ajuda a explicar por que alguns indivíduos apresentam mais erosão do que outros. Portanto, cabe salientar que a história individual do paciente deve ser respeitada, principalmente no tocante à dieta, para que todos os agentes etiológicos aos quais o indivíduo possa ser exposto sejam diagnosticados, principalmente porque é difícil definir a intensidade e por quanto tempo cada aspecto atua na cavidade bucal, bem como quando este se torna patogênico.

Trabalhos semelhantes à presente pesquisa também não observaram ligação entre LCNC e hábitos de higiene [5, 25, 32], no entanto Tomasik (2006) [42] e Smith et al. (2008) [36], que também fizeram estudos clínicos, constataram associação entre LCNC e pacientes que escovam os dentes mais de uma vez por dia e aqueles que utilizam escova média e dura. Rios et al. (2006) [33] realizaram um estudo laboratorial e verificaram que a escovação influencia no desgaste dental e na formação de lesões de abrasão. Dzakovich e Oslak (2008) [13] também efetuaram um estudo laboratorial em que se observou que a escovação horizontal juntamente com o creme dental estão relacionados com o desgaste dental. Entretanto também relataram que somente a escovação com ausência do creme dental não promove a formação de LCNC. Azevedo et al. (2008) [2] realizaram uma análise in vitro e perceberam que escovas macias, médias e duras não são capazes de causar abrasão em esmalte, enquanto a dentina mostrou mudanças na rugosidade da superfície pela ação de escovas médias e duras; não houve alteração com escovas macias.

Por meio dos resultados expostos e da literatura pertinente, observou-se que forças laterais, associadas ao hábito parafuncional da mastigação unilateral, são agentes etiológicos com grande potencial para desenvolver lesões cervicais. Portanto, a relação desses com os demais fatores, como dieta ácida e abrasão, pode fazer com que haja progressão das lesões. Cada vez mais a combinação de fatores etiológicos e a permanência destes na boca por mais tempo acarretará LCNCs mais severas aos pacientes.

 

Conclusão

Com base nos resultados encontrados pôde-se concluir que:

• a porcentagem de pacientes avaliados em nosso estudo que apresentaram LCNCs foi de 44%, o que consideramos uma alta ocorrência;

• a maior frequência de LCNCs foi em pré-molares, seguidos pelos molares, e a menor foi entre os incisivos e os caninos;

• há uma elevada quantidade de pacientes com contatos prematuros na amostra de pacientes com lesão;

• não houve correlação entre os hábitos parafuncionais, alimentares e de higiene e a presença de lesão, com exceção da mastigação unilateral;

• a formação de LCNCs não pode ser atribuída somente a um único fator etiológico.

 

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Endereço para correspondência:
Ana Carolina Sobral de Oliveira
Avenida Gonçalo Rolembergue Leite, 1.882 – ap. 803 – Edifício Marajó
CEP 49050-370 – Aracaju – SE
E-mail: anacarol_4@yahoo.com.br

Recebido em 22/9/2009
Aceito em 16/12/2009
Received on September 22, 2009
Accepted on December 16, 2009