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RSBO (Online)

On-line version ISSN 1984-5685

RSBO (Online) vol.7 n.3 Joinville Sep. 2010

 

ARTIGO DE REVISÃO DE LITERATURA LITERATURE REVIEW ARTICLE

 

Fraturas nasais em esportes: sua ocorrência e importância

 

Nasal fracture in sports: its occurrence and importance

 

 

Neide Pena Coto; Josete Barbosa Cruz Meira; Reinaldo Brito e Dias

Departamento de Odontologia, Faculdade de Odontologia da Universidade de São Paulo – São Paulo – SP – Brasil

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

INTRODUÇÃO: O aumento do número de participantes nas mais variadas modalidades desportivas e de praticantes em recinto fechado trouxe também um aumento significativo de traumas orofaciais nos esportes, principalmente fraturas nasais, que ocupam o terceiro lugar em ocorrência em todas as modalidades desportivas.
OBJETIVO E REVISÃO DE LITERATURA: Trazer conhecimento das causas, da ocorrência e da importância da fratura nasal no esporte, já que é de responsabilidade do cirurgião-dentista confeccionar meios de proteção bucomaxilofaciais nos esportes, área em que a Odontologia do Esporte vem se sedimentando.
CONCLUSÃO: Um afastamento prolongado do atleta acarreta a ele grande prejuízo físico e psicológico, assim como prejuízo financeiro para seu clube. Deve-se ter atenção para meios de proteção para o atleta.

Palavras-chave: fratura nasal; fraturas nos esportes; fratura nasal nos esportes.


ABSTRACT

INTRODUCTION: The increasing number of participants in various sports, mainly those practiced indoors, brought a significant increase of orofacial injuries in sports, especially nasal fractures, which rank third in incidence in all sports.
OBJECTIVE AND LITERATURE REVIEW: To study the causes, occurrence and importance of nasal fracture in sports, as providing ways of protecting the maxillofacial area in sports is the responsibility of the dentist, area in which Sports Dentistry is establishing itself.
CONCLUSION: A long athlete withdrawal carries great physical and psychological damage, as well as financial loss to his club. Attention in providing ways of protection for the athlete is required.

Keywords: nasal fracture; fractures in sports; nasal fracture in sports.


 

 

Introdução

Traumas da face têm representado nos últimos anos uma grande porcentagem de hospitalizações e realização de cirurgias. Percebe-se um aumento significativo no número de fraturas faciais em atividades desportivas [1, 21], por causa do grande número de praticantes dos mais variados tipos de esporte de contato, como futebol, basquete e rugby, e também dos chamados "esportes radicais", que expõem o homem a situações de risco. As lesões maxilofaciais nos esportes devem ser estudadas a fim de mapear causas mais frequentes, tratamentos indicados e dispositivos de proteção, minimizando assim riscos de afastamento de treinos e competições por um longo período de tempo por parte do atleta lesionado [20, 25], pois isso compromete a sua carreira e acarreta grande prejuízo financeiro para o clube [12]. Trabalhos mostram que o atleta perde condicionamento físico, além de apresentar, em muitos casos, tendência à depressão, o que prejudica a sua recuperação física [9, 12].

Este trabalho de revisão de literatura vem chamar a atenção para a necessidade de conhecer causas, a incidência e a importância da fratura nasal no esporte, já que é de responsabilidade do cirurgião-dentista confeccionar meios de proteção bucomaxilofaciais nos esportes, como determina a ASTM 697-80 [2].

 

Revisão de literatura

A face é a região mais exposta do crânio, portanto mais sujeita a injúrias provocadas por impactos diretos como pancadas, golpes e quedas [7, 26]. Felizmente o esqueleto da face é composto por ossos capazes de suportar altas forças de impacto, como os zigomáticos, o frontal e a mandíbula. Eles assumem a função de proteger elementos vitais como cérebro, olhos e estruturas neuromusculares, formando assim a zona de resistência da face [5].

Ao dividir a face em terços, tem-se o terço superior (entre a sutura fronto nasal e a região mais superior do osso frontal), médio (entre a sutura frontonasal e maxila) e inferior (entre comissura labial e parte mais anteroinferior da mandíbula). O terço médio é o mais proeminente e também o mais complexo; apresenta a maior incidência de fraturas da face nos esportes e é composto pelos ossos nasais e maxila, que formam a zona de fragilidade da face [6], e pelos ossos zigomáticos, que oferecem um arcabouço resistente [27].

Os fatores determinantes para a ocorrência de injúrias nos esportes podem ser divididos em [8]:

• Extrínsecos – tipo de esporte, posição no time e nível de competição, treino (tipo, frequência e intensidade), ambiente (tipo de solo de jogos e treinos, fechado ou aberto), condições do tempo, temporada do time, fator humano (companheiros de time, oponentes, técnico, espectadores e juiz), uso de equipamentos de proteção, modalidade desportiva, tipo de uniforme e tipo de calçado;

• Intrínsecos – idade, tipo físico, gênero, preparação física, mobilidade articular, habilidade motora, habilidade no esporte, anormalidade anatômica, presença prévia de fratura. Característica psicológica: motivação, predisposição ao trauma e aceitação de cobrança e exposição.

Uma fratura óssea é produzida pela conversão de qualquer tipo de energia em energia de deformação, que é dissipada entre tecidos moles e a estrutura óssea da face através de pontos de aplicação. Entre as formas mais comuns de energia encontradas na natureza está a cinética, característica dos corpos em movimento. A rapidez e a extensão do agente influem no tipo da deformidade [20]. Por definição, o impacto é um fenômeno que acontece em curta duração, por volta de 15 milissegundos. Por isso não ocorre resposta muscular, e o tempo do impacto mostra-se determinante para a falha do osso [14, 17, 28]. A biomecânica do impacto é a ciência que estuda a prevenção e o controle de injúrias, as quais, em casos de fraturas nasais, ocorrem por forças compressivas [24]. O objetivo do estudo da biomecânica do impacto é prevenir lesões por meio de mecanismos de proteção, quantificando, por exemplo, a resistência dos ossos humanos ao impacto [14, 19].

Os ossos nasais são relativamente espessos em suas articulações e em seu terço superior e mais finos em sua parte inferior, onde são frequentemente sujeitos a traumas e fraturas. Dependendo da direção e da força do impacto, tem-se diferentes tipos de fratura, que podem envolver os ossos próprios do nariz, as cartilagens lateral superior e lateral inferior, assim como os ossos vizinhos (lacrimal, frontal, malar, etmoide e órbita), associados ou não a lesões de tecido mole [9, 25]. Normalmente não há fratura de septo, mas quando ocorre é classificada como subcategoria da fratura nasal [11].

A fratura nasal tornou-se a terceira em ocorrência nos traumas desportivos, precedida pela fratura da clavícula e do punho [9]. As fraturas nasais durante a prática esportiva tiveram um importante acréscimo nesses últimos 15 anos, por causa do aumento de 40% de esportes em ambiente fechado [1]. O osso nasal é um dos mais afetados por acidentes desportivos – cerca de 56% [11, 12], sendo 15% das fraturas recorrentes [5].

A fratura nasal ocorre em três ocasiões: choque com outro esportista, contra o solo e contra algum equipamento da quadra ou do campo [12, 18]. A sua causa mais comum é o impacto com outro jogador (chega a 43% dos casos de fraturas nasais), seguido por colisão de cotovelo-cabeça e cabeça com cabeça [8]. Acontece normalmente por colisão em que há choque de face com cabeça ou face com parte do corpo. As fraturas da região nasal são resultado de ação e reação, em que os ossos fraturam em virtude da tensão criada no local. São os seguintes os fatores que influenciam a ação: grau de força relacionada com velocidade da cabeça, agente traumático ou ambos; direção da força; duração da força; ponto de aplicação da força; massa e área de secção do agente ofensivo. A reação é influenciada por: resistência inerente e elasticidade dos componentes mesofaciais e habilidade do pescoço em dobrar para ajudar a absorver a energia [27]. Contudo alguns autores afirmam que não ocorre resposta muscular e que o tempo do impacto é determinante para a falha do osso [14, 17, 28].

O melhor momento para o tratamento de uma fratura nasal é nas primeiras duas ou três horas após a ocorrência da lesão [9], e a respiração adequada deve ser restabelecida [6]. A reparação da fratura dá-se em três estágios: de inflamação recente, de reparação e de remodelação [4]. Para uma boa reparação, o osso não pode sofrer deslocamentos durante o período de cicatrização [10]. O osso nasal consolida em 6 a 10 semanas [4, 5, 6, 13]. A redução da fratura deve acontecer pela fixação interna rígida [4, 23]. A pessoa pode ficar com gesso sobre o nariz de 7 a 10 dias e deve aguardar de 4 a 7 dias após redução cirúrgica para retorno a treinos e jogos; recomenda-se uso de protetor nasal [5]. O osso do nariz apresenta união óssea perfeita passados 30 dias da redução [18, 23].

 

Discussão

Quando se discutem injúrias nos esportes, a primeira coisa que se observa é a necessidade do atleta em ter um breve retorno às atividades, pois sua carreira, seu desempenho, sua saúde mental e as divisas que traz ao clube que defende estão em jogo. Uma fratura nasal deve afastar o atleta de suas atividades por até dez dias, tempo necessário para que não haja refratura; recomenda-se o uso de protetor nasal para esporte durante pelo menos o período de consolidação da fratura, que gira em torno de 30 dias [5]. Protetores orofaciais devem ser confeccionados pelo cirurgião-dentista, que precisa ter conhecimento dos fenômenos que envolvem uma injúria por impacto, como o grau de força, a velocidade da cabeça, o tipo do agente impactante, sua geometria e secção transversal; além disso, dados sobre a direção, a duração e o ponto de aplicação dessa força são fatores decisivos para determinar o grau da injúria. Autores afirmam que o fato de o tempo de impacto ser muito pequeno (15 milissegundos aproximadamente) faz com que o movimento de retropulsão da cabeça promovido pela transmissão do impulso não interfira na absorção da energia. Já Stanley e Nowak [27] dizem que os tecidos circunvizinhos, bem como o movimento do pescoço, minimizam a energia de impacto, informação importante para calcular o nível de proteção que um protetor nasal deve apresentar. Baseados nessas afirmações e informações, os pesquisadores responsáveis por este trabalho têm uma linha de pesquisa voltada para fraturas orofaciais nos esportes e para o estudo de protetores bucais e nasais esportivos. Tais pesquisas são realizadas de modo multicêntrico e multidisciplinar, como mostra a figura 1. A imagem craniofacial foi obtida mediante tomografias computadorizadas, e o protetor nasal, sobreposto a essa imagem, foi idealizado e preconizado pela disciplina Prótese Bucomaxilofacial da FOUSP.

 

 

Conclusão

De acordo com a revisão de literatura, considera-se que:

• nos últimos anos houve um aumento de injúrias da face na prática desportiva, principalmente do osso nasal, por causa do aumento do número de praticantes e também de esportes em recinto fechado;

• quando o atleta sofre fratura nasal, deve permanecer afastado de treinos e jogos entre 7 e 10 dias. Para o retorno à prática desportiva é recomendado o uso de protetor nasal para esporte;

• o afastamento longo do atleta traz prejuízo a ele e ao clube;

• o cirurgião-dentista é o profissional responsável pela confecção de protetores orofaciais para a prática de esportes.

 

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Endereço para correspondência:
Neide Pena Coto
Rua Poetisa Colombina, 143 – ap. 21 – Jd. Bonfiglioli
CEP 05593-010 – São Paulo – SP
E-mail: npcoto@usp.br

Recebido em 14/10/2009
Aceito em 2/12/2009
Received on October 14, 2009
Accepted on December 2, 2009