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RFO UPF
Print version ISSN 1413-4012
RFO UPF vol.19 n.3 Passo Fundo Sep./Dec. 2014
Aplicabilidade de rhBMP-2 em diferentes técnicas de enxertia
rhBMP-2 applicability in different grafting techniques
Carlos Eduardo Zanella PasqualiI ; Liliane Cristina Onofre CasagrandeII ; Monique Estér PonteIII ; Thiago Aragon ZanellaIII ; Fernanda Denti BrumIV ; Raphael Carlos Drumond LoroV
I Especialista em Cirurgia Bucomaxilofacial pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), Porto Alegre, RS, Brasil
II Especialista em Cirurgia Bucomaxilofacial pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), Porto Alegre, RS, Brasil
III Mestrando em Cirurgia Bucomaxilofacial pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), Porto Alegre, RS, Brasil
IV Estudante de Pós-Graduação no Departamento de Ortodontia da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), Porto Alegre, RS, Brasil
V Orientador e professor de Pós-Graduação na Faculdade de Odontologia, no Departamento de Cirurgia Bucomaxilofacial da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), Porto Alegre, RS, Brasil
RESUMO
Objetivo: analisar a influência da rhBMP-2 em enxertos bucofaciais, apresentando pesquisas recentes, feitas em animais e em humanos, bem como as diferentes metodologias de aplicabilidade clínica e os resultados obtidos por seus autores. Revisão de literatura: para que seja possível a instalação de implantes ou a correção de defeitos ósseos há necessidade de que exista tecido ósseo de boa qualidade. Sem isso, as possibilidades de sucesso nos procedimentos de osteointegração e reabilitações bucofaciais, visando devolver ao paciente o volume ósseo perdido, são muito reduzidas. As proteínas morfogenéticas ósseas (BMPs) são substâncias osteoindutoras e têm sido utilizadas na regeneração óssea. A procura por materiais que apresentem características semelhantes às alcançadas com o enxerto autógeno, com o objetivo de reduzir a morbidade dos procedimentos de restauração das estruturas ósseas perdidas, fez com que as pesquisas avancem para o lado dos materiais sintéticos, como é o caso da rhBMP-2, principal proteína morfogenética indutora de tecido ósseo. Considerações finais: novos estudos são necessários para analisar a viabilidade e o sucesso da aplicação dessas proteínas. Para tanto, pode-se observar que essas proteínas têm uma excelente função na formação óssea.
Palavras-chave: Proteínas morfogenéticas ósseas. Regeneração óssea. Osseointegração. Proteínas da superfamília de TGF-beta.
ABSTRACT
Objective: to examine the influence of rhBMP-2 in bucco- facial grafts, presenting recent research on animals and humans, as well as different approaches to clinical application and the results obtained by the authors. Literature Review: to allow either the installation of implants or the correction of bone defects, high quality bone tissue is required. Otherwise, the chances of success in osseointegration procedures and bucco-facial rehabilitation that aim to provide the patient with the bone volume lost are greatly reduced. Bone morphogenetic proteins (BMPs) are osteoinductive substances and have been used in bone regeneration. The search for materials presenting characteristics similar to those achieved with autograft, aiming to reduce morbidity in procedures of restoration of lost bone structures, allowed research to develop toward synthetic materials, such as the rhBMP-2, which is the main morphogenetic protein inducer of bone tissue. Final Considerations: further studies are needed to analyze the feasibility and success of the application of these proteins. Hence, it may be observed that these proteins play an important role in bone formation.
Keywords: Bone Morphogenetic Proteins. Bone Regeneration. Osseointegration. TGF-beta Superfamily Proteins.
Introdução
Técnicas de enxerto ósseo surgiram para suprir perdas de volume nos sentidos horizontais e verticais, em pacientes com quantidade óssea reduzida, visto que o sucesso de reabilitações bucofaciais depende não somente do treinamento e da experiência do profissional, mas também da quantidade e da densidade de osso disponível1,2.
O tecido ósseo tem as seguintes propriedades de reparação e formação: osteogênese que é a formação óssea mediada por osteoblastos; osteoindução, mediada por BMPs, induzindo a formação óssea ectópica por meio de células mesenquimais; e osteocondução, relacionado à composição e à estrutura (arcabouço). Tais propriedades têm papel importante nos diferentes mecanismos de formação óssea dos enxertos, os quais podem ter diferentes origens: autógenos, homógeno, xenógeno e aloplásticos3-6. Osso autógeno ainda é o "padrão ouro" para procedimentos de reconstrução7, apesar da grande morbidade8.
Em estudos recentes, pesquisadores isolaram a principal proteína para regeneração óssea, a proteína morfogenética (BMP), e derivaram sinteticamente a Proteínas Morfogenéticas Ósseas Recombinantes Humanas (rhBMP-2). Essa proteína funciona como regulador de crescimento e diferenciação celular, induzindo a transformação de células-tronco em células produtoras de tecidos ósseos ou vasculares3,6.
Fazendo com que as pesquisas avancem para o lado dos materiais sintéticos9, rhBMP-2 foi testado em diversos estudos, mostrando efeitos de indução óssea7,10,11. Esse é citado clinicamente como um relevante indutor ósseo, num largo espectro periodontal e crânio facial, nos modelos animais de grande porte10-19.
Cuidados como limitações anatômicas20, propriedades de transporte21-23, características da molécula BMP23-25 e dose26-28 são necessários para otimizar os resultados do tratamento com o uso de BMPs.
Este trabalho terá como meta realizar uma ampla revisão de literatura a respeito de técnicas de enxerto bucofacial utilizando BMPs.
Revisão de literatura
Devido a diferentes graus de indução de osteogênese, para um prognóstico aceitável do enxerto utilizado, o material de enxertia é de fundamental importância29. Os enxertos podem ser divididos em autógenos, homógenos, xenógeno e aloplásticos3,4.
O padrão a ser alcançado pelos enxertos ósseos é o dos enxertos autógenos. Todavia, esses enxertos requerem duas fendas cirúrgicas: uma para área receptora e outra para a área doadora, gerando cirurgias mais traumáticas e de execução mais complexa do que as de enxerto homógeno ou aloplástico, em que o material a ser enxertado pode ser obtido comercialmente. Estudos comparativos são encontrados em literaturas e devem funcionar como uma base de conhecimento biológico para que o cirurgião- dentista opte pelo que melhor se adequar à sua situação clínica específica29-31.
Com o objetivo de reduzir a morbidade dos procedimentos de restauração das estruturas ósseas perdidas, a procura por materiais que apresentem características semelhantes às alcançadas com o enxerto autógeno fez com que as pesquisas avancem para o lado dos materiais sintéticos32.
As Proteínas Morfogenéticas Ósseas foram, primeiramente, descritas por Urist e Strates33 (1971) e, mais tarde, Wozney et al.34 (1988) clonaram os genes das BMPs. Desde então, as rhBMPs têm sido estudadas na tentativa de neoformação óssea por apresentarem alta capacidade osteoindutora e entre essas destacamos o rhBMP-235.
O grande diferencial desse está principalmente na possibilidade de eliminar os procedimentos de coleta de osso autógeno em sítios intra e extraorais. Além disso, a probabilidade de aumento na deposição ósseo estimula a utilização desse material36,37.
As BMPs formam um grupo de glicoproteínas classificadas em oito grupos. Essas proteínas podem ter origem bovina e humana, pertencendo a uma grande família chamada de Fator de Crescimento Beta (TGF), uma vez que têm em suas fórmulas uma sequência muito similar de aminoácidos entre elas. As proteínas que foram isoladas (ou purificadas) até então são: BMP-1; BMP-2; BMP-3 (Osteogenina); BMP-4; BMP-5; BMP-6, BMP-7 e BMP-8; cada uma dessas proteínas tem uma capacidade osteoindutora diferente38. As BMPS recombinantes 2, 4 e 7 induzem formação óssea, sendo as mais testadas clinicamente39.
O rhBMP-2, por exemplo, tem a maior capacidade osteoindutora dentre todas as BMPs40, participando da diferenciação de células mesenquimais em células com fenótipo de osteoblastos, aumentando a atividade da fosfatase alcalina, do Camp (em resposta ao hormônio da paratireoide) e de osteocalcina41,42.
Testes com os mais variados tipos de carreadores tornam-se interessantes e necessários para obtermos o carreador ideal, devido às varias formas existentes de BMPs43. O carreador deve ser absorvível na medida em que for ocorrendo à formação óssea, além de seguro, biodegradável, biocompatível e formulado para permitir tamanhos e formas adequadas para o enxerto32. Apesar de a BMP induzir formação óssea quando implantada sozinha, associada com outros substratos ou meios, conseguimos resultados mais efetivos38.
O carreador deve promover uma lenta liberação da BMP e deve ter robustez suficiente para manter a integridade dos bordos, promovendo a manutenção espacial e mantendo estáveis os bordos do retalho (arcabouço)44. Quando se associa a BMP com um carreador, propicia-se imobilidade da proteína na área, diminui-se a quantidade de BMP necessária e o tempo para que ocorra a indução45.
Dentre os materiais testados em associação à BMP, ressaltamos: hidroxiapatita35,46; esponjas de colágeno reabsorvível16,21,25,35,46-48; politetrafluoretileno expandido49,50; osso bovino16,21,51-54 e osso autógeno55. Os carreadores mais utilizados são a hidroxiapatita e o colágeno, pois são compostos presentes na estrutura óssea, absorvendo naturalmente a BMP56.
Efeitos adversos também vêm sendo relatados com o uso de rhBMP-2, tais como reações alérgicas locais, perda do enxerto, infecções, edema e complicações no reparo, apesar dos resultados clínicos favoráveis57,58.
Foi investigado se há melhora na ósseointegração implante-osso por meio da utilização de rhBMP-2 em testes com coelhos, mensurando força de ligação por teste de tração. Os autores concluíram que rhBMP-2 melhora a qualidade e a quantidade de osseointegração osso-implante59.
Os efeitos na formação óssea, utilizando rhBMP-2 em defeitos alveolares, foi testado em mandíbulas de jovens primatas não humanos, obteve uma regeneração óssea satisfatória, após o implante cirúrgico de rhBMP-2, mostrando-se uma alternativa eficaz para substituição aos enxertos autógenos60.
A eficácia de aumento do osso vertical foi avaliada no osso craniano de 15 coelhos, revelando que um bloco córtico-esponjoso de osso humano, agregado com rhBMP-2, poderia ser uma opção de tratamento alternativo para aumento ósseo vertical61.
Para examinar a eficácia de rhBMP-2 em distração osteogênica, os autores relataram a consolidação óssea em 21 coelhos, sugerindo que a rhBMP- 2 promove a formação de osso em distração osteogênica62.
Ao se comparar o aumento do seio maxilar, um grupo com rhBMP-2 em uma esponja de gelatina (PLPG) e outro com osso pélvico esponjoso autólogo, durante a colocação de diferente sistemas de implantes dentários, foi realizado um estudo em nove ovelhas adultas, realizando avaliações de contato implante-osso (BIC) e densidade óssea (BD). O uso de rhBMP-2 com esponja de gelatina aumentou o BIC, bem como a BD nos seios maxilares aumentados se comparados ao osso autólogo9.
Foi realizado um relato clínico em 14 pacientes, os quais foram selecionados a partir de um grupo maior, recebendo rhBMP-2 com carreador de colágeno em diferentes categorias de defeitos mandibulares: doenças neoplásicas e osteomielite (relacionadas com bifosfonatos ou irradiação). Esse estudo indicou que o uso de rhBMP-2, sem uso concomitante de materiais de enxerto ósseo, em grandes defeitos mandibulares, produz uma excelente regeneração óssea da área receptora e estabelece a base para o retorno da função protética63.
Uma revisão sistemática foi realizada por meio de estudos clínicos/série de casos, publicada de 1980 até 2012, usando rhBMP-2/ACS (esponja carreadora de colágeno reabsorvível) quando utilizado para correção de defeitos alveolares/aumento do seio maxilar em humanos. Observou-se uma formação óssea clinicamente significativa no aumento do seio maxilar, permitindo a colocação de implantes dentários em diferentes concentrações de rhBMP-2 e em cavidades de extração. A rhBMP-2/ACS manteve altura do rebordo alveolar, reforçando simultaneamente a largura desse. Dessa forma, rhBMP-2/ ACS aparece como uma alternativa promissora ao enxerto ósseo autógeno64.
Um estudo clínico randomizado foi realizado comparando o efeito de rhBMP-2 em uma esponja carreadora de colágeno reabsorvível (ACS), com enxerto autógeno (região retromolar de mandíbula), para aumento de maxila atrófica anterior. Uma malha de titânio foi usada para proporcionar espaço e estabilidade da ferida. Em seis meses não foram observadas diferenças significativas no ganho ósseo horizontal entre rhBMP-2/ACS e enxerto ósseo autógeno. Foram colocados 62 implantes depois de seis meses de cura sem diferenças significativas entre os dois grupos para o número de implantes, o tamanho do implante, a estabilidade primária e sobrevivência65.
Marx et al.66 (2013) realizaram estudo clínico randomizado, em pacientes com defeitos verticais de maxila, utilizando duas formas de enxertos; um grupo de vinte pacientes com enxerto autógeno e outro grupo de vinte pacientes com enxerto composto de rhBMP-2, esponja de colágeno acelular (ACS), osso esponjoso alogênico liofilizado (CCFDAB) e plasma rico em plaquetas (PRP). Como resultado, o enxerto composto de rhBMP-2 / ACS-CCFDAB-PRP teve previsibilidade comparável ao enxerto autógeno, com custo igual, menor morbidade, formação óssea mais viável com menor quantidade de partículas residuais, porém com maior edema. Ressalta-se que enxerto composto é capaz de atingir resultados equivalentes a enxertos autógenos66.
Apesar de todas as vantagens quanto ao uso de rhBMP-2, essa é altamente sobre-expressa na maioria dos carcinomas de pulmões debilitados. Teste em ratos revela que BMP-2 aumenta a neovascularização e a resposta angiogênica de tumores de desenvolvimento, sugerindo, com os dados deste estudo, que a rhBMP-2 pode envolver a ativação de células endoteliais. No entanto, um mecanismo que revele seu papel no câncer ainda não foi estabelecido67.
Discussão
A difusão do uso dos implantes dentários e de enxertos ósseos, no meio odontológico, induziu os pesquisadores a buscarem substâncias que pudessem contribuir para a formação de um tecido ósseo de qualidade e em quantidade suficiente para a instalação dos implantes e para reabilitações bucofaciais, assim como para melhorar e/ou acelerar o processo de osseointegração, fundamentais para o sucesso dessa alternativa clínica.
A proteína morfogenética BMP-2 induz a transformação de células-tronco em células produtoras de tecidos ósseos ou vasculares, funcionando como reguladores de crescimento e de diferenciação celular. É um assunto recente para a área da Odontologia, entretanto, o avanço nas pesquisas sobre biomateriais tem apresentado uma melhora da resposta tecidual em regeneração óssea guiada, enxertos e implantes com resultados mais seguros, porém menos invasivos e semelhantes ao enxerto autólogo.
Alguns questionamentos têm sido abordados devido à identificação de BMPs em carcinomas de pulmões doentes, expressando altos níveis de BMP-2. Poderiam essas atuar como agentes oncogênicos ou estimular a oncogênese? O uso de BMPs, porém, não demonstrou elicitar respostas oncológicas. Os eventos oncológicos provavelmente aumentaram a expressão de BMPs, ativas não somente na diferenciação celular, mas também na angiogênese. A vida curta das BMPs também contribui para que a indução de neoplasias pelo uso de BMPs mostre-se improvável67.
Um grande número de estudos envolvendo BMPs está disponível, porém esses devem ser analisados com cautela, já que a maioria envolve pequenos grupos de amostras de população e não abrange grupo-controle, além do fato de a maioria dos trabalhos terem sido realizados em animais e em defeitos criados cirurgicamente nesses espécimes. Apesar desses animais permaneceram sob padronização e controle de alimentação e de higiene, dificilmente se consegue essas situações em estudos que envolvem a análise de seres humanos. Por esse motivo, os resultados obtidos entre esses estudos podem diferir substancialmente, possibilitando a ocorrência de vieses tendenciosos quanto à sua avaliação.
Ressaltamos que todos os artigos estudados sugeriram novas pesquisas para confirmar os resultados até hoje encontrados, havendo, ainda, a necessidade de muitos estudos pré-clínicos e clínicos para analisar a viabilidade e o sucesso da aplicação dessas proteínas no caso de implantes e enxertos bucofaciais em humanos.
Considerações finais
Ao considerarmos a presente revisão, é pertinente concluir que a aplicação deas substâncias mencionadas nos defeitos ósseos promove o preenchimento da região, com uma neoformação óssea de densidade e trabeculado similares ao osso normal, além de um aumento da cortical e da altura alveolar vertical, podendo ser uma alternativa real aos enxertos ósseos autógenos.
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Endereço para correspondência:
Carlos Eduardo Zanella Pasquali
Tomaz Flores, nº 82/905-Bairro Independência
90035-200 Porto Alegre-RS
E-mail: pasquali.carlos@hotmail.com
Recebido: 20/05/2014
Aceito: 21/07/2014