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RFO UPF

Print version ISSN 1413-4012

RFO UPF vol.17 n.2 Passo Fundo May./Aug. 2012

 

 

Análise de resistência à tração de pinos de fibra de vidro cimentados com diferentes cimentos de ionômero de vidro através do teste pull-out

 

Evaluation of tensile strength of fiberglass posts cemented with different glass ionomer cements through pull-out-test

 

 

Jefferson Ricardo PereiraI; Luiz Carlos Nunes MartinsII; Vitor Guarçoni de PaulaIII; Janaina Salomon GhizoniI; Naudy Brodbeck MayI; Saulo PamatoIV; Accácio Lins do ValleV; Hugo Alberto VidottiIII

I Professor Doutor da Faculdade de Odontologia da Universidade do Sul de Santa Catarina (Unisul).
II Graduando da Faculdade de Odontologia da Universidade do Sul de Santa Catarina (Unisul).
III Doutorando da Faculdade de Odontologia de Bauru – Universidade de São Paulo.
IV Especializando em Prótese Dentária pela Universidade Cruzeiro do Sul (Unicsul/RS).
V Professor Doutor da Faculdade de Odontologia de Bauru – Universidade de São Paulo.

Endereço para correspondência

 

 


 

RESUMO

Para que se consiga resistência e retenção de pinos intrarradiculares é essencial a adequada seleção do agente cimentante. Objetivo: analisar diferentes tipos de cimento de ionômero de vidro utilizados na cimentação de pinos intrarradiculares de fibra de vidro, o método através do teste de resistência à tração pull-out. Métodos: Foram cimentados pinos de fibra de vidro em 50 caninos humanos, divididos nos seguintes grupos (n = 10): Grupo I – Ionoseal (Voco), Grupo II – Lining and Cement (GC), Grupo III – Fuji II Improved (GC), Grupo IV – Rely X Luting 2 (3M Espe), Grupo V – Ketac Cem (3M Espe). Resultados: o teste Anova mostrou diferença significativa entre os grupos. O teste de Tukey mostrou que o Lining and Cement foi estatisticamente mais resistente que o Ionoseal (p < 0,05). Conclusão: assim, analisando-se os resultados, pode-se concluir que avaliando a resistência à tração dos pinos de fibra de vidro cimentados com diferentes cimentos de ionômero de vidro através do teste pull-out o cimento de ionômero de vidro convencional Lining and Cement se mostrou superior aos outros cimentos.

Palavras-chave: Resistência à tração. Técnica para retentor intrarradicular.


 

ABSTRACT

In order to obtain resistance and retention of intra radicular posts, is essential the adequate selection of the luting agent. Objetive: to analyze different types of glass ionome cements used for the cementation of intra-radicular fiverglass posts, through the pull - out test. Methods: Fiverglass posts were comented in 50 human canines, divided in the following groups (n = 10): Group I - Ionoseal (VOCO), Group II - Lining and Cement (GC), Group III - Fuji II Improved (GC), Group IV - Rely X Luting 2 (3M ESPE), Group V - Ketac Cem (3M ESPE). Results: the Anova test showed significant difference among groups. The Tukey test showed that the Lining and Cement was statistically more resistant than the Ionoseal (p < 0,05). Conclusion: thus, analyzing the results, it can be concluded that, evaluating the tensile strength of the fiberglass posts cemented with different glass ionomer cements, through the pull-out test, the conventional glass ionomer cement Lining and Cement, proved to be superior to the other cements.

Keywords: Post and core technique. Tensile strength.


 

 

Introdução

A restauração ideal de um órgão dentário deveria reabilitá-lo funcionalmente e esteticamente, preservando ao máximo, numa perspectiva mecânica e biológica, o remanescente dentário sadio e os tecidos circundantes. O desafio de restaurar um dente tratado endodonticamente é enfrentado pelo cirurgião dentista quase todos os dias1.

A terapia endodôntica tem preservado dentes que de outra forma estariam irremediavelmente perdidos, porém, atuando somente na porção radicular, restando a necessidade da reconstrução coronária. A perda da estrutura coronal em dentes destruídos requer a utilização do canal radicular para suportar a restauração ou a coroa.

Os principais fatores que fazem com que o dente tratado endodonticamente seja predisposto à falha da técnica são as paredes finas e raízes fracas incapazes de resistir a altos estresses levando a fraturas radiculares causadas por fadiga, assim como a rigidez dos materiais metálicos se comparados com a dentina. A resistência de um dente está diretamente relacionada com a quantidade de estrutura dental remanescente2-4.

Recentemente, a escolha dos materiais usados para a confecção dos núcleos intrarradiculares em dentes tratados endodonticamente tem mudado, do uso exclusivo de materiais muito rígidos para materiais que tenham características mecânicas mais próximas à dentina, reduzindo, assim, o risco de fratura radicular5-6. Um exemplo desses materiais são os pinos de fibra de vidro, que possuem a vantagem de necessitar pouca quantidade de desgaste intrarradicular para sua acomodação e possuem módulo de elasticidade próximo ao da dentina e, por serem translúcidos, podem resultar em melhores propriedades estéticas5-7.

O cimento de ionômero de vidro vem sendo utilizado com muita frequência em cimentações de peças protéticas, principalmente coroas totais, em metalocerâmicas, coroas em porcelana pura reforçadas e núcleos metálicos fundidos8-9. A resistência adesiva desse material é adequada e a recorrência de cárie, na região da margem do preparo, é muito baixa10.

O deslocamento do pino é reportado em vários trabalhos, como sendo a principal causa das falhas, podendo estar relacionado à deteriorização do cimento pelas cargas funcionais resultantes dos esforços mastigatórios11-14 e a suscetibilidade de alteração higroscópica15.

Os cimentos de ionômero de vidro possuem propriedades únicas que incluem a habilidade de troca iônica com a superfície dental, liberação de fluoretos por toda a vida da restauração e manutenção do selamento marginal por longos períodos. É de conhecimento geral que a água é a principal barreira para a efetiva adesão ao dente. Além disso, as recomendações do fabricante, o assentamento do pino e a natureza da reação do cimento, serão pontos influentes no procedimento de cimentação do pino11.

Este trabalho teve por objetivo, através do teste de resistência à tração pull-out, analisar diferentes tipos de cimento de ionômero de vidro utilizados na cimentação de pinos intrarradiculares de fibra de vidro.

 

Materiais e método

Para a realização deste trabalho foram selecionados cinquenta caninos humanos hígidos, com anatomia e dimensões semelhantes, cujo comprimento radicular foi de 15 mm ou mais, sem curvaturas, trincas ou rachaduras. Os dentes foram obtidos no banco de dentes da Universidade do Sul de Santa Catarina (Unisul) e foram devidamente armazenados em água destilada durante todo o experimento, de acordo com as normas exigidas pelo Comitê de Ética daquela universidade.

As coroas dos dentes foram removidas, de modo que se obteve 15 mm de remanescente radicular, com disco de aço diamantado em baixa velocidade na máquina de corte sob refrigeração de água (Iso- Met® 1000 Precision Saw, Buehler Ltd., Illinois, EUA). O canal radicular de cada dente foi instrumentado de acordo com a técnica escalonada regressiva com lima # 35 (International Standardization Organization - ISO) na constrição apical, com comprimento de trabalho 1 mm aquém do ápice. Limas de aço K-files (Dentsply Maillefer, Petrópolis, RJ, Brasil) de # 25 a # 55 foram empregadas para a instrumentação do canal radicular mediante irrigação com solução de Milton (hipoclorito de sódio a 1,0%) e EDTA (ácido etilenodiamino tetra-acético a 17%) alternadamente. Ao término da instrumentação, os canais foram lavados com solução de soro fisiológico (NaCl a 0,9%) e secados com pontas de papel absorvente (Tanari, Tamariman Industrial LTDA, Macaçaruru - AM). Os condutos foram então obturados através da técnica da condensação lateral, utilizando-se de um cone de guta-percha principal (Tanari, Tamariman Industrial LTDA, Macaçaruru - AM) número 35 ISO e uma pasta obturadora à base de resina epóxica e hidróxido de cálcio (Sealer 26, Dentsply Maillefer, Petrópolis, RJ, Brasil). As raízes foram armazenadas em água destilada a 37o por, no mínimo, uma semana.

Após realizados esses procedimentos, a guta-pecha foi removida com pontas Rhein aquecidas em lamparina e os condutos alargados com a broca correspondente ao pino número dois do Kit Reforpost (Angelus, Londrina - PR, Brasil) com cursores graduados, em baixa rotação, a uma profundidade de 10 mm, mantendo-se, no mínimo, 4 a 5 mm de material obturador remanescente no ápice. Após a desobturação, os condutos foram irrigados com hipoclorito a 1,0% e lavados com água destilada.

Previamente à cimentação, os pinos de fibra de vidro Reforpost (Angelus, Londrina, PR, Brasil) foram provados nos condutos já preparados, quando então tiveram suas porções coronárias cortadas com ponta diamantada nº 3203 (KG Sorensen) em alta rotação sob refrigeração de spray água/ar, até o limite de 4 mm para fora da raiz, com o objetivo de se construir posteriormente núcleos de preenchimento. Em seguida, os pinos foram limpados com solução de etanol a 95% e secados com jatos de ar.

Os dentes selecionados foram divididos aleatoriamente em 5 grupos (n = 10) diferenciados pelo tipo de cimento: Grupo I – Ionoseal (Voco), Grupo II – Lining and Cement (GC), Grupo III – Fuji II Improved (GC), Grupo IV – Rely X Luting 2 (3M Espe), Grupo V – Ketac Cem (3M Espe). Para a cimentação, os dentes foram fixados com godiva de baixa fusão em um recipiente metálico, preenchido com água destilada deixando apenas 2 mm de dente sem contato com o soro (Fig. 1). Para a inserção dos cimentos foi utilizado broca lentulo.

 

 

 

Após a cimentação dos pinos de fibra de vidro com seus respectivos cimentos, foram construídos núcleos de preenchimento em resina composta para que não houvesse contato direto entre o soro fisiológico e o cimento. Com a utilização de fio ortodôntico, delineador e resina acrílica foram confeccionadas alças em todos os pinos de fibra de vidro para que houvesse a conexão do espécime com a máquina de ensaios durante a tração do pino.

Os resultados foram analisados através do teste de análise de variância (Anova) (p = 05) e para comparações múltiplas o teste de Tukey (p = 05).

 

Resultados

O teste de Anova mostrou diferenças estatisticamente significativas entre os cimentos (e = 0,05). O teste de Tukey mostrou que o Lining and Cement foi estatisticamente mais resistente, apresentando resultados significativamente superiores ao Ionoseal (e = 0,05), como mostra a Tabela 1.

 

 

 

Discussão

Atualmente, quando se restauram dentes com tratamento endodôntico, objetiva-se a adesão entre os componentes restauradores (pino, cimento e material de preenchimento) e o remanescente dentário, de modo que se forme uma estrutura homogênea do ponto de vista mecânico e funcional, que irá absorver as cargas como no dente íntegro12.

Os pinos de fibra de vidro estão, a cada dia, substituindo os metais na odontologia restauradora. Isso está ocorrendo pelo fato de esses pinos estarem prontos para a utilização, significando economia de tempo e, também, por reduzir o risco de fratura radicular, já que sua resistência flexural e seu módulo de elasticidade são similares à dentina, fato que não ocorre com outros tipos de materiais, onde o risco de fratura é maior, como o aço inoxidável, a liga de titânio, a liga de ouro e o óxido de zircônia13.

No ano de 2005, Goracci et al16 realizaram um estudo e relataram que a resistência do pino de fibra de vidro ao deslocamento se dá pela fricção por deslizamento entre duas superfícies, ao invés de uma verdadeira adesão à dentina radicular. Como é impossível desidratar completamente a dentina intrarradicular de um dente com tratamento endodôntico através do uso de pontas de papel absorvente, essa água residual dentro dos túbulos dentinários pode ser vantajosa devido à expansão higroscópica do cimento ionomérico que aumenta a resistência friccional, aumentando, assim, também a retenção do pino de fibra de vidro no espaço do canal radicular14.

Os cimentos de ionômero resinomodificados sofrem contração de polimerização, como também sofrem expansão higroscópica, porém essa expansão ocorre de forma gradativa, já que a resina hidrofílica presente em sua composição absorve lentamente a água11-15, motivo esse de o cimento de ionômero de vidro convencional Lining and Cement ter obtido o melhor resultado no teste de resistência à tração no presente estudo. A expansão higroscópica pós-maturação do ionômero de vidro e o ionômero de vidro reforçado com resina compensam sua contração de assentamento inicial, resultando numa maior adaptação do cimento ao substrato. Porém, por possuírem grupos metacrilato ou monômeros polimerizáveis, a expansão do ionômero de vidro resinomodificado não é tão significativa16.

Com a modificação química do cimento de ionômero de vidro convencional com a adição de grupos metacrilato ou monômeros polimerizáveis, conseguiu- se a adesão química ao tecido calcificado, em combinação com os benefícios da resina, como uma resistência compressiva melhorada, resistência à fratura e ao desgaste17. Além disso, se mostra um material mais resistente aos fluidos orais, já que tem a possibilidade de ser fotoativado e possui a capacidade de adesão a materiais de compósito11. Por necessitarem de fotoativação, a luz dificilmente atinge os terços médio e apical com a mesma eficiência que o terço cervical, por isso que os cimentos de ionômero de vidro resino modificado não obtiveram os melhores resultados neste estudo.

 

Conclusões

Na análise de resistência à tração dos pinos de fibra de vidro cimentados com diferentes cimentos de ionômero de vidro através do teste pull-out, o cimento de ionômero de vidro convencional Lining and Cement se mostrou superior aos outros cimentos.

 

Agradecimentos

Os autores agradecem ao Puic/Unisul pelo apoio financeiro e à empresa Angelus pela doação de parte dos materiais deste estudo. Os autores agradecem o professor Dr. Heitor Marques Honório pela realização da análise estatística.

 

Referências

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Endereço para correspondência:
Jefferson Ricardo Pereira
Rua José Acacio Moreira, 787, Dehon
88701-140 Tubarão - SC

e-mail:
jeffripe@rocketmail.com

 

Recebido: 04/03/2012
Aceito: 03/04/2012