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Revista de Cirurgia e Traumatologia Buco-maxilo-facial

On-line version ISSN 1808-5210

Rev. cir. traumatol. buco-maxilo-fac. vol.10 n.2 Camaragibe Apr./Jun. 2010

 

ARTIGO DE CASO CLÍNICO

 

Cementoblastoma benigno: relato de caso

 

Benign cementoblastoma: a case report

 

 

Frederico Sampaio NevesI; Daniela Brait LadeiraII; Letícia Rodrigues NeryII; Solange Maria de AlmeidaIII; Paulo Sérgio Flores CamposIV

IMestrando em Radiologia Odontológica pela Faculdade de Odontologia de Piracicaba/ UNICAMP
IIDoutorandas em Radiologia Odontológica pela Faculdade de Odontologia de Piracicaba/ UNICAMP
IIIProfessora Associada da Disciplina de Radiologia da Faculdade de Odontologia de Piracicaba/ UNICAMP
IVProfessor Associado da Disciplina de Radiologia da Faculdade de Odontologia da Universidade Federal da Bahia/ UFBA

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

Cementoblastoma benigno é uma neoplasia odontogênica relativamente rara caracterizada, pela formação de uma massa de tecido semelhante ao cemento, em conexão com a raiz do dente. Radiograficamente está aderido à porção apical ou lateral da raiz e se apresenta como uma massa radiopaca densa, bem delimitada e circundada por um halo radiotransparente fino e uniforme. Neste artigo, os achados clínicos e radiográficos de um caso de Cementoblastoma benigno são apresentados.

Descritores: Neoplasias Bucais. Tumores Odontogênicos. Cementoma.


ABSTRACT

Benign cementoblastoma is a relatively rare odontogenic neoplasm characterized by the formation of a mass of cementum-like tissue, connected to the root of the tooth. Radiographically, it is attached to the apical or lateral root and presents as a well-defined, dense radiopaque mass, surrounded by a thin and uniform radiolucent halo. In this article, the clinical, radiographic and therapeutic features of a case of benign cementoblastoma are presented.

Descriptors: Benign Cementoblastoma. Cementoma. Odontogenic tumours.


 

 

INTRODUÇÃO

O Cementoblastoma Benigno (CB) é uma patologia derivada de cementoblastos neoplásicos, originados do ligamento periodontal1, sendo que a sua etiologia ainda é desconhecida2 assim como as dos demais tumores odontogênicos.

Segundo a classificação da Organização Mundial de Saúde (2005)3, o CB juntamente com o Mixoma Odontogênico e o Fibroma Odontogênico são neoplasias formadas por ectomesênquima odontogênico, com ou sem epitélio odontogênico. É uma entidade relativamente rara, com pouco mais de cem casos relatados4, compreendendo de 0,8% a 2,6% dos tumores odontogênicos5.

O CB se apresenta como uma massa, formada por material semelhante a cemento, aderida à raiz dentária e causando reabsorção radicular, mantendo, porém a vitalidade pulpar da unidade envolvida.

A maior parte dos dados sobre essa patologia foi extraída de relatos de caso e da publicação de pequenas séries, de sorte que as informações a respeito da lesão são ainda limitadas, o que torna qualquer informação adicional de suma importância, para que se possa delinear o perfil da condição.

O objetivo deste artigo é o de relatar um caso de CB, diagnosticado em um exame radiográfico de rotina, discutindo aspectos relevantes acerca de suas características clínicas, radiográficas e, também, do seu tratamento.

 

RELATO DE CASO

Paciente do sexo masculino, 54 anos de idade compareceu à Clínica de Radiologia Odontológica da Faculdade de Odontologia de Piracicaba – UNICAMP, para a realização de exames radiográficos, com finalidade implantodôntica. Durante a anamnese, o paciente não relatou a presença de sintomatologia dolorosa, e, ao exame clínico intra e extraoral, não se observaram alterações significativas. A história médica pregressa não foi relevante. Na radiografia panorâmica (Figura1) ,observamos a presença de uma área radiopaca fusionada à raiz do dente 4.7, de limites bem definidos, causando reabsorção em ambas as raízes. Notamos a ausência de halo radiotransparente ao redor da lesão. Não detectamos relação entre o canal mandibular e a lesão.

 

 

Para uma melhor visualização da alteração patológica, foi realizada uma tomografia computadorizada por feixe cônico. Nos cortes sagitais, observamos a presença de uma massa hiperdensa bem delimitada, fusionada à raiz do dente 4.7, causando expansão e afilamento da cortical lingual (Figura 2a-m). Não observamos halo hipodenso ao redor da lesão nem erosão ou perfuração em ambas as corticais. Notamos reabsorção de ambas as raízes do dente envolvido (fig. 2l-m). Pelos cortes tomográficos, não pudemos identificar o canal mandibular.

 


 

Após os exames imaginológicos, realizamos teste de vitalidade pulpar com diclorodifluoretometano do dente acometido pela lesão, com resultado positivo. A partir das características clínicas e imaginológicas, o diagnóstico foi de Cementoblastoma Benigno. O paciente foi encaminhado ao cirurgião bucomaxilofacial e o tratamento de escolha foi a proservação clínica e radiográfica.

 

DISCUSSÃO

A idade de maior ocorrência do CB é abaixo dos 30 anos, sendo que boa parte dos pacientes acometidos situa-se abaixo dos 20 anos. A mandíbula é o local mais comum da ocorrência desse tumor, sendo que o primeiro molar inferior permanente é o dente mais afetado. A preferência por esta área ainda é um mistério1,6. O CB raramente é diagnosticado na maxila, tendo sido relatados apenas 16 casos na literatura7.

Com relação ao gênero, Ulmansky et al. (1994)6 referem ser o feminino levemente mais afetado que o masculino, ao contrário de Brannon et al. (2002)1, que consideram o gênero masculino como mais amiúde envolvido. Devido ao fato de a diferença percentual ser bastante reduzida, pode-se considerar que o CB não tem predileção por gênero, ao contrário do que acontece com outras lesões radiopacas como a Displasia Cementária Periapical, que ocorre mais em mulheres.

Com relação às características clínicas, o CB apresenta crescimento lento e ilimitado, sendo a dor associada, e o aumento de volume vestibular ou lingual/palatal os achados mais comuns. A vitalidade dos dentes envolvidos é preservada. Parestesia do lábio inferior e fratura patológica da mandíbula são raramente relatadas8. Deve-se atentar para o fato de que o tumor pode não apresentar sinais/sintomas clínicos9.

A sintomatologia dolorosa pode ser originada devido à extrusão dentária, que é causada pelo crescimento do tumor, o que levaria a um aumento da pressão oclusal e dos contatos prematuros10 ou pode estar relacionada à compressão do canal mandibular/nervo alveolar inferior11.

Radiograficamente, o CB está aderido à porção apical ou lateral da raiz do dente12 e se apresenta como uma massa radiopaca densa, bem delimitada e circundada por um halo radiotransparente, fino e uniforme. Sinais radiográficos, como a presença de reabsorção radicular, perda do contorno da raiz e obliteração do espaço do ligamento periodontal são, juntamente com a vitalidade pulpar dos dentes envolvidos, sinais patognomônicos da lesão11.

Segundo Langlais et al. (1995)10, pode-se observar, também radiograficamente, três estágios de desenvolvimento para o tumor: primeiro, o estágio de matriz não calcificada, que se caracteriza pelo desenvolvimento de área radiolúcida circular na região do ápice de um dente vital; segundo estágio ou cementoblástico, no qual se inicia a formação de material radiopaco do centro para a periferia da lesão; o terceiro estágio, o de maturação, em que toda a lesão se apresenta radiopaca, embora contornada por halo radiolúcido. Porém, em algumas lesões maiores que três centímetros, pode ocorrer uma diminuição dos sinais de crescimento potencial ilimitado. Em algumas lesões grandes, o halo radiolúcido e as margens escleróticas são achados variáveis; quando estes se tornam indistintos, as lesões entram em uma maior fase de latência.

No caso apresentado neste artigo, poderíamos caracterizar a lesão como estando em um estágio de latência (terceiro estágio de maturação), devido justamente à ausência do halo radiolúcido e das margens escleróticas.

Devido às características do CB, a tomografia computadorizada torna-se um recurso de fundamental importância para a avaliação de características patognomônicas relacionadas ao tumor, como a reabsorção radicular, que, na maioria dos casos, é apenas evidenciada através de recursos imaginológicos em três dimensões, devido ao fusionamento do tumor com o terço radicular da unidade dentária. Em lesões radiopacas com suspeita de reabsorção radicular, este recurso de imagem deve ser sempre utilizado, para que seja realizado o diagnóstico diferencial entre o CB e outras lesões, como o Osteoblastoma e a Hipercementose.

O tratamento do CB normalmente consiste em extração cirúrgica do dente junto com a massa calcificada aderida4-6, ocorrendo recidiva após a enucleação do tumor. Em casos de remoção incompleta da lesão, recorrência é um achado comum13. Outro tipo de abordagem consiste no tratamento endodôntico do dente envolvido, com enucleação do tumor e curetagem óssea2,6,11.

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

No caso apresentado neste artigo, pelo fato de o paciente ser assintomático, não apresentar aumento de volume e radiograficamente a lesão se apresentar em um estágio de latência, o tratamento conservador (acompanhamento clínico e radiográfico) foi implementado.

 

REFERÊNCIAS

1. Brannon R, Fowler CB, Carpenter WM, Corio RL. Cementoblastoma: an innocuous neoplasm? A clinicopathologic study of 44 cases and review of the literature with special emphasis on recurrence. Oral Surg Oral Med Oral Pathol Oral Radiol Endod. 2002 Mar; 93(3): 311 – 20.         [ Links ]

2. Biggs JT, Benenati FW. Surgically treating a benign cementoblastoma: while retaining the involved tooth. J Am Dent Assoc 1995 Sep; 126(9): 1288 – 90.         [ Links ]

3. Barnes L, Eveson JW, Reichart P, Sidransky D. eds. World Health Organization classification of tumours. Pathology and genetics of head and neck tumours. Lyon: IARC Press; 2005: 306–18.         [ Links ]

4. Pynn BR, Sands TD, Bradley G. Benign cementoblastoma: a case report. J Can Dent Assoc. 2001 May, 67(5): 260 – 2.         [ Links ]

5. Ohki K, Kumamoto H, Nitta Y, Nagasaka H, Kawamura H, Ooya K. Benign cementoblastoma involving multiple maxillary teeth: report of case with a review of the literature. Oral Surg Oral Med Oral Pathol. 2004 Jan; 97(1): 53 – 8.         [ Links ]

6. Ulmansky M, Hjorting-Hansen E, Praetorius F, Haque MF. Benign cementoblastoma; a review and five new cases. Oral Surg Oral Med Oral Pathol. 1994 Jan; 77(1): 48 – 55.         [ Links ]

7. Hirai E, Yamamoto K, Kounoe T, Kondo Y, Yonemasu H, Kurokawa H. Benign Cementoblastoma of the anterior maxilla. J Oral Maxillofac Surg 2010 Mar: 68(3); 671 – 74.         [ Links ]

8. Philipsen HP. World Health Organization Classification of Tumours. Pathology & Genetics. Head and Neck Tumours. Lyon: IARC Press; 2005.p. 306 - 18.         [ Links ]

9. Mahl CEW, Gegler A, Fontanella VRC. Cementoblastoma benigno associado a segundo pré-molar inferior: relato de caso. Rev Fac Odontol Porto Alegre. 2003 Jul; 44(1): 24 – 25.         [ Links ]

10. Langlais RP, Langland OE, Nortjé CJ (Eds.). Diagnostic imaging of the jaws. Baltimore: Williams & Wilkins, 1995.         [ Links ]

11. Neves FS, Falcão AFP, Dos Santos JN, Dultra FKAA, IMCR Rebello, Campos PSF. Benign Cementoblastoma: case report and review of the literature. Minerva Stomatologica. 2009 Jan-Feb; 58(1-2): 55 – 9.         [ Links ]

12. Sumer M, Gunduz K, Sumer AP, Gunhan O. Benign cementoblastoma: a case report. Med Oral Patol Oral Cir Bucal. 2006 Nov; 11(1): 483 – 5.         [ Links ]

13. Baart JA, Lekkas C, van der Waal I. Residual cementoblastoma of the mandible. J Oral Pathol Med. 1991 Jul, 20(6): 300 – 2.         [ Links ]

 

 

Endereço para Correspondência
Frederico Sampaio Neves
Universidade Estadual de Campinas - Faculdade de Odontologia de Piracicaba - Departamento de Diagnóstico Bucal
Av. Limeira, 901, Areião
Caixa Postal 52, Piracicaba-SP - CEP 13414-903
e-mail: fredsampaio@yahoo.com.br

Recebido em 06/10/2009
Aprovado em 17/11/2009

 

 

Instituição onde foi realizado o trabalho: Faculdade de Odontologia de Piracicaba/ UNICAMP