SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
vol.59 issue3 author indexsubject indexarticles search
Home Pagealphabetic serial listing  

RGO.Revista Gaúcha de Odontologia (Online)

On-line version ISSN 1981-8637

RGO, Rev. gaúch. odontol. (Online) vol.59 n.3 Porto Alegre Jul./Sep. 2011

 

ARTIGO ORIGINAL / ORIGINAL ARTICLE

 

Cárie, acúmulo de biofilme e nível socioeconômico de mulheres e crianças assistidas pela Estratégia de Saúde da Família

 

Caries, biofilm build-up and socioeconomic level of women and children cared for under the Family Health Strategy

 

Marina de Almeida ROMANINII;Alessandro Diogo de CARLIII;Valéria Rodrigues de LACERDAII;Elenir Rose Jardim Cury PONTESIII;Janaína Rodrigues Lopes da SILVAI;Luana Bertagnolli GONÇALVESI

IUniversidade Federal de Mato Grosso do Sul, Faculdade de Odontologia
IIUniversidade Federal de Mato Grosso do Sul, Faculdade de Odontologia
IIIUniversidade Federal de Mato Grosso do Sul, Centro de Ciências Biológicas e da Saúde, Departamento de Tecnologias e Alimentos

Endereço para correspondência

 

 


 

RESUMO

Objetivo
Verificar a relação existente entre a prevalência de cárie, acúmulo de biofilme dental e nível socioeconômico de mães e filhos cadastrados na Estratégia de Saúde da Família em Campo Grande, Mato Grosso do Sul, Brasil.

Métodos
Neste estudo transversal foram examinadas 80 mulheres e 80 crianças (n=160), provenientes de famílias cadastradas nas seguintes unidades de saúde: Jardim Noroeste (Norte), Jardim Los Angeles (Sul), Maria Aparecida Pedrossian (Leste) e Serradinho (Oeste). Os índices CPO-D e ceo-d foram utilizados para a verificação da prevalência de cárie, o IHO-S para a análise do acúmulo de biofilme e um questionário socioeconômico foi realizado para o inquérito desse aspecto.

Resultados
Verificou-se que 74% dos participantes residem em casa própria e utilizam serviço odontológico público; nas mães, observou-se CPO-D=17,44 e IHO-S=1,45; nas crianças de 12 anos o CPO-D foi de 1,80 e nas de 6 a 11 anos o ceo-d e o CPO-D foram de 2,08 e 0,68, respectivamente; o IHO-S=1,35 geral das crianças.

Conclusão
Não houve relação significativa entre a prevalência de cárie, acúmulo de biofilme e o nível socioeconômico da população estudada.

Indexing terms: Cárie dentária. Classe social. Placa dentária.


 

ABSTRACT

Objectives
To analyze the relationship between prevalence of caries, build-up of dental biofilm and socioeconomic level of mothers and children enrolled in the Family Health Strategy in Campo Grande (Mato Grosso do Sul).

Methods
In this cross sectional study, 80 women and 80 children (n = 160) were examined. They came from families enrolled in the following health care clinics: Jardim Noroeste (North), Jardim Los Angeles (South), Maria Aparecida Pedrossian (East) and Serradinho (West). The DMFT and dmf-t scores were used to analyze prevalence of caries; SOHI was used to detect dental biofilm build-up. The families filled in a questionnaire about their socioeconomic situation.

Results
Seventy-four per cent of the families live in their own houses and get assistance from the public dental service. Mothers presented DMFT=17.44 and SOHI=1.45. In children aged 12, DMFT was 1.80 and in those aged 6 to 11, dmf-t and DMFT were 2.08 and 0.68, respectively. The overall SOHI in children was 1.35. Conclusion: There was no significant correlation between prevalence of caries, biofilm build-up and the socioeconomic level of the population under study.

Termos de indexação: Dental caries. Social class. Dental plaque.


 

 

INTRODUÇÃO

Para a proposição de ações adequadas às necessidades e riscos de um grupo de pessoas de uma determinada região, é indispensável à realização de um levantamento epidemiológico prévio estimando as condições de saúde bucal dos diferentes grupos populacionais. As informações obtidas por meio desses levantamentos possibilitam comparações no tempo e no espaço, e avaliações do impacto diferencial de fatores de risco e proteção, bem como, em certa medida, dos programas de saúde relativos aos agravos e condições considerados1.

A cárie é uma doença multifatorial cujo fator etiológico crítico é o acúmulo de biofilme cariogênico. Frente à estagnação e permanência desse de forma organizada e aderido à superfície dentária, tem-se o início e progressão da doença cárie2-3.

Além disso, há que se considerar a relevância dos fatores socioeconômicos como mascaradores do processo saúde-doença4, visto que a cárie dentária, assim como todas as outras moléstias que acometem a espécie humana, tem determinação social5.

Estudos sobre os hábitos de higiene bucal de adolescentes demonstraram que esses são associados a fatores demográficos, sociais, comportamentais e psicológicos, tais como sexo, idade, nível socioeconômico, autopercepção da saúde, estilo de vida e condições psicológicas6.

Nesse sentido, evidenciou-se que crianças de escolas privadas apresentaram menores índices de cárie dentária e maior proporção de dentes obturados, enquanto naquelas que frequentavam escolas públicas a experiência de cárie e a necessidade de tratamento foram maiores7-8.

Altos índices de cárie e sangramento gengival foram observados em crianças de escolas públicas e maior índice de fluorose nas de escola particular, não sendo verificada correlação das variáveis de nível socioeconômico com os eventos estudados9.

Em relação ao ataque de cárie na dentição decídua, observou-se que em cidades com melhores indicadores de desenvolvimento social, a população infantil apresentou menores índices de agravo e valores reduzidos de necessidade de tratamento odontológico10, relações positivas foram encontradas entre o nível socioeconômico e o perfil de saúde bucal, sendo que maiores índices de CPO-D foram verificados em famílias socialmente desfavorecidas7-8,11-12.

Quanto ao acúmulo de biofilme medido pelo Índice de Higiene Oral Simplificado (IHO-S), percebeu-se ao analisar gestantes de classe econômica desfavorecida no município de Aracaju (SE), que essas mulheres apresentaram um IHO-S considerado médio (1,93) demonstrando que existe relação entre o nível socioeconômico e a qualidade da higienização bucal13. Contrariando esse estudo, Padilha et al.14, não encontraram, em pacientes de clínica integrada da Universidade Federal Fluminense, uma relação significativa estatisticamente entre o grupo de maior e o grupo de menor nível socioeconômico e as médias de IHO-S.

A discrepância encontrada entre os dados sobre autopercepção e as reais condições de saúde bucal revela a maneira singular como a população percebe sua saúde bucal. Indivíduos que possuem altos índices de CPO-D, alta porcentagem de edentulismo, uso de próteses e pouca procura por serviços odontológicos classificam sua saúde bucal positivamente, demonstrando que a percepção de saúde bucal está relacionada com o meio social em que a pessoa vive e com as variáveis que indicam necessidade de tratamento15-17.

O projeto SB-Brasil representou uma das mais bem-sucedidas experiências de produção de dados epidemiológicos de saúde bucal a partir de estudos transversais18.

Na região Centro-Oeste, o levantamento SB Brasil encontrou um ceo-d médio aos 5 anos de 2,67 (±3,36); já o CPO-D médio aos 12 anos foi de 3,16 (±3,30), prevalecendo os dentes cariados; dos 15 aos 19 anos de 6,97 (±5,12), com maior número de dentes obturados; dos 35 aos 44 anos de 20,32 (±7,74), sendo que os dentes perdidos foram maioria; e dos 65 aos 74 anos de 27,93 (±6,71), com prevalência de dentes perdidos. No mesmo levantamento, foram encontrados dados a respeito da caracterização socioeconômica da população brasileira19.

Entretanto, frente à existência de dados conflitantes na literatura consultada e à importância de fatores socioeconômicos como confundidores do processo de saúde doença bucal, este trabalho visa verificar a relação existente entre a prevalência de cárie, acúmulo de biofilme dental e nível socioeconômico de mães e filhos cadastrados na Estratégia de Saúde da Família em Campo Grande (MS).

 

MÉTODOS

A pesquisa foi realizada no município de Campo Grande (MS), com subdivisão conforme os distritos sanitários (Norte, Sul, Leste e Oeste). Foram sorteadas quatro Unidades Básicas de Saúde da Família (UBSF), uma de cada distrito. Assim, no distrito norte a UBSF sorteada foi a do Jardim Noroeste; no sul, do Jardim Los Angeles; no leste, do Maria Aparecida Pedrossian; e no oeste, da Vila Serradinho. Para seleção das famílias que participaram da pesquisa foram utilizadas as pastas dos agentes comunitários de saúde, garantindo assim, que as famílias fossem cadastradas na Estratégia de Saúde da Família e que tivessem mulheres e crianças na faixa etária pretendida. Não foi definida uma faixa etária para as mulheres; bastava ser mãe ou responsável pela criança. Já as crianças deveriam possuir entre cinco e doze anos, incluindo-se ambos os sexos.

De 101 famílias que preencheram os critérios de inclusão, 80 famílias concordaram em participar da pesquisa (20 no distrito norte, 28 no sul, 13 no leste e 19 no oeste). Foram examinadas uma mulher e uma por família totalizando 80 mulheres e 80 crianças cadastradas na Estratégia de Saúde da Família (n=160), em um estudo transversal de abordagem quantitativa.

Para a coleta de dados, três examinadores foram devidamente calibrados a fim de se obter uma padronização no uso de critérios de diagnóstico. Os valores do Kappa inter e entra-examinador foi de 95,3% e 96,2% respectivamente, considerados aceitáveis para a realização dos exames.

O instrumento para aferição do ataque de cárie na dentição permanente foi o índice de dentes cariados, perdidos e obturados (CPO-D) e para a dentição decídua foi utilizado o índice de dentes cariados, com extração indicada e obturados (ceo-d). Os códigos e critérios utilizados nesse levantamento foram aqueles mencionados pelo Ministério da Saúde em seu último levantamento epidemiológico em saúde bucal19.

Para aferição do acúmulo de biofilme foi utilizado o Índice de Higiene Oral Simplificado (IHO-S), que é uma combinação entre o índice de resíduos e o índice de cálculo. O índice classifica o acúmulo de biofilme em bom (0,0-1,2), médio (1,3-3,0) e fraco (3,1-6,0)20.

Para tabulação dos dados, utilizou-se uma ficha clínica semelhante a utilizada no Projeto SB Brasil19.

Os exames foram realizados com o examinado sentado, tendo em vista o máximo de aproveitamento de luz natural. Os examinadores, devidamente paramentados, utilizaram espelho plano nº 5 e espátula de madeira, para realização dos exames.

Para coleta dos dados a respeito do nível socioeconômico das famílias, utilizou-se um questionário baseado no questionário do Projeto SB Brasil19, subdividido em três partes: questionário socioeconômico, acesso a serviços odontológicos e autopercepção em saúde bucal. O questionário, assim como os outros exames, foi aplicado durante visitas domiciliares.

A comparação entre os dados foi realizada por meio de testes estatísticos (Kruskal-Wallis, Dunn e Mann-Whitney) conforme o tipo de variável e segundo a distribuição normal das mesmas. A análise estatística foi realizada utilizando-se o software SigmaStat, versão 2.0, com nível de significância de 5%.

Previamente à realização deste estudo, o projeto foi submetido ao Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, sendo aprovado por meio do protocolo n. 1203. Todas as mães participantes do estudo assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido referentes tanto a sua participação, quanto a de seus filhos na presente pesquisa.

 

RESULTADOS

A média do IHO-S para as crianças foi de 1,35 (±0,58) e para as mulheres foi de 1,45 (±0,85), ambos considerados médios.

O índice ceo-d para as idades entre 6 e 11 anos foi de 2,08 (desvio-padrão - DP de 2,65), prevalecendo o componente cariado. Para o CPO-D na mesma faixa etária o valor foi de 0,68 (DP= 1,09), com predomínio do componente obturado. Para as crianças de 12 anos, o CPO-D médio, foi de 1,80 (DP=1,69) sendo os dentes cariados maioria. Para as crianças de 5 anos a média não foi computada estatisticamente por haver apenas 5 representantes.

Neste estudo foram avaliadas 80 mulheres, sendo que a idade das mesmas variou entre 22 e 72 anos, sendo a idade média de 35,46 (DP=9,45) anos. Para estas, a média do índice CPO-D foi definida segundo faixa etária: até 35 anos o índice foi de 13,68 (DP=5,69), prevalecendo o componente obturado; para a idade compreendida entre 35-44 o índice foi de 19,39 (DP=6,33), com predomínio de dentes perdidos; na faixa etária de 45-64 anos, o CPO-D foi de 24,80 (DP=4,83), onde os dentes perdidos eram maioria; para a faixa etária de 65-74 existiam poucos representantes, tornando a estatística insignificante.

Os principais resultados referentes à caracterização socioeconômica das famílias avaliadas podem ser resumidos quanto ao tipo de moradia: 74% residiam em casa própria, 18% em casa alugada, 5% em casa cedida e 3% em casa própria em aquisição; quanto à posse de automóvel, 73% não possuíam carro, 21% possuíam um automóvel e 6% possuíam dois ou mais automóveis.

Os resultados relativos ao acesso das entrevistadas aos serviços odontológicos foram divididos quanto ao local do atendimento e o motivo do mesmo. Quanto ao local, nenhuma participante respondeu que nunca foi atendida, 74% foram atendidas no serviço público, 18% no serviço privado liberal e 9% no serviço privado suplementar. Ao serem questionadas quanto ao motivo que as levou a buscar o serviço odontológico, 48% das mães responderam que foi por motivo de dor, 23% por consulta de rotina, 15% por cavidades nos dentes, 4% por sangramento gengival e 11% por outros motivos.

A distribuição das mulheres de acordo com os diferentes locais de atendimento odontológico, bem como os valores médios das variáveis CPO-D e IHO-S estão apresentados na Tabela 1.

 

 

 

A distribuição das mulheres, de acordo com a percepção da saúde bucal, bem como os valores médios das variáveis CPO-D e IHO-S em cada uma das classificações dessa percepção, estão apresentados na Tabela 2.

A distribuição das crianças, de acordo com o tipo de escola que frequentavam e os valores médios das variáveis CPO-D, ceo-d e IHO-S, em cada um dos tipos de escola, estão apresentados na Tabela 3.

Na Tabela 4, encontram-se os valores relativos ao agrupamento das mulheres segundo os índices de CPO-D relacionados às respostas obtidas referentes à autopercepção em saúde bucal.

 

 

 

 

 

 

 

DISCUSSÃO

O entendimento da relevância dos fatores socioeconômicos como elementos mascaradores do processo saúde-doença bucal tem sido o centro de valorosas discussões, principalmente no âmbito da saúde coletiva. Apesar das evidências da ocorrência da interferência desses fatores4, os dados encontrados nos estudos são conflitantes, haja vista que existem estudos que encontraram relação positiva entre o nível socioeconômico e o perfil de saúde bucal das populações estudadas7,10-12,21, entretanto um estudo realizado em Porto Alegre (RS) com escolares de 12 anos evidenciou o contrário9.

Considerando-se o acúmulo de biofilme dental como elemento primordial para o surgimento e evolução da cárie dentária2-3, para medi-lo no presente estudo foi utilizado o IHO-S. A média do IHO-S das crianças que participaram do estudo foi de 1,35 (médio). Dentre essas, as que frequentavam escolas públicas apresentaram IHO-S= 2,70 (DP=2,85), enquanto naquelas que frequentavam escolas particulares o IHO-S foi de 1,46 (DP=2,15). Como o tipo de escola é considerado um indicador socioeconômico e tendo em vista que 83% (n=66) da amostra de crianças frequentavam a escola pública, pôde-se inferir que em relação ao acúmulo de biofilme dental, esse é mais evidente nas crianças que frequentam escola pública, embora sem diferença estatística significativa, concordando com o estudo realizado em João Pessoa (PB) com escolares adolescentes13.

Na população adulta o IHO-S foi de 1,45 (DP=0,85), também considerado médio. Vale destacar que para essa parcela da amostra, os valores do IHO-S foram considerados homogêneos em relação ao tipo de serviço odontológico utilizado, porque 73,75% (n=59) utilizavam segmento público como meio de acesso à atenção odontológica, cujo IHO-S foi de 1,44 (DP=0,88) enquanto aqueles que mencionaram utilizar o serviço privado liberal e complementar apresentaram um IHO-S= 1,24 (DP=1,09) e 1,08 (DP=0,47), respectivamente, sugerindo não haver influência desse tipo de variável em relação ao acúmulo de biofilme, aceitando-se a inexistência de diferenças significativas entre as médias, conforme resultado mencionado anteriormente14.

Em relação ao ataque de cárie na população infantil, verificou-se um ceo-d médio= 2,03 (DP= 2,68) e CPO-D= 0,27 (DP=1,23); ceo-d= 0,77 (DP= 1, 69) e CPO-D= 0,69 (DP=1,32) nas crianças de escolas particulares e ceo-d= 2,03 (±2,68) e CPO-D= 0,87 (DP=1,23) nas de escolas públicas, não havendo diferença significativa entre a ocorrência da doença e o tipo de escola frequentados, concordando com estudo anterior11. Porém, os resultados deste estudo permitem a inferência de que, nas crianças estudadas, o maior ataque da doença cárie ocorreu na dentição decídua conforme observado em outros estudos8,19.

No segmento adulto da amostra, na faixa etária menor de 35 anos, o CPO-D foi de 13,68 (DP=5,69), entre 35-44 anos, verificou-se CPO-D=19,39 (DP=6,33) e dos 45-64 anos o CPO-D apresentado foi de 24,80 (DP=4,83), todos considerados altos e com tendência ao edentulismo conforme o avançar da idade, o que já foi evidenciado por estudos anteriores19,22.

Frente à análise dos componentes dos índices de ataque de cárie infantil, tanto na dentição decídua quanto na permanente, observou-se que o predomínio do componente cariado denota certa discrepância no que se refere ao acesso ao serviço odontológico local, tendo em vista que todos os participantes do estudo são cadastrados e em teoria, frequentam as Unidades Básicas de Saúde da Família, as quais seriam responsáveis em contemplar a resolução desse tipo de agravo, que diz respeito às ações da atenção básica23.

Na população adulta, notou-se o seguimento da história natural da doença cárie verificado pelo alto índice de edentulismo, o qual pode ter sua gênese no comportamento individual, mas também reflete o modelo de atenção odontológica empregado que, no caso, demonstra ser essencialmente cirúrgico-restaurador, contrapondo-se à filosofia da Estratégia de Saúde da Família, que preconiza a valorização de métodos preventivo-educativos e de promoção da saúde23 e também às atuais Diretrizes da Política Nacional de Saúde Bucal, as quais preconizam que ações de saúde bucal, e em especial a educação em saúde, deverão ser incluídas transversalmente no Programa de Atenção à Saúde24.

A abordagem da autopercepção em saúde bucal revelou uma discordância entre a realidade clínica (observada pelas examinadoras) e a realidade sentida (percebida pelos participantes da pesquisa), o que foi verificado pelo fato de que não houve diferenças estatisticamente significativas entre os participantes que classificaram sua saúde bucal como ótima/boa, regular ou ruim/péssima em relação ao CPO-D apresentado pelos mesmos. Isso ficou evidente ao verificar-se que o valor do CPO-D médio ficou em torno de 17 e, mesmo assim, cerca de 75% destes classificaram sua saúde bucal como ótima/ boa ou regular, enquanto somente 25% (CPO-D= 18,35) classificou-a como ruim ou péssima. Tal fato evidencia que a população, em termos gerais, desconhece o conceito de saúde bucal, e o quão difícil e subjetiva possa ser sua definição, enquanto necessidade sentida, peculiaridade mencionada por outros estudos15-17.

A riqueza de dados tabulados em "estudos de campo" é imensa. Porém, certas observações que ocorrem durante a investigação e que não são objetivo explícito do estudo merecem menção. Os bairros que fizeram parte desse estudo são considerados como área de risco social25, no entanto, notou-se que pertencendo (teoricamente) a uma realidade social semelhante, os mesmos guardam entre si diferenças significativas em relação à saneamento básico, condições de moradia, posses e até mesmo na qualidade de vida dos habitantes.

 

CONCLUSÃO

Não houve relação significativa entre a prevalência de cárie e acúmulo de biofilme com o nível socioeconômico da população estudada.

Colaboradores

MA ROMANINI, AD CARLI, VR LACERDA, ERJC PONTES, JRL SILVA e LB GONÇALVES participaram de todas as etapas da elaboração do artigo.

 

REFERÊNCIAS

1.. Frias AC, Antunes JLF, Narvai PC. Precisão e validade de levantamentos epidemiológicos em saúde bucal: cárie dentária na cidade de São Paulo, 2002. Rev Bras Epidemiol. 2004;7(2):144-54.         [ Links ]

2. Löe H. A review of the prevention and control of plaque. In: McHugh WD. Dental plaque. Edinburgh: Livingstone; 1969.

3. Maltz M. Cárie dental: fatores relacionados. In: Pinto VG. Saúde bucal coletiva. 2ª ed. São Paulo: Santos; 2000. p.319-39.

4. Fejerskov O, Manji F. Risk assessment in dental caries. In: Bader JD. Risk assessment in dentistry. Chapel Hill: University of North Carolina Dental Ecology; 1990. p.215-7.

5. Ferreira MA, Roncalli AG, Lima KC. Saúde bucal coletiva: conhecer para atuar. Natal: EDUFRN; 2004.

6. Freire MCM, Sheiham A, Bino YA. Hábitos de higiene bucal e fatores sociodemográficos em adolescentes. Rev Bras Epidemiol. 2007;10(4):606-14.

7. Hoffman RHS, Cypriano S, Sousa MLR, Wada RS. Experiência de cárie dentária em crianças de escolas públicas e privadas de um município com água fluoretada. Cad Saúde Pública. 2004;20(2):522-8.

8. Rihs LB, Gushi LL, Sousa MLR, Wada RS. Cárie dentária segundo o nível socioeconômico em Itapetininga-SP. Rev Odonto Ciênc. 2005;20(50):367-71.

9. Maltz M, Barbachan e Silva B. Relação entre cárie, gengivite e fluorose e nível socioeconômico em escolares. Rev Saúde Pública. 2001;35(2):170-6.

10. Baldani MH, Narvai PC, Antunes JLF. Cárie dentária e condições sócio-econômicas no Estado do Paraná, Brasil, 1996. Cad Saúde Pública. 2002;18(3):755-63.

11. Amaral MA, Nakama L, Conrado CA, Matsuo T. Dental caries in young male adults: prevalence, severity and associated factors. Braz Oral Res. 2005;19(4):249-55.

12. Antunes JLF, Peres MA, Mello TRC. Determinantes individuais e contextuais da necessidade de tratamento odontológico na dentição decídua no Brasil. Ciênc Saúde Colet. 2006;11(1):79- 87.

13. Moreira PVL, Rosenblatt A, Passos IA. Prevalência de cárie em adolescentes de escolas públicas e privadas na cidade de João Pessoa, Paraíba, Brasil. Ciênc Saúde Colet. 2007;12(5):1229- 36.

14. Padilha WWN, Carvalho DM, Oliveira V, Amaral MF, Martinho DS. Associação entre indicadores de saúde bucal e nível sócio-econômico em pacientes da clínica integrada. Pesq Bras Odontoped Clin Integr. 2001;1(1):31-44.

15. Silva SRC, Castellanos Fernandes RA. Autopercepção das condições de saúde bucal por idosos. Rev Saúde Pública. 2001;35(4):349-55.

16. Silva DD, Sousa MLR, Wada RS. Autopercepção e condições de saúde bucal em uma população de idosos. Cad Saúde Pública. 2005;21(4):1251-9.

17. Benedetti TRB, Mello ALSF, Gonçalves LHT. Idosos de Florianópolis: autopercepção das condições de saúde bucal e utilização de serviços odontológicos. Ciênc Saúde Colet. 2007;12(6):1683-90.

18. Roncalli AG. Epidemiologia das desigualdades em saúde bucal com foco em famílias. In: Moysés ST, Kriger L, Moysés SJ. Saúde bucal das famílias: trabalhando com evidências. São Paulo: Artes Médicas; 2008.

19. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Coordenação Nacional de Saúde Bucal. Projeto SB Brasil: condições de saúde bucal da população brasileira. Resultados principais. Brasília: Ministério da Saúde; 2004.

20. Greene JC, Vermillion JR. The simplified oral hygiene index. J Am Dent Assoc 1964;68:7-13.

21. Cortellazzi KL, Tagliaferro EPS, Assaf AV, Tafner APMF, Ambrosano GMB, Bittar TO, et al. Influência de variáveis socioeconômicas, clínicas e demográfica na experiência de cárie dentária em préescolares de Piracicaba, SP. Rev Bras Epidemiol. 2009;12(3):490- 500.

22. Ferreira RC, Magalhães CS, Rocha ES, Schwambach CW, Moreira NA. Saúde bucal de idosos residentes em instituições de longa permanência de Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil. Cad Saúde Pública. 2009;25(11):2375-85.

23. Ministério da Saúde. Secretária de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Programa de Saúde da Família: ampliando a cobertura para consolidar a mudança do modelo de Atenção Básica. Rev Bras Saúde Matern Infant. 2003;3(1):113-25.

24. Reis DM, Pitta DR, Ferreira HMB, Jesus MCP, Moraes MEL, Soares MG. Educação em saúde como estratégia de promoção de saúde bucal em gestantes. Ciênc Saúde Colet. 2010;15(1):269-76.

25. Trad LAB, Bastos ACS. O impacto sócio-cultural do Programa de Saúde da Família (PSF): uma proposta de avaliação. Cad Saúde Pública. 1998;14(2):429-35.

 

 

Endereço para correspondência:
MA ROMANINI
Universidade Federal de Mato Grosso do Sul,
Faculdade de Odontologia.
Av. Senador Filinto Müller, s/n.,
Vila Ipiranga, 79080-190, Campo Grande,
MS, Brasil.

e-mail:
marina_romanini@hotmail.com

Recebido: 13/7/2010
Aceito: 7/4/2011